24/02/2011 - Enquanto membros
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC) e da Academia Brasileira de Ciência
(ABC) apresentavam a deputados um estudo científico
sobre as graves consequências das mudanças
propostas pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) no
Código Florestal, parlamentares, na maioria
ruralistas, convocados pelo PDT, se reuniram com
Rebelo em outro auditório
para elogiar o trabalho do relator
O líder do PDT, deputado
paraense e ruralista Giovani Queiroz, que convocou
a reunião paralela, negou que ela tivesse
objetivo de esvaziar o seminário dos cientistas,
técnicos e bancada ambientalista. “Foi mera
coincidência. A nossa reunião foi agendada
há 15 dias e faz parte de um processo de
discussão do partido sobre os mais importantes
temas do país, como a reforma política,
reforma tributária e, hoje, a reforma do
Código Florestal.”
Rebelo defendeu seu relatório
com o mesmo argumento básico com que o justificou
na Comissão Especial, em julho, ou seja,
de que o atual Código deixa na ilegalidade
100% dos agropecuaristas brasileiros. Criticou organizações
ambientalistas, que definiu como representantes
de interesses econômicos estrangeiros, e negou
que seu trabalho não tenha ouvido os cientistas.
Por fim, criticou deputados ambientalistas ao afirmar
que eles não participaram das audiências
públicas para discutir a questão nem
mesmo quando elas eram realizadas em seus estados.
Depois de falar e ser muito aplaudido
pelos deputados do PDT e alguns do DEM e do PMDB,
Aldo deu uma entrevista aos jornalistas:
O seu relatório está
sendo criticado no plenário 2, onde cientistas
fazem palestras a deputados sobre as consequências
das suas propostas, caso elas sejam aprovadas. O
senhor foi convidado para participar daquele seminário?
Aldo Rebelo – Não, nunca.
Aliás, a Frente Ambientalista não
costuma realizar debates democráticos sobre
os seus pontos de vista.
A informação é
que todos os deputados foram convidados. E o senhor
não acha que teria sido importante estar
lá para defender o seu relatório?
Aldo – Acho importante que haja
democracia e que todas as opiniões sejam
ouvidas e levadas em conta, como aconteceu na Comissão
Especial.
Quais os principais pontos divergentes?
Aldo – Eu creio que não
há divergências incontornáveis.
A divergência só é incontornável
com aqueles que acham que não deve haver
nenhuma adequação da lei e que não
tem nenhum problema 100% dos agricultores brasileiros
estarem na ilegalidade.
O senhor concorda em rever as
questões da anistia a quem desmatou até
2008 e a recomposição das APPs? Parece
que estes são alguns dos pontos de maior
discórdia.
Aldo – A anistia está no
decreto do presidente Lula e do ministro Minc, no
decreto 2.079. É uma conversão para
aqueles que se adequarem ao programa de regularização
ambiental. Acho que isso é um benefício
para o meio ambiente, já que as pessoas vão
refazer aquilo que foi motivo do auto de infração
e ao mesmo tempo elas vão se legalizar. Aqueles
que desmataram ilegalmente, que façam o reflorestamento.
A anistia do decreto 2.079 tem um prazo mais amplo
do que o meu. Meu prazo é para 3 junho de
2008. O prazo do decreto do presidente Lula e do
ministro Minc é para dezembro de 2009. Propõe
anistia nos mesmos termos que eu apresento. Acho
que isso tem de ser discutido, se o Ministério
do Meio Ambiente quiser. E eu mostro que o Programa
Mais Ambiente é muito parecido com aquilo
que eu proponho, oferecendo melhores condições
para essa regularização.
O senhor concorda em aumentar
APPs de margem de rio, voltar aos 30 ou ficar em
20 metros?
Aldo – Não vejo quem esteja
propondo isso, porque isso é uma negociação
com o MMA. A minha proposta era voltar ao velho
Código que fixava em cinco metros. Outros
queriam manter em 30. Nós chegamos a um acordo
de 15 metros, para viabilizar principalmente os
pequenos proprietários.
Uma das críticas é
que as mudanças propostas pelo seu relatório
podem provocar aumento no desmatamento e que o Brasil
não poderá cumprir seus compromissos
de reduzir a emissão de gases de efeito estufa.
Aldo – É com a atual legislação
que o Brasil conheceu os maiores índices
de desmatamento da sua história. Qualquer
cidadão brasileiro que adquirir uma propriedade
está autorizado a desmatar 80% na Mata Atlântica,
65% no Cerrado e 20% na Amazônia, pela lei
atual. Eu proponho uma moratória de 5 anos
para abertura de novas áreas para a agricultura
e pecuária, enquanto se faz o zoneamento
econômico e ecológico.
Parece que haverá uma retomada
de discussão, de negociação,
antes da votação em plenário.
O que o senhor antevê como possibilidade de
consenso?
