18/10/2010
Carine Corrêa
A partir de 18 de outubro, representantes de 193
nações estarão reunidos na
cidade japonesa de Nagoya para integrar os debates
da 10ª Conferência
das Partes (COP-10), da Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB). As autoridades
vão tratar, até o dia 29 de outubro,
de um tema de alto interesse ambiental e econômico
em todo o mundo: a perda de biodiversidade.
Como líder do grupo dos
países megadiversos (17 nações
que detêm a maior taxa de biodiversidade do
mundo), o Brasil defenderá a implementação
dos compromissos firmados entre as nações
para conter a perda de biodiversidade e a extinção
de espécies biológicas. Apesar de
nenhum país signatário ter conseguido
alcançar as metas propostas em 2002 pela
CDB, de acordo com o relatório GBO3 do Pnuma,
o Brasil foi o que mais criou áreas protegidas
nos últimos oito anos, cerca de 75% dos territórios
de conservação em todo o planeta.
O País tentará aprovar
três itens prioritários na COP-10:
a criação de um regime internacional
de acesso e repartição de benefícios
derivados do uso dos recursos genéticos,
decisivo no combate à biopirataria; o novo
plano estratégico global da CDB para os próximos
dez anos - que vai definir novas metas globais de
proteção e preservação
da biodiversidade até 2020; e os recursos
financeiros para investimentos em projetos ligados
à biodiversidade.
De acordo com o secretário
de Biodiversidade e Florestas do MMA, Bráulio
Dias, estabelecer intenções comuns
é importante, mas é inútil
aprovar objetivos se não existirem meios
necessários para a implementação
de ações concretas. As iniciativas
dependem de recursos financeiros direcionados a
ações como capacitação
técnica e transferência de tecnologia.
Em relação ao novo
plano estratégico global da CDB para 2020,
Dias avalia que as metas devem ser mais específicas,
e que todos os setores envolvidos na economia das
nações signatárias devem se
engajar para alcançar as finalidades propostas.
Entre os objetivos estão incluídos
a promoção do uso sustentável
da diversidade biológica, a ampliação
de áreas protegidas, a repartição
de benefícios e os recursos financeiros necessários
para sustar a crescente perda de biodiversidade.
De acordo com Dias, temas ligados
à biodiversidade devem extrapolar o protagonismo
da área ambiental, já que os setores
que destroem os recursos naturais são ligados
à economia, como a agricultura, infraestrutura
e energia. O secretário defende o engajamento
e comprometimento de todos os atores econômicos
e sociais, além da mudança de práticas
para que a perda da biodiversidade possa ser interrompida.
"A União Européia,
por exemplo, defendeu propostas fortes para reduzir
a perda da biodiversidade, mas não assumiu
compromissos para ajudar países em desenvolvimento
com aportes significativos de recursos financeiros",
afirma o secretário. "É possível
aumentar o apoio financeiro para medidas de adaptação
e mitigação, a exemplo do que aconteceu
com a questão climática", diz.
Repartição de benefícios
- O foco do debate sobre repartição
de benefícios será o pagamento, por
países desenvolvidos, de royalties gerados
pelo comércio de produtos que utilizam matérias-primas
provenientes de recursos genéticos das nações
em desenvolvimento.
Caso aprovado o protocolo de acesso
e repartição de benefícios,
empresas e grupos farmacêuticos, biotecnológicos
e agrícolas, por exemplo, teriam obrigações
mais bem definidas para o repasse de recursos financeiros
a povos e comunidades detentores de conhecimentos
tradicionais relacionados às plantas e animais.
Outro ponto importante - e considerado
sensível - dessa negociação
envolve a propriedade intelectual no âmbito
da Organização Mundial do Comércio
(OMC), além de interesses econômicos
da União Européia e de países
não signatários da CDB, como os Estados
Unidos.
Durante a reunião no Japão,
os países membros da COP-10 vão deliberar
sobre outros temas relevantes, como a estratégia
global de conservação das plantas,
o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança
e a Plataforma Internacional sobre Biodiversidade
e Serviços Ecossistêmicos, um órgão
independente e internacional semelhante ao Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas
(IPCC, em inglês).
Os grupos de trabalho montados
durante a convenção vão discutir,
ainda, a biodiversidade em áreas protegidas,
zonas costeiras, montanhas, águas marinhas,
REDD+ (novos mecanismos para evitar queimadas e
desmatamentos) e biocombustíveis, entre outros
temas.
Convenção sobre Diversidade Biológica
- A convenção foi aberta para assinatura
em 1992, mas sem metas e plano estratégico
definidos. Desta forma, os países a estabeleceram
como uma "convenção quadro",
criada para estabelecer princípios. "É
como se ela tivesse nascido incompleta, pois não
tinha detalhadas as metas e mecanismos de implementação,
fator que prejudicou bastante a implementação
da convenção até agora",
explica Bráulio Dias. Já em 2002,
as nações aprovaram o primeiro plano
estratégico para 2010, que agora será
substituído por um novo plano de metas estabelecido
para 2020.
Apesar de a Convenção
ter sido importante para negociar e estabelecer
uma agenda global e pontos de consenso, existe um
passivo de implementação as metas
da CDB. Prova disso é o relatório
do Pnuma - GBO3, que indica que as metas aprovadas
para 2010 não foram alcançadas.
Transversalidade - Dias explica
que o País está focado em outros objetivos-chave,
como o avanço nos meios e mecanismos financeiros,
tecnológicos e de cooperação
de setores da economia, que devem assumir responsabilidades
quanto à biodiversidade.
O País vai defender no
Japão a ideia de que a biodiversidade seja
tratada além da esfera ambiental, por toda
a sociedade, empresas e setores que trabalham com
projetos de desenvolvimento, que podem incorporar
a conservação da biodiversidade em
suas políticas.
"Caso isso não ocorra,
há o risco de se repetir erros do passado.
Tínhamos agendas ambientais desvinculadas
das agendas de desenvolvimento e havia uma postura
de sempre tentar recuperar o que era mal feito",
afirma Dias. "Isso resulta em um descompasso
na gestão dos recursos, pois ainda estamos
tentando conservar a biodiversidade e promover seu
uso sustentável, enquanto outros atores sociais
e econômicos fazem exatamente o contrário",
diz.
Uma referência sobre a ação
dissociada da área econômica e política
em relação à esfera ambiental
são os embates ocorridos entre os setores
de energia e meio ambiente. Sabe-se que o primeiro
provoca forte impacto sobre o segundo, e que quase
toda energia elétrica do Brasil vem de hidrelétricas.
O desmatamento, exemplifica Dias,
prejudica a produção de energia porque
aumenta a erosão e a sedimentação
nos reservatórios de água. Isso resulta
em uma baixa média do volume de água
que, a longo prazo, vai encurtar a sobrevida de
grandes hidrelétricas. No futuro, vai ocasionar
um inevitável prejuízo no fornecimento
de energia elétrica.
"Seria de interesse do setor
energético assegurar a longevidade e uma
maior oferta de água no Brasil", avalia
o secretário. "Os instrumentos da política
ambiental podem ajudar neste planejamento ao assegurar
maior conservação das áreas
protegidas, além de defender e implementar
melhor o Código Florestal para conservar
as áreas ribeirinhas e os locais de captação
das nascentes."
Edição: Rafael Imolene