Ação urgente é
necessária para desacelerar as emissões
de carbono causadas pela destruição
e degradação dos ecossistemas marinhos,
que armazenam até 50 vezes mais
carbono do que florestas
Arlington, EUA, 24 de março
de 2011 — A destruição dos ecossistemas
costeiros como manguezais, brejos e terrenos alagadiços
à beira mar, que armazenam grande quantidade
de carbono, está liberando grandes quantidades
de dióxido de carbono (CO2) no oceano e na
atmosfera, de acordo com o Grupo de Trabalho Internacional
para Carbono Azul Costeiro.
O grupo, formado por 32 cientistas
de 11 países, revelou em reunião em
Paris que o conhecimento existente sobre estoques
de carbono e emissões causadas pela degradação
ou conversão de ecossistemas costeiros é
“suficiente para justificar ações
imediatas de melhoria do manejo desses ecossistemas”.
O Grupo de Trabalho foi criado
como um passo inicial no avanço das metas
científicas, políticas e de manejo
da Iniciativa Carbono Azul, cujos membros fundadores
incluem a Conservação Internacional
(CI), a União Mundial para a Conservação
da Natureza (IUCN, da sigla em inglês), e
a Comissão Intergovernamental Oceanográfica
(IOC) da UNESCO.
Apelidado de “carbono azul” por
sua habilidade de seqüestrar e armazenar grandes
quantidades de carbono, tanto nas plantas quanto
nas camadas mais profundas do solo, esses ecossistemas
marinhos podem conter até cinco vezes mais
carbono do que em florestas tropicais. Em algumas
áreas eles contêm até 50 vezes
mais carbono do que em algumas áreas de florestas.
“Há algum tempo já
sabemos da importância dos ecossistemas costeiros
para a pescaria e a proteção contra
tempestades e tsunamis. Agora estamos vendo que,
se destruídos ou degradados, esses ecossistemas
costeiros se tornam grandes emissores de CO2, e
essa emissão é feita de forma lenta,
por muitos anos. Em outras palavras, é como
uma hemorragia longa e lenta, difícil de
estancar. Então, precisamos urgentemente
interromper a perda desses ecossistemas ricos em
estoque de carbono para desacelerar as mudanças
climáticas”, afirma Emily Pidgeon, diretora
do Programa Marinho de Mudanças Climáticas
da Conservação Internacional.
A drenagem de terrenos alagadiços
à beira-mar, como manguezais e brejos, libera
um quarto de milhão de toneladas de CO2 por
quilômetro quadrado de solo perdido. Dados
globais mostram que brejos e manguezais estão
sendo degradados ao longo das regiões litorâneas
de todo o mundo a um ritmo acelerado. Entre 1980
e 2005, 35 mil quilômetros quadrados de manguezais
foram destruídos globalmente – uma área
do tamanho da Bélgica. Essa área ainda
continua a liberar até 0.175 giga-toneladas
de CO2 a cada ano – equivalente às emissões
anuais de países como a Holanda ou a Venezuela.
“Estudos científicos têm
demonstrado que, apesar de alguns manguezais, terrenos
alagadiços e brejos representarem menos de
1% da biomassa total das plantas em terra, neles
circulam quase a mesma quantidade de carbono que
nos 99% restantes. Dessa forma, o declínio
desses ecossistemas tão eficientes em estocar
carbono é uma causa válida de preocupação”,
alerta Wendy Watson-Wright, diretor da IOC.
No decorrer de 3 dias de reuniões
em Paris, cientistas apresentaram as prioridades
e recomendações para ações
imediatas, que incluem:
• Intensificação
nas pesquisas nacionais e internacionais, tais como
desenvolvimento de metodologias de inventário
e contabilidade para carbono costeiro; realização
de inventários de carbono; realização
de pesquisa e monitoração para quantificar
com mais precisão as emissões de gases
de efeito estufa causados pela perda de ecossistemas
costeiros; e o estabelecimento de rede de demonstrações
em campo para aumentar a capacitação
e colaboração de comunidades.
• Melhoria do manejo local e regional:
tais como identificar e reduzir as principais causas
da degradação de sistemas costeiros
ricos em carbono – entre elas o desenvolvimento
urbano, a agricultura, a aquicultura, a poluição,
a drenagem e a introdução de construções
artificiais –, o reforço das políticas
de proteção de sistemas costeiros
ricos em carbono e a restauração de
sistemas perdidos/degradados.
• Maior reconhecimento internacional
dos ecossistemas costeiros ricos em carbono: por
meio de entidades internacionais estabelecidas tais
como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas das Nações Unidas
(IPCC) e a Convenção-Quadro das Nações
Unidas Sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
Os cientistas enfatizaram que
a melhoria no manejo de ecossistemas costeiros não
visa a se tornar um bloqueio para o desenvolvimento
dos países, e sim uma estratégia para
priorizar a conservação de zonas costeiras
específicas, únicas, de alto potencial
para estocar CO2. Eles recomendam que os tomadores
de decisão reconheçam mais os serviços
vitais que essas áreas oferecem à
humanidade e priorizem sua proteção.
