26/04/2011 - A Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia
Brasileira de Ciência (ABC) finalmente lançaram,
ontem, em Brasília, o livro "O Código
Florestal e a Ciência – Contribuições
para o diálogo", com 124 páginas,
que sintetiza o resultado de mais de 300 trabalhos
científicos. Segundo os pesquisadores presentes
à entrevista coletiva, se o substitutivo
do deputado Aldo Rebelo (PCdo B) ao PL 1.876 vier
a ser aprovado, será a primeira vez que o
país terá uma legislação
florestal totalmente desconectada do conhecimento
científico, ou seja, que vai no sentido contrário
ao que a ciência diz ser o mais adequado.
Tanto em 1934, quando foi aprovado
o primeiro Código Florestal, quanto em 1965,
quando ele foi modificado, os melhores cientistas
da época foram chamados a colaborar na elaboração
da legislação. Para saber mais sobre
a história do Código Florestal, clique
aqui.
O livro, divulgado ontem, é
resultado da participação de mais
de uma dezena de instituições científicas
e universidades, em uma soma de conhecimentos interdisciplinares.
"Se o deputado Aldo Rebelo pinçasse
um brilhante pesquisador para participar das discussões,
seria a contribuição de uma visão
fracionada. No nosso trabalho, aplicamos o método
científico. Reunimos idéias, literatura,
conhecimento... Peneiramos as idéias em conjunto,
em confronto, em somatória... Tudo foi questionado
e criticado, refeito e ampliado. É assim
que se faz ciência, vamos peneirando, peneirando,
para vermos o que fica de pepita", disse Antonio
Nobre, do INPE.
Entre as muitas conclusões
do estudo, está o diagnóstico de que
existe um passivo de 83 milhões de hectares
de áreas de preservação ocupadas
irregularmente e que o impacto da erosão
ocasionado pelo uso agrícola das terras no
Brasil é de R$ 9,3 bilhões anuais.
Nobre destacou o fato de que Brasil
tem terra de sobra para a agricultura. "Quando
se afirma que não há terra suficiente,
a afirmação não encontra base
alguma na literatura científica.” Nesse sentido,
o estudo divulgado ontem revela que o país
pode resgatar passivos sem prejudicar a produção
e oferta de alimentos, fibras e energia, mantendo
a tendência de aumento continuado de produtividade
das últimas décadas.
Diante da pergunta de uma repórter
que queria saber o que poderá acontecer se
o texto de Rebelo for aprovado nos dias 3 e 4 de
maio, como foi anunciado, a presidente da SBPC,
Helena Nader foi enfática: "Uma tragédia
para a sociedade brasileira, para a ciência,
para a agricultura, para todos."
Para Helena, são muitos
os riscos que se escondem sob as propostas do substitutivo,
em especial no que diz respeito às áreas
de preservação permanente. Em relação
a essas áreas, o estudo divulgado ontem revela
haver consenso entre os pesquisadores de que as
áreas marginais a corpos d’agua – sejam várzeas
ou florestas ripárias – e os topos de morro
ocupados por campos de altitude ou rupestres são
áreas insubstituíveis em razão
da biodiversidade e de seu alto grau de especialização
e endemismo além dos serviços ecossistêmicos
essenciais que desempenham.
"Um ganho marginal para os
proprietários de terra na redução
da vegetação nessas áreas pode
resultar num gigantesco ônus para a sociedade
como um todo, especialmente para a população
urbana que mora naquela bacia ou região",
afirma o estudo, fazendo referência à
possibilidade de diminuição na proteção
às matas ciliares e aos topos de morro propostos
pelo substitutivo Aldo Rebelo.
No caso das reservas legais (RL)
os pesquisadores afirmam que sua redução
aumentaria significativamente o risco de extinção
de espécies e comprometeria essas áreas
como ecossistemas funcionais, ou seja, como fornecedores
de serviços ecossistêmicos e ambientais.
Como exemplo desses serviços, o estudo aponta
os polinizadores, altamente dependentes da conservação
da vegetação nativa, onde encontram
abrigo e alimento. "O maracujá, por
exemplo, depende em 100% da polinização
pela mamangava, que não vive só onde
há maracujá, mas se abriga nas matas",
disse Nobre.
Para Aleixo da Silva, diretor
da SBPC e coordenador do grupo de trabalho, existe
um ponto de equilíbrio na amplitude dos debates
sobre o Código Florestal. "E a ciência
pode ajudar a encontrar esse ponto de equilíbrio."
Na Câmara
Depois da coletiva, os pesquisadores
foram à Câmara dos Deputados onde defenderam
o adiamento da votação do projeto
do Código Florestal (PL 1.876), com o argumento
de que, com mais tempo para as discussões,
será possível produzir uma legislação
mais moderna, da qual o País se orgulhe.
Helena Nader, entregou ao presidente
da Câmara, Marco Maia (PT-RS), o livro de
130 páginas, que engloba o resultado de mais
de 300 trabalhos científicos. Helena afirmou
que a proposta apresentada pela ciência "é
a favor da agricultura e da biodiversidade conciliadas".
O documento também será entregue aos
ministros da Casa Civil, da Agricultura, do Meio
Ambiente, da Ciência e Tecnologia, da Educação
e da Integração Nacional.
