Com 8.500 km de extensão,
Zona Costeira brasileira constitui região
de transição ecológica
14/10/2010
Carine Corrêa *
A Zona Costeira e Marinha brasileira é uma
das principais áreas de tráfego de
riquezas do País. Apresenta intensa atividade
de comércio e transportes, além de
sofrer alto impacto ambiental causado pela exploração
de petróleo. A região abrange 17 estados,
e sua faixa continental abriga 13 das 27 capitais
brasileiras, incluindo algumas das principais regiões
metropolitanas, onde vivem milhões de pessoas.
A concentração populacional
indica alto grau de intervenção humana
(ou antrópica) nos recursos naturais do bioma.
Segundo dados da Comissão Interministerial
para Recursos do Mar (CIRM), aproximadamente um
quarto da população brasileira vive
na zona costeira, somando 50 milhões de habitantes.
A parcela marinha da zona abrange
uma área de aproximadamente 3,5 milhões
de km2, integrada pelo mar territorial brasileiro,
ilhas náuticas e oceânicas, pela plataforma
continental e pela Zona Econômica Exclusiva,
cujo aumento de 712 mil km2 em seus limites - além
das 200 milhas náuticas originais - está
sendo pleiteado pelo País junto à
ONU.
Embora o Brasil tenha sido a nação
do mundo que mais criou áreas de conservação
nos últimos 10 anos, sua região marinha
é a menos protegida. Apenas 1,57% dos 3,5
milhões de km2 de mar sob jurisdição
brasileira está sob proteção
em unidades de conservação.
Variedade - A biodiversidade marinha
presente na zona costeira do País é
relativamente pouco conhecida. Muitas regiões,
ecossistemas e ambientes ainda precisam ser inventariados
adequadamente. Ainda assim, o número de espécies
de peixes catalogadas no bioma varia entre 705 e
1.209, considerando-se aquelas de áreas de
estuário.
Os mamíferos marinhos somam
57 espécies, e os cetáceos (baleias
e golfinhos) chegam a 53. Deste grupo, quatro animais
estão em estado de risco: a baleia-franca,
a jubarte, a franciscana ou toninha e o boto-cinza.
Das quatro espécies da ordem Sirenia existentes
no mundo, duas ocorrem no Brasil, uma delas o peixe-boi-marinho,
mamífero aquático mais ameaçado
de extinção.
Mais de 100 espécies de
aves estão associadas ao bioma costeiro e
marinho. Algumas são residentes e outras,
migrantes. Além do guará, espécies
ameaçadas de extinção vivem
e se reproduzem na Região Norte. As ilhas
costeiras das regiões Sul e Sudeste são
sítios onde ocorre a presença do trinta-réis,
da pardela-de-asa larga, do tesourão, do
atobá e do gaivotão.
Das sete espécies de tartarugas
marinhas conhecidas no mundo, cinco vivem em águas
brasileiras: a cabeçuda ou amarela; a verde;
a gigante ou de couro; a tartaruga-de-pente e a
tartaruga-pequena. O Brasil possui, ainda, os únicos
recifes de coral do Atlântico Sul. Das mais
de 350 espécies de corais recifais do planeta,
pelo menos 20 foram registradas no País,
sendo que oito são encontradas apenas em
nosso território. Nos manguezais brasileiros
também podem ser encontradas, no mínimo,
776 espécies de peixes, aves, moluscos, plantas
e artrópodos.
As principais ameaças à
biodiversidade marinha nacional são a aquicultura,
a pesca insustentável, a expansão
de áreas urbanas e o turismo, além
da poluição, redução
dos recursos hídricos, corte de madeira de
manguezais e mudanças climáticas.
A movimentação de
navios de todo o mundo também contribui para
o declínio da diversidade biológica
marinha, pois favorece a entrada de espécies
exóticas invasoras - a segunda maior causa
da perda de biodiversidade em todo o mundo - por
meio da água de lastro das embarcações,
que, uma vez ancoradas, despejam na área
brasileira as águas armazenadas recolhidas
em outros países, repletas de espécies
estrangeiras que disputam hábitats e nutrientes
com as espécies silvestres locais.
Alerta - De acordo com o documento
Panorama Global da Biodiversidade, lançado
pelo Programa das Nações Unidas para
o Meio Ambiente (Pnuma), ecossistemas costeiros
e marinhos continuam sofrendo a redução
de sua extensão, ameaçando uma de
suas funções básicas imprescindíveis,
a absorção de dióxido de carbono
(CO2) da atmosfera, fundamental na mitigação
das mudanças climáticas globais.
Além de acolher uma ampla
variedade de seres vivos, esses ecossistemas proporcionam
serviços essenciais à sobrevivência
humana, como alimentos, manutenção
do clima, purificação da água,
controle das inundações e proteção
costeira, bem como o turismo e lazer. O relatório
" A Economia de Ecossistemas e da Biodiversidade"
( TEEB, em inglês) estima que tais subsídios
podem gerar um valor de cerca de US$ 14 bilhões
de dólares anualmente. O cálculo envolve
o valor potencial de produtos comercializados, como
o pescado, além do valor adicional de serviços
ainda não-comercializados, incluindo o sequestro
de carbono e a proteção contra enchentes.
Metas e ações brasileiras-
O MMA prevê lançar ainda este ano o
Panorama da Conservação dos Ecossistemas
Costeiros e Marinhos do Brasil, um retrato da biodiversidade
marinha, suas ameaças, ações
e projetos de conservação, que abordará
os principais desafios para sua manutenção.
A publicação lançará
um alerta sobre a necessidade e a urgência
de conservação da zona costeira e
marinha do País.
