20/10/2010
Carine Corrêa (*)
A Mata Atlântica apresenta
hoje a área de vegetação nativa
brasileira mais devastada do País. Reduzida
a apenas 27% de sua cobertura original, ainda é
uma das regiões do mundo mais ricas em diversidade
biológica, embora dados apresentados pela
SOS Mata Atlântica assegurem que apenas 7,26%
de seus remanescentes permanecem bem conservados.
Sua manutenção e
preservação deixou de ser uma prioridade
restrita aos ambientalistas. Agora, depende do envolvimento
de todos os setores produtivos, econômicos
e sociais do Brasil, uma vez que em seus limites
vivem 123 milhões de pessoas - 67% de toda
a população brasileira.
Esse número expressivo
de habitantes necessita da preservação
dos remanescentes de vegetação nativa,
dos quais depende o fluxo de mananciais de águas
que abastecem pequenas e grandes cidades.
As áreas de cobertura vegetal
nativa que ainda restam prestam serviços
ambientais importantes, como a proteção
de mananciais hídricos, a contenção
de encostas, a temperatura do solo e a regulação
do clima, já que regiões arborizadas
podem reduzir a temperatura em até 2º
C.
Segundo um estudo da entidade
WWF, mais de 30% das 105 maiores cidades do mundo
dependem de unidades de conservação
para garantir seu abastecimento de água.
As matas ciliares, nome dado ao conjunto de vegetação
localizada às margens dos cursos de água,
foram avaliadas como comprometidas na Mata Atlântica.
São fundamentais para a proteção
e preservação da diversidade da flora
e fauna, pois além de evitar o agravamento
de secas e o aumento das enchentes, também
funcionam como corredores para que animais e sementes
possam transitar entre as áreas protegidas
e garantir a alimentação e variabilidade
genética das mais diferentes espécies.
As áreas bem conservadas
e grandes o suficiente para garantir a biodiversidade
e manutenção da Mata Atlântica
a longo prazo não chegam a 8% de sua cobertura
vegetal original. A região continua a sofrer
sérias ameaças, que podem se agravar
caso o Código Florestal brasileiro sofra
alterações que não garantam
a utilização responsável e
sustentável de seus recursos naturais.
Além de reduzidos, os remanescentes
estão fragmentados e se distribuem de maneira
não uniforme ao longo do território,
fator que compromete a perpetuidade de espécies
raras, endêmicas e ameaçadas de extinção.
Hotspot - Especialistas estimam
que a Mata Atlântica, considerada um hotspot
(área prioritária para conservação,
com alta biodiversidade e endemismo e ameaçada
no mais alto grau) possua mais de 20.000 espécies
de plantas, aproximadamente 35% de toda a flora
existente no País.
Segundo dados da Conservação
Internacional (CI), trata-se do hotspot número
1 entre as regiões monitoradas em todo o
mundo. Levantamentos indicam que sua área
abriga 849 espécies de aves, 370 de anfíbios,
200 de répteis , 270 espécies de mamíferos
e cerca de 350 espécies de peixes. Outro
dado alarmante: das 472 espécies ameaçadas
de extinção em todo o território
nacional, 276 (mais de 50%) estão na região.
"As ações de
proteção do MMA direcionadas à
Mata Atlântica incluem o aperfeiçoamento
da legislação, com a aprovação
da Lei da Mata Atlântica e a instituição
de projetos e programas de conservação
e recuperação de mata nativa",
afirma o coordenador do núcleo Mata Atlântica
do MMA, Wigold Schaffer. "Também envolvem
o monitoramente e fiscalização dos
desmatamentos e queimadas, a criação
e implementação de unidades de conservação
e a ampliação de parcerias com instituições
públicas e privadas da sociedade civil."
Considerada por especialistas
como um avanço na legislação
ambiental brasileira, a Lei da Mata Atlântica
(nº 11.428/2006) e sua regulamentação
possuem regras claras e incentivos para que a conservação,
proteção, regeneração
e utilização sustentável de
seus componentes sejam implementadas.
Schaffer explica que uma das principais
metas do Governo Federal é transformar pelo
menos 10% da área total da região
em unidades de conservação (UCs) de
proteção integral e uso sustentável.
Atualmente, existem 123 UCs federais e 225 estaduais
na Mata Atlântica, o que resulta em quase
1,7 milhão de hectares transformados em áreas
de proteção integral (3%) e pouco
mais de 2 milhões de hectares de áreas
de uso sustentável.
Ameaça - Dentre as espécies
de flora ameaçadas em seus limites, destacam-se
o pau-brasil, araucária, palmito-juçara,
jequitibá, jaborandi, jacarandá e
imbuia, além de orquídeas e bromélias.
Com relação à
fauna, das 202 espécies de animais consideradas
oficialmente ameaçadas de extinção
no País, 171 eram da Mata Atlântica.
