31 Março 2011
Belo Monte, um empreendimento hidrelétrico
que consumirá mais de R$ 20 bilhões
para sua construção, poderá
no mais drástico dos cenários de alterações
climáticas perder mais de 80% de sua receita
anual até 2050, como resultado de uma diminuição
da vazão do Rio Xingu.
Isso é o que apontam dados
preliminares de um estudo em desenvolvimento pelo
WWF-Brasil no âmbito da parceria HSBC Climate
Partnership por consultores especializados em hidrologia
e mudanças climáticas. O estudo analisa
a vulnerabilidade climática da produção
de hidroeletricidade na região Norte do país
com enfoque em alguns grandes empreendimentos como
a usina hidrelétrica de Belo Monte.
"As prováveis mudanças
na vazão do rio Xingu, provocadas pelas alterações
climáticas, colocarão em risco a viabilidade
da usina de Belo Monte", afirmou Carlos Rittl,
coordenador do Programa de Mudanças Climáticas
e Energia do WWF-Brasil. "Belo Monte pode gerar
muito menos energia do que o previsto e muito menos
receitas do que o esperado, tornando-se um fracasso
financeiro", acrescentou. "Os altos custos
sociais e ambientais, aliados aos riscos financeiros,
deveriam levar o Governo Brasileiro a uma ampla
reflexão sobre a viabilidade da obra",
concluiu Rittl.
O estudo, a ser lançado
ainda este ano, considerou 4 cenários de
emissões futuras estabelecidos pelo IPCC
- A1, A2, B1 e B2 - cada qual descrevendo um futuro
possível para a humanidade e a curva de emissões
globais resultantes. A aplicação de
modelos climáticos dentre os mais robustos
existentes, como o HadCM3 do Hadley Centre (Reino
Unido) ou o ECHam4 do Max-Planck-Institute für
Meteorologie (Alemanha), aos quatro cenários
permite identificar a possibilidade de uma diminuição
significativa na vazão da bacia do rio Xingu
até 2050.
Apesar de certa variabilidade
nos resultados - alguns poucos mostram ganhos de
receita que chegam a 4% até 2050, enquanto
outros mostram uma queda bruta na receita chegando
a quase 90% -, uma forte tendência é
evidente: as perdas podem variar entre 4 e 10% da
receita anual da usina até 2050.
De acordo com Carlos Alberto de
Mattos Scaramuzza, superintendente de Conservação
do WWF-Brasil, as variações climáticas
futuras não estão sendo incorporadas
da forma devida no planejamento energético
e na análise de viabilidade de projetos hidrelétricos
na Amazônia Brasileira. "Tivemos duas
secas muito severas na Amazônia em menos de
10 anos, em 2005 e 2010. Temos de tirar lições
destes eventos climáticos extremos e, de
uma vez por todas, inserir a variável climática
no planejamento da expansão da produção
de energia no país. Com isso, ficaria ainda
mais clara a atratividade da eficiência energética
e de outras energias renováveis não-convencionais,
como a energia eólica, a solar e a de biomassa.
Havendo investimentos, estas alternativas podem
gerar energia suficiente para atender as necessidades
de crescimento econômico do Brasil, minimizando
os riscos climáticos dos empreendimentos
hidrelétricos", concluiu Scaramuzza.
"O governo tende a
considerar os projetos hidrelétricos um a
um, o que é ineficiente sob aspectos econômicos,
sociais e ambientais", afirmou Denise Hamú,
Secretária-Geral do WWF-Brasil. "Para
viabilizar a Usina de Belo Monte, os riscos da obra
foram socializadas para atrair investidores. Os
dados preliminares deste estudo indicam que os riscos
financeiros podem ser ainda maiores do que aqueles
originalmente previstos e isto torna evidente a
necessidade de um olhar macro sobre o potencial,
as vantagens e os riscos sociais e ambientais associados
à expansão da produção
de energia", conclui Hamú.
O WWF-Brasil considera fundamental
que a expansão da produção
de energia hidrelétrica seja feita a partir
de um olhar sobre toda a bacia Amazônica.
É necessária uma análise integrada
de cada bacia hidrográfica, considerando-se
os riscos sociais e ambientais em toda a extensão
dos rios - que são sistemas naturais contínuos
- e não apenas das áreas de entorno
dos projetos hidrelétricos.
Nota sobre os cenários
climáticos do IPCC
O cenário A1 descreve um
mundo de rápido crescimento econômico
com uma população que atinge seu pico
na metade do século e a introdução
de tecnologias novas e mais eficientes. Nele, existe
uma convergência substancial entre regiões
evidenciada por uma crescente interação
social e cultural, redução das diferenças
regionais e das rendas per capita.
O cenário A2 descreve um
mundo muito heterogêneo onde a renda per capita
e o desenvolvimento tecnológico convergem
de maneira mais fragmentada e lenta. Com identidades
regionais mais fortes, as taxas de fecundidade diminuem
mais lentamente, o que resulta em crescimento contínuo
da população.
