22/02/2011
Maiesse Gramacho
"A Rio+20 não deve se transformar
em uma arena de acusações. Porém,
devemos discutir abertamente as falhas que enfrentamos
hoje, em relação ao que decidimos
fazer em 1992." A avaliação foi
feita pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira,
em discurso proferido ontem (21/2) em Nairóbi
(Quênia), onde participa da reunião
do Fórum Global de Ministros de Meio Ambiente.
No evento, Izabella foi a principal
oradora de mesa-redonda que debateu o processo preparatório
para a Conferência das Nações
Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável,
conhecida como Rio+20, que será realizada
na cidade do Rio de Janeiro em junho de 2012. A
conferência marca os vinte anos da Rio 92,
evento que estabeleceu uma nova base para a avaliação
internacional das relações entre proteção
ambiental, crescimento econômico e justiça
social.
"Ao nos aproximarmos do vigésimo
aniversário desse evento histórico
e dos avanços tornados possíveis,
temos a oportunidade de refletir sobre o que conquistamos
e o que ainda precisa melhorar", disse a ministra
em seu discurso. A mesa-redonda contou, também,
com a participação do diretor-executivo
do Programa das Nações Unidas para
o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner, e do secretário-geral
da Rio+20, Sha Zukang.
Para Izabella, manter o compromisso
político assumido à época é
essencial. "Desde 1992, muitos desafios internacionais
urgentes surgiram, e, não raro, tiraram a
prioridade do desenvolvimento sustentável.
No entanto, vemos uma necessidade crescente de iniciativas
globais, regionais e nacionais, e também
notamos os custos crescentes de modelos de produção
e consumo insustentáveis", observou.
De acordo com a ministra brasileira,
a Rio+20 irá se defrontar com condições
sociais, ambientais e econômicas específicas,
que demandarão soluções criativas.
"Devemos encontrar caminhos para tornar realidade
a visão de 1992."
Preparação - Em
seu discurso no Fórum de Ministros, Izabella
Teixeira frisou que o foco da Rio+20 será
no desenvolvimento sustentável, não
no meio ambiente isoladamente. "Entendemos
que os problemas globais que algumas vezes são
vistos com ambientais são, na realidade,
problemas de desenvolvimento, que requerem uma abordagem
mais integrada em suas soluções",
disse. "É com essa perspectiva que o
PNUMA deve trabalhar para a Rio+20", recomendou.
A ministra destacou a importância
da atuação do Pnuma no processo preparatório
para a conferência, mas disse que o papel
da instituição não será
cumprido, "caso opte por trabalhar com uma
perspectiva ambiental limitada, sem a consideração
plena do desafio do desenvolvimento sustentável".
Em seu discurso, Izabella também
reforçou a necessidade de o Pnuma continuar
fornecendo elementos para discussão, inclusive
nas áreas dos dois temas principais da Rio+20:
economia verde e governança internacional
para o desenvolvimento sustentável.
"Esses são temas que
são vistos como divisores e sobre quais devemos
nos debruçar para juntos desenvolvermos abordagens
nas quais os países possam se reconhecer,
e reconhecer suas necessidades. Qualquer abordagem
que aumente o fosso entre os países desenvolvidos
e os em desenvolvimento será inaceitável,
tornando impossível o consenso necessário
para uma conferência exitosa em 2012",
concluiu a ministra.
+ Mais
ONU discute o papel da sociedade
civil no combate à desertificação
24/02/2011
O terceiro dia (24/2) de discussões na 9ª
Sessão do Comitê para Revisão
da Implementação da Convenção
de Combate à Desertificação
(CRIC9) foi dedicado à sociedade civil organizada.
Pela manhã, os delegados
abordaram em plenária o papel das organizações
da sociedade no processo de implementação
da convenção e no cumprimento de metas
de combate à desertificação.
As partes defenderam a ampliação da
participação da sociedade civil no
processo de elaboração dos relatórios
nacionais e de sua atuação em fóruns
internacionais. Ressaltaram ainda a importância
das ONGs para a elaboração de políticas
públicas de Estado.
À tarde, a sessão
foi aberta ao diálogo e representantes de
ONGs foram convidados a apresentar suas atividades
na plenária da CRIC9. Pontos focais da sociedade
civil articulada de cinco países, representando
as 18 instituições presentes, incluindo
o Brasil, expuseram suas experiências e desafios
com as comunidades rurais, além de recomendações
para a implementação da convenção.
Os discursos evidenciaram a importância da
valorização dos conhecimentos tradicionais,
da transferência e disseminação
das boas práticas, e da ampliação
da destinação de recursos às
organizações.