Das 20 espécies de répteis ameaçadas
no Brasil, 13 ocorrem neste bioma. Entre os animais
terrestres que ocorrem na região sob alto
risco de extinção, 185 são
vertebrados (quase 70% do total ameaçado
no Brasil), entre eles 118 aves, 16 anfíbios,
38 mamíferos e 13 répteis.
Alguns deles ficaram bastante
conhecidos após campanhas de preservação,
como o mico-leão-de-cara-dourada, mico-leão-da-cara-preta,
a saíra-sete-cores, papagaio-da-cara-roxa
e o tatu-bola.
Além da perda de hábitat,
as espécies da Mata Atlântica são
vítimas do tráfico de animais, comércio
ilegal que movimenta no mundo US$ 10 bilhões
por ano.
Fatores de perda - Entre os fatores
de destruição da vegetação
nativa da Mata Atlântica constam a expansão
da pecuária bovina, a implantação
de monoculturas agrícolas, o reflorestamento
com espécies exóticas, a abertura
de novas fronteiras de agricultura e de ferrovias
e rodovias sem estratégias sustentáveis.
O avanço desordenado das
cidades, empreendimentos e grandes obras de infraestrutura,
bem como a mineração e a exploração
madeireira também contribuíram para
a degradação da cobertura vegetal
original.
De 2005 a 2008, os estados que
mais desmataram foram Minas Gerais, Santa Catarina
e Bahia, responsáveis por mais de 80% do
total de desmatamento ocorrido no período.
Em 2006, o MMA indicou 880 áreas
prioritárias para conservação
distribuídas em 429 mil km2 de Mata Atlântica.
Desse total, 522 são áreas novas e
358 já possuem algum tipo de proteção.
Corredor Ecológico - O
conceito de corredor ecológico ou corredor
de biodiversidade se refere a extensões significativas
de ecossistemas nos quais ocorre o fluxo de indivíduos
e genes entre áreas remanescentes de ecossistemas,
unidades de conservação e áreas
protegidas. Aumentam, assim, a probabilidade de
sobrevivência das diferentes espécies
que neles habita, e asseguram a manutenção
de processos evolutivos em larga escala.
O Corredor Central da Mata Atlântica,
localizado nos estados da Bahia e Espírito
Santo ao longo da costa atlântica, estende-se
por mais de 1.200 km no sentido norte-sul, e foi
implementado desde março de 2002. O corredor
agrega ecossistemas aquáticos de água
doce e marinhos (dentro da plataforma continental).
O projeto conta com a assistência
técnica da Cooperação Brasil-Alemanha
(GTZ) e com investimentos do banco alemão
KFW e da União Europeia. Também atuam
em projetos de conservação da região
a Fundação SOS Mata Atlântica,
Conservação Internacional, WWF, Mater
Natura e outras entidades não-governamentais.
Outra grande área de preservação
dentro dos limites da Mata Atlântica é
o Corredor da Serra do Mar, que cobre cerca de 12,6
milhões de hectares, do Paraná ao
Rio de Janeiro, englobando as serras do Mar e da
Mantiqueira.
Bom exemplo - Quando adquiriu
a Fazenda Bulcão, em Aimorés (MG),
o fotógrafo Sebastião Salgado encontrou
uma propriedade quase totalmente formada por pasto
degradado. Com o processo de recuperação
da área, realizado pelo Instituto Terra,
o local foi transformado em Reserva Particular do
Patrimônio Natural (RPPN), e a fazenda foi
tornou-se a primeira RPPN recuperada de área
degradada na Mata Atlântica.
Nela já foram plantadas
mais de 1 milhão de mudas nativas desde 1999.
Como resultado, o fluxo de água da região
ficou mais homogêneo ao longo do ano, e foram
cadastradas sete nascentes que ainda não
haviam sido identificadas no Córrego do Bulcão,
que passa dentro da propriedade. O local funciona
também como corredor ecológico e referência
de envolvimento social na preservação
da Mata Atlântica.
Definição e abrangência
- A Mata Atlântica é composta por um
conjunto de formações florestais,
campos naturais, restingas, manguezais e outros
tipos de vegetação que são
considerados ecossistemas associados e compõem
diferentes paisagens. Essas formações
cobriam originalmente total ou parcialmente 17 estados
brasileiros e abrangiam uma área de aproximadamente
1,3 milhão de quilômetros quadrados.
Ilhas oceânicas também
se agregam aos seus domínios, além
dos encraves de Mata Atlântica - como formações
florestais e brejos interioranos - existentes em
meio a outros biomas. As limitações
da região estão estabelecidas no Mapa
da Área de Aplicação da Lei
nº11.428/2006, do IBGE, que pode ser encontrado
nos sites www.ibge.gov.br ou www.mma.gov.br.
Edição: Rafael Fontana