A última tentativa da turma
da motosserra de avançar,
no Congresso, contra a legislação
que protege nossas florestas acabou em fracasso.
Mas eles voltarão à carga em 2011
De um lado ONGs ambientalistas,
entre elas o Greenpeace, e alguns deputados aliados.
Do outro, o grupo de políticos que compõem
a bancada da motosserra na Câmara dos Deputados.
Os dois lados se enfrentaram novamente ao longo
de 2010. A turma da motosserra, sob a complascência
do Executivo, mexeu-se nos corredores do Congresso,
tentando ficar o mais longe possíve dos olhares
dos brasileiros.
A estratégia quase funcionou.
Em diversas ocasiões ao longo deste ano,
eles estiveram perto de empurrar mais para frente
uma proposta que acaba com a noção
de florestas como bem público, anistia desmatadores
e reduz sensivelmente as faixas de mata em encostas
e margens de rios que nos protegem de enchentes
e deslizamentos. Mas cada uma das movimentações
gerou reações do Greenpeace. E elas
produziram o efeito desejado, evitando que 2010
fôsse para a história como o ano em
que o Brasil andou para trás na proteção
de suas florestas.
O objetivo dos ruralistas era
aprovar até o final deste ano um texto que
enfraquece o Código Florestal, sem que a
sociedade fosse envolvida na discussão. Mas
eles falharam. Nesta semana o Greenpeace conduziu
uma última manifestação no
Congresso e nas redes sociais denunciando a ofensiva.
No mesmo dia, era anunciado o fim dos trabalhos
da Câmara em 2010. A apreciação
do projeto ficou para o ano que vem. Venceu-se uma
batalha. Mas a refrega ainda não terminou.
Há muitos anos os ruralistas
tentam acabar com o Código Florestal, principalmente
quando ele deixou de ser letra morta e passou a
ser aplicado, colocando quem agia na ilegalidade
em maus lençóis. No ano passado, a
pressão ruralista cresceu e, com a campanha
eleitoral, se intensificou em 2010. O Greenpeace
sempre trabalhou para não permitir o retrocesso
da lei, e não permitir que eleições
fossem usadas como trampolim para mudanças
que ameacem a saúde das florestas e, por
decorrência, do clima.
O neo-ruralismo
A formulação de
um projeto de reforma do código foi entregue
a Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator de uma comissão
especial apinhada de ruralistas. O trabalho de Aldo
foi cercado de controvérsias.
A comissão escutou poucos
cientistas e quase nenhum representante da sociedade
civil durante as ditas consultas públicas.
Também contratou a advogada Samanta Pineda
para analisar o relatório, paga com dinheiro
da verba indenizatória de Aldo e do presidente
da comissão especial, Moacir Micheletto (PMDB-PR).
Pineda era consultora jurídica da Frente
Parlamentar da Agropecuária.
Aldo deu o que falar. Como relator,
ele desconsiderou a opinião de pesquisadores
da área ambiental e escreveu o projeto de
lei com os ouvidos grudados nos interesses do agronegócio.
Quando Aldo apresentou sua primeira versão
do projeto de lei, a “Folha de S.Paulo” fez uma
seleção de pérolas: Aldo dizia
que a proteção ambiental é
uma invenção dos “estrangeiros” para
condenar o Terceiro Mundo à pobreza; pedia
a naturalização (?!) da jaca; confundia
aquecimento global com buraco na camada de ozônio;
e disparava contra os países ricos pelos
cruéis “mecanismos de desenvolvimento limpo”,
ignorando que eles são uma invenção
brasileira.
Reação
As ONGs, além de deputados
preocupados com a saúde das florestas, agiram
contra as mudanças propostas com ações
pacíficas e a divulgação da
bandalheira que corria solta nos corredores da Câmara.
Com a WWF e a SOS Mata Atlântica,
o Greenpeace organizou um seminário para
debater as propostas da comissão. O resultado
foi uma enxurrada de argumentos e pesquisas de especialistas,
que mostraram como o Brasil não precisa desmatar
para expandir suas fronteiras agrícolas.
O Greenpeace fez protestos em diversos momentos
do ano, para chamaram a atenção da
sociedade para a manobra política articulada
por Aldo e sua patota.
Na internet, a sociedade se posicionava
claramente contra o texto. No Twitter, centenas
de pessoas discutiam a questão. Milhares
assinavam uma petição do Greenpeace
contra a mudança do Código Florestal.
A repercussão foi grande, mas os deputados
ruralistas mantiveram seus planos e aprovaram o
texto de Aldo.
Atraso no campo
Os problemas do campo não
residem na legislação ambiental. Os
reais problemas residem na falta de infraestrutura
e logística para escoamento da produção;
na tecnologia na produção defasada;
no pouco crédito e na inexistência
de políticas públicas destinadas ao
aumento da produtividade; na precariedade da regularização
fundiária e na insegurança do produtor,
que sofre com oscilações dos preços
das commodities nos mercados por conta de especulação.
Todos esses problemas são
transformados pelos ruralistas em um falso debate,
de que apenas uma lei – o Código Florestal
– atrapalha a todos. O processo torto levou a produtores
rurais não cadastraram suas terras nos sistemas
estaduais – quando precisam detalhar seus ativos
e passivos ambientais – na esperança de se
“beneficiarem” com as alterações propostas
pelo projeto de lei. Hoje continuam vulneráveis
à legislação, por terem apostado
no canto da sereia ruralista.
O discurso da bancada da motosserra
ainda coloca em risco a credibilidade do Brasil
no cenário internacional. O governo assumiu
compromissos de redução de emissões
de gases-estufa e o mercado consumidor internacional
que não aceita mais produtos que tenham origem
a partir de áreas desmatadas. Enfraquecer
a legislação ambiental coloca em xeque
a credibilidade do país.
O primeiro ano do governo da presidente
eleita Dilma Rousseff promete. O Código Florestal
voltará às rodas de discussão.
Ela, nas vésperas das eleições
presidenciais, se comprometeu a proteger as florestas.
2011 será o ano da cobrança.
É preciso ouvir a sociedade.
A saída não pode ser a de servir os
interesses de apenas o setor ruralista, que vive
de se reeleger e se financiar da existência
do problema.
A discussão tem de ser
muito mais ampla, pois é o futuro do país
que está em jogo. Do jeito que é feito
hoje, todos perdem: o ambiente, a imagem do país
e a economia brasileira. Segurar a sanha da motosserra
e manter as florestas saudáveis são
sem dúvida um dos primeiros e mais urgentes
desafios de Dilma no começo do seu governo.