18/05/2011
Carine Corrêa
Quando o assunto é biodiversidade, costuma-se
pensar apenas em medidas de proteção
e conservação das diferentes espécies
biológicas existentes
não só no Brasil como também
no mundo. A criação de Unidades de
Conservação (UCs) - áreas especialmente
criadas pelo poder público com o intuito
de, entre outras finalidades, proteger recursos
naturais considerados relevantes - é uma
das formas mais efetivas de se garantir a manutenção
e o uso sustentável de ativos ambientais.
Estes espaços protegidos
desempenham papel crucial na proteção
de recursos estratégicos para o desenvolvimento
do País e contribuem para o enfrentamento
do aquecimento global. A novidade apresentada pelo
estudo Contribuição das Unidades de
Conservação Brasileiras para a Economia
Nacional, lançado nesta quarta-feira (18/5)
em Brasília, durante as comemorações
do Dia Internacional da Biodiversidade, é
que além de serviços ecossistêmicos,
como garantia de água para a população
e para diversas atividades produtivas, as unidades
de conservação podem gerar benefícios
lucrativos e atividades produtivas para populações
tradicionais.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella
Teixeira, afirma que a discussão da biodiversidade
não está restrita à proteção
de plantas e animais, e que o papel das UCs ainda
não foi muito explorado no cenário
econômico nacional.
"É importante lembrar
que criar áreas protegidas não é
ir contra o desenvolvimento. Temos que mostrar à
toda sociedade brasileira como o tema está
presente na vida cotidiana do cidadão, como
por exemplo, os produtos florestais, o uso público
destes espaços, o estoque de carbono, o turismo,
a garantia de água e a repartição
de receitas tributárias. Somos o G1 da biodiversidade
no planeta, e temos um pré-sal de petróleo
e outro de biodiversidade. A sociedade brasileira
tem que entender o que significa a conservação
da biodiversidade no seu dia a dia", afirma
Izabella Teixeira.
Benefícios
Para se ter uma ideia, no que
se refere a atividades econômicas dentro ou
no entorno destas áreas protegidas, a publicação
demonstra que a soma das estimativas de visitação
pública nas unidades de conservação
federais e estaduais pode alcançar um público
de cerca de 20 milhões de pessoas em 2016
(caso o potencial destas UCs seja devidamente explorado),
o que pode acarretar uma renda de R$ 2,2 bilhões
no mesmo ano.
A previsão de visitação
em 67 parques nacionais já existentes no
País pode gerar entre R$ 1,6 e 1,8 bilhão
por ano, considerando-se as estimativas de fluxo
de turistas no Brasil até 2016.
A produção de borracha
em 11 reservas extrativistas (resex) do bioma amazônico
avaliadas já chega a R$ 16,5 milhões
anuais. Já a produção de castanha
do Pará em apenas 17 resex analisadas na
Amazônia tem potencial para chegar à
cifra de R$ 39,2 milhões por ano.
Em relação aos efeitos
das mudanças climáticas, a criação
e manutenção das unidades de conservação
no Brasil impediu a emissão de pelo menos
2,8 bilhões de toneladas de carbono, o que
pode ser convertido em um valor monetário
de aproximadamente R$ 96 bilhões.
Além disso, 9% da água
captada para consumo humano são provenientes
de UCs, e 80% da hidroeletricidade brasileira vêm
de fontes geradoras que têm pelo menos um
rio tributário a jusante (sentido em que
fluem as águas de uma corrente fluvial) das
UCs. Do fluxo captado para irrigação
e agricultura, pelo menos 4% são provenientes
de fontes localizadas dentro ou abaixo das UCs.
Serviços Ambientais
De acordo com o secretário
de Biodiversidade e Florestas do MMA, Bráulio
Dias, as unidades de conservação são
territórios importantes para promover a conservação
e a provisão de serviços ambientais
que contribuem para o crescimento e manutenção
de diferentes cadeias econômicas.
Ele explica que muitas áreas
protegidas do mundo foram criadas com o objetivo
de assegurar as condições para que,
por exemplo, os mananciais hídricos atendam
aos principais usos humanos, como abastecimento
público, agricultura e geração
de energia.
"Reduzir a perda da biodiversidade
não se consegue apenas com ações
de comando e controle, como fiscalização
e apreensão. Temos que investir na construção
de modelos alternativos de exploração
sustentável. Se não conseguirmos fundamentar
a ideia da floresta em pé como ativo econômico
de valor, não conseguiremos proteger nossa
biodiversidade", afirma o secretário.
Dias ressalta também que
um dos objetivos do MMA é criar novas possibilidades
para as comunidades que vivem dentro das unidades
de conservação. "Nosso compromisso
é ter uma nova estratégia para a biodiversidade
consolidada e aprovada para a Rio+20, com o planejamento
para esta década. Nosso maior desafio é
promover uma estratégia de desenvolvimento
sustentável do Brasil".
O estudo foi desenvolvido pelo
Centro de Monitoramento de Conservação
Mundial do Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente e pelo MMA, sob coordenação
das universidades fluminenses UFRJ e UFRRJ, e com
o apoio técnico do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) e Cooperação
Técnica Alemã(GIZ).
Recursos hídricos
Dos 1.164 empreendimentos de geração
de energia hidrelétrica outorgados ou em
construção computados em 2010, 447
(38,4%) estão localizados abaixo de unidades
de conservação federais.