A SBPC e a ABC também pediram
a Marco Maia que neste momento seja pensado apenas
na solução para o decreto 6514/08,
que prevê, a partir de 11 de junho, aplicação
de multas para quem não se dispuser a recuperar,
dentro de 180 dias após notificado, sua reserva
legal ou APP desmatada. O prazo para início
de vigência desse dispositivo já foi
adiado duas vezes, por pressão do setor agropecuário,
que tenta agora, com o substitutivo a ser votado,
mudar a lei para que a recuperação
dessas áreas não seja mais obrigatória.Os
pesquisadores sugerem uma prorrogação
não apenas neste caso, como também
na votação do substitutivo ao PL 1.876.
"Entendemos que um prazo de dois anos para
a ampliação dos debates seja suficiente",
afirmou Antonio Nobre.
Líderes partidários
e ministros discutem
Segundo o portal de notícias
da Câmara, líderes partidários
se reúnem nesta terça-feira com os
ministros da Agricultura, Wagner Rossi; do Desenvolvimento
Agrário, Afonso Florence; e do Meio Ambiente,
Izabella Teixeira, para discutir o projeto de reforma
do Código Florestal. A reunião está
marcada para as 15 horas, no gabinete da Presidência
da Câmara.
O texto que aguarda inclusão
na pauta do Plenário é o substitutivo
do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) que foi aprovado
no ano passado por uma comissão especial
da Câmara. Atualmente, um grupo de trabalho
analisa sugestões de mudanças ao texto.
Ainda há divergências, no entanto,
entre deputados das bancadas ruralista e ambientalista.
O presidente Marco Maia, já afirmou que o
governo precisa ter uma posição única
em torno do Código Florestal, para facilitar
o processo de votação.
+ Mais
Câmara Conciliatória
avança pouco na busca de acordo para votação
do Código Florestal
13/04/2011 - Uma aparente boa
vontade dos 14 deputados membros e outros 6 não
membros da Câmara Conciliatória que
busca viabilizar consenso para a votação
do Código Florestal (PL 1.876) foi insuficiente
para fazer avançar a discussão dos
pontos mais polêmicos nas reuniões
de terça e quarta-feira, dias 12 e 13 de
abril.
No encontro de terça-feira,
os deputados definiram os sete pontos para discussão:
1: delimitação das áreas de
preservação permanente (APPs); 2:
definição das reservas legais; 3:
regularização ambiental de ocupações;
4: proibição de corte raso durante
um período, a chamada “moratória do
desmatamento”; 5: regras específicas para
a agricultura familiar; 6: competências dos
órgãos públicos ambientais
e, 7: instrumentos econômicos para a conservação
da vegetação.
Apenas o primeiro dos sete pontos
foi debatido na terça-feira. Por volta de
18h30 , o coordenador encerrou a reunião
e convocou reunião ordinária para
prosseguir com os debates na quarta-feira. Ocorre
que os debates da quarta no plenário principal
esvaziaram a reunião da câmara de conciliação.
Nem o coordenador Eduardo Gomes (PSDB-TO) compareceu,
preparando-se para uma viagem internacional, segundo
seu substituto Mendes Thame (PSDB-SP).
Os deputados que analisaram as
notas técnicas divergiram sobre os prazos
necessários para que o grupo de trabalho
delibere sobre as sugestões enviadas. Paulo
Piau (PMDB-MG) pediu urgência na votação.
“Essa discussão não pode ser protelada,
devemos partir para uma decisão logo, porque
o Brasil não tem mais como esperar”, disse.
Ivan Valente (PSOL-SP), contudo,
acredita que são necessários mais
debates sobre o tema. “Uma discussão ligeira
não interessa ao povo brasileiro e à
preservação do meio ambiente. Esse
grupo deve ter tempo para aprofundar o debate e
chegar a um consenso”, argumentou. Eduardo Gomes,
no entanto, disse acreditar que o texto final do
código será votado pela Câmara
ainda em abril. A afirmação foi feita
na terça-feira, depois de encerrada a reunião.
Reunião
O deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP),
relator do texto que modifica o Código, participou,
também nesta quarta-feira, de reunião
com o presidente em exercício, Michel Temer
(PMDB-SP), e líderes das bancadas ruralista
e ambientalista. Rebelo prevê que as propostas
serão votadas em até duas semanas.
Ele disse que pretende deixar claro no texto que
novos desmatamentos não serão permitidos
e que quem não respeitou a legislação
anterior e desmatou vai ter que recompor as áreas.
Rebelo disse desconhecer a existência de algum
texto do governo sobre o novo código. O que
pode acontecer, segundo o deputado, serão
alterações no próprio relatório
feito por ele.
O deputado José Sarney
Filho (PV-MA) também participou da reunião
com Temer e disse não acreditar que a votação
do texto possa ocorrer ainda este mês. Para
o deputado Moreira Mendes (PPS-RO), no entanto,
o consenso está perto e os pontos em que
não será possível se chegar
a um acordo têm que ser definidos no plenário.
A respeito da anistia aos desmatadores, previsto
no texto de Aldo Rebelo, Mendes sugere que seja
dado benefício econômico a quem não
desmatou. Como exemplo ele cita a redução
de juros em financiamentos ou isenção
do Imposto Territorial Rural (ITR). (Com informações
da assessoria de comunicação da Câmara.)