Aldo – Não posso antever
nada, porque o processo de negociação
que está sendo instituído pelo presidente
da Câmara, Marco Maia, ainda não foi
aberto. Mas sempre fui e serei aberto ao diálogo
e à negociação porque sei que
o que for aprovado aqui tem que ser a expressão
da vontade da maioria. E não se aprova nada
com a maioria se você não estiver aberto
a negociar.
O seminário no plenário
2 pretende demonstrar que a bancada ambientalista
busca uma base científica para a modernização
do Código Florestal. O senhor ouviu técnicos
e cientistas? O senhor ouviu a SBPC?
Aldo – Nós ouvimos dezenas
de cientistas. Participei de reuniões com
a SBPC. O problema é que os integrantes da
bancada do meio ambiente não participaram
de nenhuma audiência pública. Não
foram nem aos Estados dos quais eles são
representantes.Ouvi as universidades, a Embrapa,
técnicos agrícolas, pesquisadores...
Quem quiser consultar o relatório de 287
páginas, vai encontrar os nomes e as opiniões
desses pesquisadores. Agora, eles teriam de ter
participado das audiências públicas
e ter visto como foi negociada redução
da mata ciliar com o Ministério do Meio Ambiente,
redução para córregos de até
cinco metros, de 30 para 15 metros. Toda a demais
mata ciliar continuará na lei, mesmo não
existindo em nenhum lugar do mundo. No Código
antigo, que eles dizem defender, a mata ciliar começava
em cinco metros e ia até 100 metros. Houve
essa alteração recente que passou
de cinco para 30 e de 30 para 500 metros. Agora
eles vendem isso como se fosse coisa do Código.
Não é, é de uma alteração
no Código. Na Austrália, a mata ciliar
começa em cinco metros e termina em 20. Nos
EUA , em boa parte dos estados, ela nem existe.
Em boa parte da Europa não consta da legislação,
como a Reserva Legal não consta de nenhuma
legislação europeia.
Quer dizer que se eles desmataram
lá, então, deve ser permitido também
desmatar aqui?
Aldo – Não. Nós
vamos desmatar até o limite das nossas necessidades.
Como já desmatamos, para plantar arroz, para
plantar feijão. Infelizmente você não
constrói uma cidade, você não
planta, você não cria se não
remover a vegetação nativa. Temos
que encontrar o equilíbrio entre nossas necessidades
de proteção do meio ambiente. Sem
meio ambiente você também não
tem nada, nem agricultura. Você não
produz nada assoreando rios, destruindo solo frágil,
isso é uma tragédia que não
podemos permitir que aconteça, mas ao mesmo
tempo as terras viáveis, propícias
para a agricultura, nós vamos usar. Precisamos
ter equilíbrio, porque temos ainda 70% do
nosso território coberto de vegetação
nativa, enquanto o europeu não tem sequer
1%. Temos de ter equilíbrio entre produzir
e proteger.
Até que ponto o senhor
estaria aberto a negociações?
Aldo – Até o ponto razoável,
o que depende da apresentação das
sugestões daqueles que acham que o meu relatório
deve ser modificado. Meu relatório não
é o ponto final de nada. Mas ele só
pode ser discutido à luz de propostas que
ajudem a solucionar os problemas que eu procurei
resolver.
O Ministério do Meio Ambiente
está acenando com a apresentação
de uma proposta alternativa. O que acontecerá
com o seu relatório se isso acontecer?
Aldo – Eu precisaria primeiramente
entender o que é uma proposta alternativa.
Constitucionalmente, regimentalmente, a proposta
alternativa não existe. O que existe é
algo que venha do Executivo, como um projeto de
lei, como uma medida provisória ou algo que
seja da iniciativa do próprio Congresso.
Não acredito que o Ministério do Meio
Ambiente vá enviar alguma proposta porque
o Ministério sempre teve e terá as
portas abertas para discutir e fazer sugestões
diretamente ao relator.
ISA, Julio Cezar Garcia
+ Mais
Ruralistas pressionam Banco do
Brasil na expectativa de alteração
do Código Florestal
15/02/2011 - Ao contrário
do noticiado em site de deputado e na imprensa,
instituição não suspendeu condicionantes
para a concessão de crédito, mas apenas
a assinatura de declaração atestando
conhecimento da lei. Mudança não tem
efeito prático porque exigências só
começarão a valer a partir de junho,
como noticiado pelo ISA. Banco garante decisão
de aplicá-las depois desse prazo
Desde ontem, o Banco do Brasil
parou de exigir dos candidatos ao crédito
agrícola uma declaração assinada
atestando o conhecimento do Código Florestal
e do prazo para regularizar sua situação
ambiental. A decisão foi tomada na sexta-feira,
depois de uma enxurrada de críticas de lideranças
e organizações ruralistas a restrições
de crédito para quem não está
em dia com a legislação.