A meta nacional estabelecida para
conter a perda de biodiversidade no Brasil, até
2010, era de conservar, no mínimo, 10% da
área de ecossistemas marinhos, que seriam
protegidos por meio de unidades de conservação
(UCs). De acordo com o Panorama Marinho, apenas
1,5% da zona costeira e marinha está protegida,
e o bioma representa uma grande lacuna em termos
de áreas protegidas no Brasil, consideradas
um dos principais instrumentos de conservação.
No bioma, existem 38 UCs de proteção
integral e 64 de uso sustentável.
Outra importante iniciativa está
relacionada à identificação
de espécies ameaçadas e à elaboração
de planos de ação para recuperá-las.
Para isso, o Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio) está coordenando
a avaliação do estado de ameaça
de espécies marinhas. O objetivo é
identificar a atual situação de grupos
em risco ou ameaça de extinção,
de forma a gerar informações técnico-científicas
para a revisão da lista nacional de espécies
ameaçadas. A partir destes dados serão
feitos planos de ação e adotadas medidas
que busquem reverter o estado de ameaça,
visando a recuperação de populações
marinhas.
Estoques pesqueiros - O maior
esforço nacional no levantamento da biodiversidade
marinha e da situação dos estoques
pesqueiros foi promovido pelo Programa Revizee,
que confirmou a baixa concentração
de nutrientes em águas nacionais e sua consequente
produtividade reduzida, que compromete os estoques
pesqueiros.
De acordo com o coordenador de
gestão de Recursos Pesqueiros do MMA, Roberto
Gallucci, é importante conter impactos sobre
manguezais e recifes de coral, como o desmatamento,
a degradação desses ecossistemas e
a sobrepesca, uma vez que são locais de reprodução,
crescimento e alimentação de boa parte
dos peixes marinhos. Em todo o mundo já desapareceram
27% dos recifes. Nos países em desenvolvimento,
um quarto do pescado anual é capturado nos
recifes de coral, o que torna esses ecossistemas
responsáveis pelo sustento de cerca de 1
bilhão de pessoas somente na Ásia.
"É fundamental promover
a gestão eficiente, a recuperação
e uso sustentável dos recursos pesqueiros",
afirma Gallucci. "Preocupa muito o quadro dos
impactos ambientais no bioma costeiro e marinho.
Por isso, será necessário adotar mecanismos
de recuperação e conservação
dos estoques pesqueiros, entre os quais, o estabelecimento
de áreas de exclusão de pesca",
diz.
O MMA atua em programas para conservação
de ecossistemas-chave- como manguezais e recifes
de coral -, além de contribuir com os planos
de gestão para espécies que têm
sido muito pescadas (sobreexplotadas) e com o processo
de ordenamento pesqueiro.
A gerente de Biodiversidade Aquática
e Recursos Pesqueiros do MMA, Ana Paula Prates,
afirma que o desejável seria instituir uma
Política Nacional de Conservação
dos Oceanos, com meios garantidos para sua execução
e participação de diferentes parceiros
e setores governamentais em busca da manutenção
dos estoques pesqueiros e da biodiversidade marinha.
Ana Paula avalia, ainda, ser necessário
valorizar e implementar as unidades de conservação
existentes, criar novas áreas protegidas,
monitorar contínua e ininterruptamente os
ecossistemas mais frágeis, além do
incentivar e apoiar a pesquisa e divulgação
da importância dos ecossistemas costeiros
e marinhos para toda a população brasileira.
Extensão - A Zona Costeira
e Marinha do Brasil se estende da foz do rio Oiapoque
(AP) à foz do rio Chuí (RS), e abrange
os limites dos municípios da faixa costeira
a oeste até as 200 milhas náuticas,
incluindo as áreas em torno do Atol das Rocas
(RN), dos arquipélagos de Fernando de Noronha
(PE) e de São Pedro e São Paulo (PE),
e as ilhas de Trindade e Martin Vaz, situadas além
do limite marinho. Sua faixa terrestre se estende
por aproximadamente 10.800 mil quilômetros
ao longo da costa - computados os recortes de litoral
e reentrâncias naturais- e possui uma área
de aproximadamente 514 mil km2.
Mudanças Climáticas
- Os ecossistemas costeiros e marinhos, como recifes
de coral e manguezais, são considerados especialmente
vulneráveis às mudanças climáticas
por sua fragilidade e limitada capacidade de adaptação,
com danos que podem se tornar irreversíveis.
Os recifes de corais, por exemplo, podem ser o primeiro
ecossistema funcionalmente extinto pelas mudanças
do clima, caso ocorra um aumento médio de
2 a 3 ºC de temperatura.
Cientistas consideram que os manguezais
e marismas sejam negativamente afetados pela elevação
do nível do mar, especialmente nos casos
em que existem barreiras físicas no lado
terrestre, como diques e cidades. Os impactos negativos
sobre as zonas úmidas costeiras atingirão
diretamente populações humanas. Muitas
das comunidades mais pobres do planeta moram em
áreas costeiras e dependem dos manguezais
e da pesca nos recifes de coral para sua segurança
alimentar.
A seguir, número de espécies
marinhas nacionais em estado de risco ou ameaça
de extinção
(Em 2011, novas espécies
serão avaliadas)
Mamíferos marinhos: 57
espécies - 6 ameaçadas
Quelônios marinhos (tartarugas): 5 espécies,
todas ameaçadas, sendo que duas criticamente
em perigo
Corais: 23 espécies - 2 ameaçadas
Moluscos marinhos: 46 espécies - 2 ameaçadas
e 1 sobreexplotada
Crustáceos marinhos: 27 espécies -
3 ameaçadas e 10 sobreexplotadas
Peixes marinhos e estuarinos: 1.209 espécies
- 19 ameaçadas e 32 sobreexplotadas
Aves marinhas: cerca de 100 espécies - 17
ameaçadas
* Edição: Rafael Imolene