“A capacidade das zonas costeiras
de reduzir a mudança climática ao
capturar e armazenar CO2 é considerável,
mas tem sido ignorada”, declara Jerker Tamelander,
gerente de Oceanos e de Mudança Climática
da IUCN. “Se valorizados e geridos adequadamente,
os ecossistemas costeiros podem ajudar muitos países
a cumprir com suas metas de mitigação
ao mesmo tempo em que ajudam com a adaptação
em áreas costeiras vulneráveis.”
O grupo de trabalho se reunirá
novamente em agosto e continuará seu estudo
científico colaborativo. A Fundação
Waterloo, a NASA e o Programa Ambiental das Nações
Unidas (Pnuma) financiaram os trabalhos do grupo.
+ Mais
Resultados do estudo TEEB foram
divulgados hoje em Brasília
Lançamento no país,
com a presença do líder do estudo,
Pavan Sukhdev, foi patrocinado pela Conservação
Internacional, MMA, PNUMA e IPEA
Brasília, 23 de março
de 2011 — O economista e líder do estudo
“A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade”
(TEEB, na sigla em inglês), Pavan Sukhdev,
deu uma palestra hoje no auditório do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apresentando
os resultados finais do relatório.
O TEEB é uma iniciativa
internacional para chamar a atenção
da comunidade global para os benefícios econômicos
da biodiversidade, ressaltando os custos de sua
perda e sugerindo políticas públicas
para reverter esse quadro. Formado por uma rede
que inclui pesquisadores, institutos multilaterais
e ONGs, o TEEB utiliza uma nova abordagem que leva
em conta o capital natural dos recursos naturais
e estabelece sistemas de valoração
econômica para os serviços ecossistêmicos.
Além do preço de mercado, o TEEB também
leva em conta os benefícios sociais que a
preservação dos recursos naturais
e dos ecossistemas trazem à população.
Segundo o estudo, os grandes beneficiários
com a manutenção dos serviços
ecossistêmicos são as populações
de baixa renda. “O PIB ambiental representa em média
de 15% a 20% dos PIBs nacionais, mas essa proporção
aumenta muito quando se trata de populações
de baixa renda, podendo chegar a 50% a 90% do PIB
nessas faixas”, afirmou Sukhdev. Segundo ele, 70%
das populações mais pobres dependem
dos ecossistemas para sua sobrevivência. Isso
não significa que toda essa população
viva em florestas ou hábitats naturais. “Mas
muitas comunidades vivem em zonas rurais que acessam
diariamente recursos naturais como estratégia
de sobrevivência”, afirmou Sukhdev.
Em novembro de 2010, durante a
última reunião da Convenção
da Biodiversidade, que aconteceu em Nagoia, no Japão,
o relatório final do TEEB foi divulgado pela
primeira vez, mostrando que existe uma perda anual
de US$ 2 trilhões a US$ 4,5 trilhões
no capital natural do mundo, resultante do desmatamento
e da degradação do solo. Segundo o
relatório do TEEB, o manejo efetivo dos ecossistemas
e da biodiversidade e a inclusão do capital
natural na contabilidade governamental e empresarial
podem começar a corrigir e reduzir os custos
de perdas futuras.
Durante a palestra Sukhdev destacou
também que o desenvolvimento sustentável
e a economia verde são conceitos que se complementam.
“O desenvolvimento sustentável tem por base
gerar um desenvolvimento que possibilite a sobrevivência
das gerações futuras, e portanto a
economia verde é um meio de se obter esse
objetivo”.
Segundo Camila Gramkow, coordenadora
de Economia e Sustentabilidade da Conservação
Internacional, o estudo é especialmente importante
para o Brasil, que detém boa parte da biodiversidade
do mundo, e pode se beneficiar do conhecimento e
das metodologias disponibilizados pelo TEEB para
transformar sua relação com a biodiversidade.
"Por tratar a questão da pobreza e a
dependência dos menos favorecidos em relação
à biodiversidade, os resultados do TEEB podem
permitir que o Brasil adote mecanismos que ajudem
a reduzir a pobreza no Brasil com base na melhoria
e manutenção dos serviços ambientais
prestados a essas populações de baixa
renda", concluiu Camila.
Sukhdev também citou alguns
exemplos bem-sucedidos de políticas públicas
adotadas por outros países que se encaixam
no perfil da economia verde, como aconteceu na Costa
Rica. Lá o governo pagou US$ 300 milhões
a produtores rurais para não desmatarem suas
matas. "Vocês podem argumentar que esse
dinheiro acabou sendo pago para fazendeiros ricos,
mas as comunidades do entorno também se beneficiaram
com a melhoria dos serviços ambientais da
região. Mas o mais surpreendente do caso
foi que os maiores beneficiários foram as
indústrias de energia, já que a medida
possibilitou um aumento de volume dos recursos hídricos
da região usados para gerar energia hidrelétrica",
concluiu.