Cancun, México, 03 de dezembro
de 2010 — Depósitos de carbono ao longo das
áreas costeiras em todo o globo, incluindo
manguezais, bancos de gramas marinhas e marismas
(que são terrenos lamosos ou alagadiços
à beira do mar), vêm armazenando enormes
quantidades de carbono durante séculos. E
esses depósitos podem fornecer uma ferramenta
imediata e de baixo custo para conter os impactos
das mudanças climáticas, anunciou
a Conservação Internacional (CI) esta
semana, durante uma apresentação
sobre o tema em Cancún, onde acontece a 16ª
Conferência das Partes (COP-16) da Convenção
das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas (UNFCCC).
O evento, "Carbono Azul:
valorando a mitigação de CO2 pelos
ecossistemas marinhos costeiros”, organizado pela
Conservação Internacional, em parceria
com a União Mundial para a Conservação
da Natureza (IUCN, da sigla em inglês), trouxe
a seguinte questão: estamos perdendo nossas
principais reservas de carbono ao longo das zonas
litorâneas?
Segundo os cientistas que apresentaram
a pesquisa, a resposta é enfática:
‘sim!’.
Apelidados de "carbono azul"
por sua habilidade de sequestrar e armazenar enormes
quantidades de carbono, os ecossistemas marinhos
costeiros apresentam grande potencial de mitigação
do clima, se forem valorados e bem manejados. Segundo
os cientistas, os depósitos totais de carbono
por quilômetro quadrado nesses sistemas costeiros
podem ser até cinco vezes maior que o carbono
armazenado nas florestas tropicais. Isso é
resultado da sua capacidade de sequestrar carbono
em taxas até 50 vezes superiores às
das florestas tropicais.
"O que temos visto é
que esses três ecossistemas - manguezais,
bancos de gramas marinhas e marismas - são
incrivelmente eficientes em armazenar carbono no
sedimento abaixo do solo por séculos a fio",
afirma Emily Pidgeon, diretora do Programa Marinho
de Mudanças Climáticas da Conservação
Internacional. "Para nós é tão
natural que os oceanos devam ser parte da solução
da mudança climática, que chega a
ser até surpreendente que eles não
tenham sido considerados até hoje",
confessa Emily.
De acordo com a análise
científica, os ecossistemas costeiros estão
sofrendo perdas no mundo todo, em um ritmo alarmante,
sendo que aproximadamente 2% estão sendo
removidos ou degradados por ano. Outras conclusões
importantes do estudo sobre a degradação
dos ecossistemas marinhos costeiros foram:
• 29% dos bancos de gramas marinhas
do mundo foram perdidos ou degradados
• 35% dos manguezais do planeta foram perdidos ou
degradados
• 35 mil km2 de manguezais foram removidos ao redor
do mundo entre 1980 e 2005, o que equivale a uma
área do tamanho de Taiwan.
"A perda dos manguezais é
como um golpe duplo para o nosso planeta: primeiro,
porque resulta numa rápida emissão
dos estoques de carbono que, em muitos casos são
resultado de séculos de depósitos
combinada com a perda de oportunidade de futuros
sequestros de carbono por essas áreas e,
em segundo , porque destrói os habitats que
são críticos para a as atividades
de pesca em todo o mundo ", analisa Pidgeon.
Também foi anunciado na
apresentação o lançamento de
um novo consórcio internacional de cientistas
liderado pela CI, chamando de Iniciativa do Carbono
Azul (Blue Carbon Iniciative, em inglês),
cujos membros incluem, além da CI, a IUCN,
o Centro de Monitoramento da Conservação
do Programa de Meio Ambiente das Nações
Unidas (UNEP-WCMC), a Comissão Intergovernamental
Oceanográfica (da Unesco), e a Restoring
America´s Estuaries.
"Nós nos reunimos
para estudar as possibilidades de mitigação
e do valor econômico dos ecossistemas marinhos
costeiros, porque essas áreas nos oferecem
uma das poucas opções de baixo custo
para remover o dióxido de carbono da atmosfera,
de forma efetiva e imediata," explica a diretora.
Durante os próximos 2 a
4 anos, a Iniciativa Carbono Azul tem como objetivo
orientar e desenvolver:
• Práticas de manejo em
áreas costeiras que conservem os estoques
de carbono
• Políticas que vão do âmbito
local ao nacional que enfatizem a importância
dos sistemas costeiros para a mitigação
das mudanças climáticas
• Mecanismos de incentivo e de pagamento de carbono
que valorem o carbono armazenado e sequestrado pelos
ecossistemas costeiros,
• Uma rede de projetos demonstrativos, sobretudo
nos ecossistemas costeiros da Indonésia,
Filipinas e do Pacífico Tropical Oriental,
• Ferramentas de comunicação e de
capacitação para o manejo do carbono
costeiro, além de incentivos.
"É importante que
a comunidade internacional comece a reconhecer o
potencial valor desses ecossistemas costeiros e
ofereça incentivos para a sua conservação
e restauração", aponta Rebecca
Chacko, diretora de Política Climática
da Conservação Internacional, durante
as negociações do Painel de Mudanças
Climáticas que acontece em Cancun. "A
partir do momento em que compreendermos o papel
que esses ecossistemas desempenham na mitigação
das mudanças climáticas, poderemos
até sermos capazes de desenvolver um mecanismo
internacional que possa contribuir para sua proteção
e restauração”, completa Rebecca.
Um evento paralelo dentro da COP-16,
a apresentação também revelou
os destaques de um relatório inédito
do Banco Mundial sobre o carbono costeiro, que tem
lançamento previsto para o início
do próximo ano .
"A ciência já
está disponível, mas até agora
não aconteceu nenhuma atividade coordenada
para consolidar esse conhecimento e transformar
em política ", avalia Stephen Crooks,
autor do relatório e consultor da Restoring
America´s Estuaries. "Nossa mensagem
é clara: a conservação é
uma alta prioridade se você quiser manter
séculos de carbono estocado no solo - e não
simplesmente liberá-lo no ar”, conclui o
cientista.