O cenário B1 descreve um
mundo mais integrado e ambientalmente correto. O
crescimento econômico é tão
forte quanto no cenário A1, mas caracterizado
por uma transição mais profunda em
direção a uma economia baseada em
serviços e informação. O foco
para a estabilidade econômica, social e ambiental
é global.
O cenário B2 descreve um
mundo mais heterogêneo, porém mais
sustentável. É um cenário intermediário
com crescimento contínuo da população,
crescimento econômico médio, mudanças
tecnológicas menos rápidas e mais
fragmentadas e foco em soluções locais
para a estabilidade econômica, social e ambiental.
+ Mais
Trajetória de Nogueira-Neto
lançada na capital federal
31 Março 2011
Lançado de início em novembro passado,
em São Paulo, o livro “Uma Trajetória
Ambientalista: Diário de Paulo Nogueira-Neto”
foi apresentado nessa quarta (30) aos brasilienses,
em evento no restaurante Dom Francisco, no shopping
Pátio Brasil.
A obra reúne os fatos e
feitos mais significativos dos 45 anos de trajetória
do patrono do ambientalismo brasileiro, Presidente
Emérito do Conselho Diretor do WWF-Brasil
há cinco anos, e conselheiro da mesma instituição
há mais de 14 anos. Em forma de diário,
a publicação traz anotações
registradas ao longo de décadas, revelando
acontecimentos e identificando personagens decisivos
para o progresso social e econômico em equilíbrio
com a conservação da natureza, um
desafio ainda presente.
Na opinião da secretária-geral
do WWF-Brasil, Denise Hamú, o livro é
pura homenagem e reconhecimento a Paulo Nogueira
Neto, por seu trabalho histórico e destaque
como personalidade com visão abrangente da
conservação ambiental. “Seja à
frente de órgãos governamentais, na
sala de aula ou palestrando, ele sempre honrou seu
compromisso inabalável com a natureza brasileira
e com suas populações, avançado
na construção e implantação
de políticas ambientais. Seu trabalho é
um exemplo para todos nós,” afirmou.
Nascido em abril de 1922, em São
Paulo, Paulo Nogueira Neto faz da sua vida um histórico
de lutas, pela sociedade e pela preservação
ambiental. Ainda estudante, atuou contra a Ditadura,
e, durante a 2ª Guerra Mundial, prestou o serviço
militar como soldado voluntário de cavalaria.
Após tornar-se bacharel em Ciências
Jurídicas e Sociais, concluiu curso de História
Natural na Universidade de São Paulo (USP),
em 1959. A partir de então, ganhava força
uma trajetória ímpar no ambientalismo
nacional, focada em pesquisas, no ensino e na militância
pela restauração e conservação
de áreas naturais.
Nogueira Neto foi um dos fundadores
do Departamento de Ecologia Geral, no Instituto
de Biocências da USP e presidente de uma entidade
conservacionista hoje conhecida como Associação
de Defesa do Meio Ambiente de São Paulo.
Também foi responsável pela organização
e direção da Secretaria Especial de
Meio Ambiente, do Ministério do Interior
e depois no Ministério do Meio Ambiente e
Habitação, entre os anos de 1973 e
1985. Foi a semente do que hoje é o Ministério
do Meio Ambiente.
À frente daquele órgão
federal, criou e estabeleceu 3,2 milhões
de hectares de áreas protegidas, em 26 estações
e reservas ecológicas, bem como mobilizou
e assessorou parlamentares para a aprovação
de grande parte no arcabouço legislativo
ambiental brasileiro. Em seguida, atuou por dois
anos como secretário de Meio Ambiente do
Distrito Federal, onde ajudou a implantar a Área
de Proteção Ambiental de Cafuringa.
Entre 1983 e 1986, atuou junto
à comissão Brundtland das Nações
Unidas sobre o Meio ambiente e Desenvolvimento,
grupo onde pela primeira vez se usou a expressão
"desenvolvimento sustentável".
Membro da Academia Paulista de Letras, publicou
vário livros, sobre abelhas indígenas,
criação de animais nativos vertebrados,
comportamento animal e viagens. É professor
titular (aposentado) de Ecologia Geral do Instituto
de Biociências da USP, membro do Conselho
Nacional do Meio Ambiente (Conama), membro do Board
do World Resources Institute, entre tantos outros.
“Construir o presente enxergando
o futuro tem sido a tônica dominante da vida
de Paulo Nogueira Neto, nas mais diferentes esferas.
Foi assim nas salas de aula, forjando novos ambientalistas,
nos gabinetes, na formulação de políticas
públicas, criando áreas protegidas
e instituições, como o WWF-Brasil.
Quê mais dizer a não ser um viva a
Paulo Nogueira e seu legado”, ressaltou Carlos Alberto
de Mattos Scaramuzza, superintendente de Programas
de Conservação Temáticos do
WWF-Brasil.