Moratória
da soja chega a seu quarto ano com produção
em alta e avanço no monitoramento. Mas o
caminho para o fim do desmatamento ainda não
terminou.
Lá se vão quatro
anos desde que a indústria da soja resolveu
tirar sua cadeia produtiva da rota de desmatamento
na Amazônia. As maiores associações
do setor – Associação Brasileira da
Indústria de Óleos Vegetais (Abiove),
Associação Nacional dos Exportadores
de Cereais (Anec) e suas associadas, dentre elas,
ADM, Amaggi, Cargill, Bunge e Louis Dreyfus – vão
estender por mais um ano o compromisso público
que firmaram em julho de 2006. Conhecido como moratória
da soja, o acordo prevê que nenhuma soja plantada
em áreas deflorestadas após a data
da assinatura seja comercializada.
A cerimônia de extensão
da moratória acontece em São Paulo,
em evento no Maksoud Plaza Hotel. Organizado pelo
Grupo de Trabalho da Soja (GTS), criado em 2006
por empresas comercializadoras e representantes
da sociedade civil para firmar pôr em prática
o compromisso, conta com a presença da ministra
do Meio Ambiente Izabella Teixeira. O governo assinou
o acordo na comemoração de seu segundo
aniversário, em 2008.
“O comprometimento de um setor
líder do agronegócio brasileiro com
o desmatamento zero mostra que os produtos ligados
à destruição da Amazônia
não têm mais vez no mercado”, observa
Paulo Adario, diretor da campanha da Amazônia
do Greenpeace. “Pela complexidade do problema, ligado
à falta de governança na Amazônia,
os avanços até aqui são bastante
significativos. Mas ainda há muito trabalho
a ser feito até que a produção
agrícola brasileira esteja totalmente dissociada
do desmatamento, assegurando mais competitividade
no mercado internacional”.
O tamanho do trabalho pode ser
medido pelo tamanho do setor. Principal commodity
brasileira, a soja deu ao Brasil o título
de segundo maior produtor mundial do grão.
Para 2009/2010, estima-se uma safra de 66,1 milhões
de toneladas.
O recorde de produção,
no entanto, não se reflete, necessariamente,
em mais desmatamento. No Mato Grosso, por exemplo,
maior produtor brasileiro, a área plantada
aumentou 7,3% em relação à
safra passada. Segundo dados do Instituto do Homem
e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), nesse
mesmo período houve uma queda de 35% no desmatamento
acumulado do estado se comparado a 2008/2009.
Enquanto no Congresso a bancada
ruralista tenta derrubar o Código Florestal,
com a justificativa de que a lei inviabiliza a agricultura
brasileira, o setor da soja prova que é possível
e necessário produzir sem devastação.
“A moratória sensibilizou os produtores quanto
à necessidade de conciliar produção
com conservação. Só assim conseguimos
manter o acesso ao mercado internacional”, afirma
Carlo Lovatelli, presidente da Abiove.
Em nota pública, as empresas
consumidoras de soja brasileira, como McDonald’s,
Tesco e Carrefour, ratificam o acordo: “Encorajamos
outras companhias e outros setores, incluindo governos,
a se engajarem em esforços semelhantes, para
garantir que a Amazônia não seja devastada
pela produção de quaisquer commodities.
O registro das fazendas no bioma é um elemento
crucial. Todos concordamos que o processo [da moratória]
precisa continuar.”.
Alguns, porém, ainda não
acordaram para isso. A lista de áreas desmatadas
com soja se ampliou de 12, no ano passado, para
75 casos esse ano. A identificação
dessas áreas foi finalizada pelo GTS com
ajuda do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe), que desde a última safra entrou em
campo para refinar o monitoramento. Com imagens
de satélite, o Inpe passou a identificar
inclusive pequenos desmatamentos, além de
diferenciar áreas degradadas e de pasto das
terras ocupadas por agricultura. Como parte do monitoramento
de rotina dos vetores de desmatamento, o Greenpeace
também acompanha a safra da soja.
O aumento de casos tem a ver com
a ampliação da qualidade do monitoramento
e com a dinâmica de produção
do grão. Desde que a moratória foi
assinada, três anos se passaram até
o plantio da safra 2009-2010, período médio
que os fazendeiros levam para adaptar a terra para
a soja.
Na safra 2008-2009, 12 produtores
que descumpriram a norma foram bloqueados no sistema
das empresas e não receberam financiamento
para a safra posterior. A sanção foi
comprovada em auditoria externa, apresentada ao
GTS. O mesmo deve ser feito nos novos casos.
Agora é o setor público
quem precisa fazer sua parte. “Os governos federal
e estaduais precisam asseguar que o cadastro ambiental
rural das propriedades será realmente implantado
até o final deste ano em toda a Amazônia”,
pontua Raquel Carvalho, do Greenpeace. “As empresas
comercializadoras de soja também podem dar
uma grande contribuição, incluindo
o critério de cadastro na lista de exigências
a seus fornecedores”.
Essa ferramenta é essencial
para identificar os responsáveis por novos
desmatamentos, além de tornar mais eficiente
a separação de quem produz sem desmatar
daqueles que desafiam a moratória. “O Brasil
pode produzir sem desmatar. Mas tem de reforçar
estratégias como o cadastro rural, a legislação
ambiental, o suporte técnico aos produtores
e uma política de crédito que não
ameace as florestas”, diz Carvalho.