A mudança, no entanto,
não tem efeito prático. O banco vinha
pedindo a assinatura da declaração
desde o início do ano para precaver-se, com
uma garantia adicional, do risco de financiar quem
comete irregularidades. Segundo especialistas, no
entanto, o procedimento tem eficácia legal
limitada.
Uma reportagem publicada pelo
ISA, na quarta-feira, dia 9, informava que o banco
começará a exigir dos produtores que
demandem crédito a averbação
da Reserva Legal (RL) de sua propriedade ou a adesão
ao programa de regularização ambiental,
o Mais Ambiente – mas só depois de 12 de
junho. A partir daí, os produtores rurais
poderão sofrer multas e embargos por desmatamentos
ilegais, conforme o Decreto nº 7.029/2009 (veja
reportagem).
Ainda na quinta-feira, o site
do deputado federal Moacir Micheletto (PMDB-PR)
informava de forma errônea que o banco decidira,
por um pedido do parlamentar, “suspender as exigências
ambientais, como a averbação de Reserva
Legal, para liberação dos empréstimos
agrícolas”. De acordo com o texto, essas
exigências estariam “impedindo a liberação
de crédito aos produtores, situação
que provocava, já nesta safra, redução
da área plantada e da produção,
‘com visíveis impactos sobre os preços
dos alimentos, aumento da inflação,
desabastecimento e graves consequências para
a sociedade brasileira’” (veja a íntegra
da nota). O jornal O Estado de S.Paulo publicou
notícia com conteúdo semelhante (veja
aqui).
Micheletto é coordenador
político da Frente Parlamentar da Agropecuária
e foi presidente da comissão especial que
analisou o polêmico relatório do deputado
Aldo Rebelo (PCdoB-SP) sobre a mudança do
Código Florestal na Câmara dos Deputados.
Se o relatório for aprovado como está,
parte das medidas restritivas ao crédito
do Banco do Brasil e de outros bancos perderá
eficácia.
Ao defender mudanças no
Código Florestal, a presidente da Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)
e senadora Kátia Abreu (DEM-TO) reproduziu
em plenário a mesma informação
de que o banco já estaria cobrando o registro
em cartório da averbação da
RL.
O gerente executivo da Diretoria
de Agronegócio do BB, Álvaro Tosetto,
garantiu que a decisão de negar crédito
a quem não cumprir os critérios definidos
pelo Decreto nº 7.029 a partir de junho está
mantida. “A retirada dessa declaração
da parte do banco não implica nenhuma mudança
de postura”, disse. Ele informou que, segundo representantes
dos agricultores, a declaração estava
causando confusão, daí o fim da exigência
do documento. “Houve um entendimento de boa parte
dos produtores e de algumas entidades de que essa
declaração ensejaria alguma espécie
de compromisso com uma data e uma condição
que estariam sendo discutidas na revisão
do Código Florestal. Eles entendiam que não
haveria necessidade de fazer uma formalização
perante o banco de uma coisa que está prestes
a ser alterada.” Tosetto não confirma que
a suspensão da declaração foi
feita a pedido de Moacir Micheletto e diz que vários
parlamentares e organizações do setor
agrícola entraram em contato com o banco
reivindicando-a.
Responsabilidade ambiental compartilhada
Instituições financeiras
públicas e privadas começaram a condicionar
a concessão de crédito à regularização
ambiental há cerca de três anos, o
que vem causando polêmica e foi feito na esteira
de uma série de medidas do governo para apertar
o cerco de quem desmata ilegalmente. Há quase
30 anos, porém, a Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente (nº6.938/1981) já
previa a responsabilização de quem
financia atividades econômicas que causam
danos ao meio ambiente.
O promotor Alexandre Lima Raslan,
do Núcleo das Promotorias de Justiça
do Pantanal e da Bacia do Paraná, de Campo
Grande (MS), lembra que, do ponto de vista legal,
ninguém pode alegar desconhecimento sobre
a lei, daí as limitações da
declaração. “Essa declaração
é muito mais para o banco se resguardar na
relação dele com seu cliente. Mas
isso não afeta em nada a responsabilidade
ambiental do banco ou do produtor”. Ele entende
que uma instituição bancária
tem corresponsabilidade sobre os danos ambientais
causados por atividades financiadas por ela e que,
numa eventual ação do Ministério
Público contra quem comete infrações
ambientais, o documento não faria diferença.
“O fato de exigirmos ou não
a declaração não altera em
nada a situação do produtor”, confirma
Álvaro Tosetto. Ele explica que o principal
objetivo do documento foi divulgar o prazo-limite
para a regularização ambiental e que,
uma vez que ele se tornou público, não
haveria mais a necessidade do procedimento. Nenhuma
reclamação formal sobre a exigência
teria chegado à sede do BB.
ISA, Oswaldo Braga de Souza