Entre as reivindicações
mais marcantes que a sociedade civil traz para o
CRIC figura uma participação efetiva
das ONGs na implementação da convenção,
com iniciativas reais, de campo, envolvendo as comunidades
locais e o intercâmbio de conhecimentos.
No caso brasileiro, para que haja
uma efetividade do envolvimento da sociedade civil
é necessário a definição
de um marco legal específico que facilite
as relações com o Governo Federal.
E essa é uma luta que as ONGs vêm travando
há alguns anos. "A elaboração
de um marco legal adequado à realidade da
sociedade civil é uma condição
necessária e fundamental para potencializar
o trabalho das organizações, que querem
contribuir com as políticas públicas,
mantendo sempre a legalidade e a lisura do processo",
argumenta Paulo Pedro Carvalho, coordenador da ONG
Caatinga e ponto focal da sociedade civil do Brasil
junto à Convenção das Nações
Unidas de Combate à Desertificação
(UNCCD).
"É preciso definir
uma nova forma de relação entre o
governo e as pessoas que operacionalizam as ações
de enfrentamento da desertificação.
A ideia é que esse novo marco legal mude
esse lógica e facilite o processo",
opina Francisco Campello, ponto focal do Brasil
na UNCCD.
O reconhecimento das práticas
adotadas pelas organizações da sociedade
civil pela UNCCD também foi amplamente questionado.
Os representantes das ONGs acreditam que à
UNCCD caberia um maior esforço para disseminação
das ações. "Sem dúvida,
quem tem maior atuação no campo prático
é a sociedade civil", afirma Carvalho.
Ele defende o conceito da agroecologia, aliado a
iniciativas de segurança alimentar e nutricional,
educação contextualizada, e acesso
à água e à terra, como uma
alternativa para a problemática da desertificação.
"As pessoas podem produzir, recuperando o que
está degradado. Propõe-se, nesse sentido,
a convivência com a realidade conforme ela
está colocada", defende.
A Articulação no
Semiárido (ASA), formada por mais de mil
organizações da sociedade civil que
atuam na gestão e no desenvolvimento de políticas
de convivência com a região semiárida,
tem a captação e a gestão democrática
da água como um de seus principais elementos
de luta.
"A água precisa ser
melhor administrada e cuidada. Para nós,
não se resolve o problema das secas com grandes
obras, mas com iniciativas simples, como é
o caso dos sistemas de captação de
chuvas ou de águas pluviais. A partir das
cisternas, você consegue a água tanto
para produzir quanto para consumo", afirma
Carvalho.
Nesse contexto, em 2003 a ASA
lançou o Programa de Formação
e Mobilização Social para a Convivência
com o Semiárido: um milhão de cisternas
rurais (P1MC). O P1MC desencadeou um movimento de
articulação e convivência sustentável
com o ecossistema do Semiárido, por meio
do fortalecimento da sociedade civil, da mobilização,
envolvimento e capacitação das famílias.
Segundo Carvalho, o objetivo do P1MC é beneficiar
cerca de 5 milhões de pessoas em toda a área
afetada.
O programa, que recebe o apoio
do Governo Federal, por meio dos Ministérios
do Desenvolvimento Social, do Meio Ambiente e da
Integração, atende nove estados do
Nordeste, além de Minas Gerais e Espírito
Santo. As próprias comunidades ajudam na
implantação das cisternas. "Já
construímos cerca de 350 mil cisternas, o
que representa um benefício a 2 milhões
de pessoas. Além disso, o programa é
executado de maneira descentralizada. A comunidade
ajuda no levantamento das famílias, na mobilização
e documentação, na construção
e na manutenção [das cisternas]",
revelou.
As famílias envolvidas
na construção também recebem
cursos de capacitação e de gerenciamento
dos recursos hídricos. Cada cisterna comporta
16 mil litros de água, que servem para beber
e cozinhar, quantidade suficiente para abastecer
uma família de cinco pessoas durante oito
meses, o período de estiagem no Semiárido.
A água é captada por calhas instaladas
no telhado das casas e o custo de cada cisterna
é de aproximadamente R$ 1,5 mil.
Segundo o ponto focal da sociedade
civil, apesar de vários países demonstrarem
interesse e já adotarem o projeto em suas
comunidades, a disseminação das práticas
ainda é um desafio a ser vencido.
A 9ª Sessão do Comitê
para Revisão da Implementação
da Convenção de Combate à Desertificação
(CRIC9) vai até esta sexta-feira, 25/2, em
Bonn, Alemanha.
Fonte: Cadija Tissiani / IICA