Cerca de 34,7% do volume anual constante de captação
de água são provenientes de fontes
localizadas dentro ou no entorno de unidades de
conservação federais.
O estudo revela ainda que a manutenção
de 65% da vegetação natural de uma
bacia garante 50% do volume médio do rio,
e que bacias hidrográficas florestadas tendem
a oferecer água de melhor qualidade do que
as submetidas a outros usos, como agricultura, indústria
e assentamentos.
Na maioria dos casos, a presença
de florestas pode reduzir substancialmente a necessidade
de tratamento para água potável, e
assim reduzir os custos associados ao abastecimento
de água. Cerca de um terço das maiores
cidades do mundo obtêm uma proporção
significativa de uso da água potável
diretamente de áreas florestadas.
Nas bacias hidrográficas
e mananciais com maior cobertura florestal, o custo
associado ao tratamento da água destinado
ao abastecimento público é menor que
o custo de tratamento em mananciais com baixa cobertura
florestal. Por isso é importante a função
das áreas de preservação permanente
(APPs), que envolvem nascentes, veredas, encosta,
topos de morro e matas ciliares.
Receitas Tributárias
Se por um lado a presença das UCs impede
a realização de certas atividades
econômicas, por outro pode estimular outras
capazes de gerar impacto positivo nas economias
locais de municípios afastados dos grandes
centros.
No Brasil, 14 estados aprovaram
legislação específica para
a aplicação do ICMS Ecológico
em seus territórios. Os critérios
para os repasses aos municípios e seus respectivos
cálculos podem variar em cada caso, e a presença
de uma unidade de conservação é
um critério adotado na definição
destes valores. Quanto maior a extensão e
o número de áreas protegidas no município,
maior é o montante repassado de ICMS ecológico
ao município. A receita suplementar repassada
aumenta o orçamento municipal, provocando
efeitos secundários sobre o desenvolvimento
local, como turismo e visitação.
Em 2009, o mecanismo ICMS ecológico
garantiu a transferência anual de mais de
R$ 400 milhões para as administrações
municipais como compensação pela presença
destas áreas protegidas em seus territórios.
+ Mais
Encontro inédito em defesa
da legislação ambiental
23/05/2011
Paulenir Constâncio
Um encontro inédito em defesa da legislação
ambiental reuniu, nesta segunda-feira (23/05), oito
ex-ministros do Meio Ambiente, integrantes de vários
partidos políticos, e a ministra Izabella
Teixeira em Brasília. Foram 30 minutos de
conversa franca sobre o futuro do código
florestal. Amanhã deverão ser recebidos
pela presidenta Dilma Rousseff, que tem reiterado
seu posicionamento de campanha em favor do desenvolvimento
com sustentabilidade.
O grupo, capitaneado por Paulo
Nogueira Neto, que ocupou a pasta nas décadas
de 1970 e 1980, quando ainda era Secretaria Especial,
saiu satisfeito com o que ouviu de Izabella. "Estamos
lidando com um assunto extremamente importante para
o futuro do Brasil e até da humanidade",
lembrou. Ele defendeu a manutenção
dos avanços e disse que é preciso
evitar que as alterações na lei tragam
consequências que impliquem no retrocesso
do que já foi conquistado ao longo dos últimos
40 anos.
Para Izabella Teixeira, o Governo
vai "agir com firmeza" na defesa do Código
Florestal. A negociação no Congresso,
segundo disse, precisará garantir que não
haverá anistia para desmatadores ou redução
das áreas de preservação ambiental
(APPs) ao longo dos rios e desfiguração
das reservas legais. A ministra voltou a afirmar
que a agricultura familiar e as peculiaridades regionais
devem ser consideradas no novo texto.
"É clara a posição
da presidenta Dilma. Ela não aceita anistia
a desmatador. Ela não aceita desmatamento
em áreas de preservação permanente.
Tem que recuperar reserva legal e tem que ter manejo.
Tem que entender a situação da agricultura
familiar diferenciada, que no Sul e no Sudeste é
diferente da Amazônia". Izabella salientou
que o Governo manterá o prazo de 11 de junho,
previsto no decreto que cria o Programa Mais Ambiente.
"Entrarei no dia seguindo com o processo de
regularização ambiental em campo",
afirmou.
Segundo ela, a lei tem que assegurar
a regularização ambiental para que
o agricultor se sinta seguro. "A lei tem que
ser objetiva. Temos que assegurar a proteção
do meio ambiente", afirmou. Para ela, se isso
não for garantido, o agricultor será
o prejudicado, com sua terra comprometida por situações
não sustentáveis que comprometam a
oferta de água e os demais requisitos para
a produção sustentável.
Ao final do encontro, o ex-ministro
Carlos Minc classificou a conversa de "muito
boa, muito animadora". Ele considerou que há,
no mérito das questões, "muita
identidade" entre o governo e as reivindicações
do grupo. "Resolvemos ir para cima, com muita
energia", salientou. Já a ex-ministra
Marina Silva defendeu o adiamento da votação
"em prol de uma política florestal".
Sobre o texto que está
no Congresso, Izabella declarou que as negociações
prosseguem, pois o texto requer ajustes. Para ela,
isso pode ser negociado com o relator ou apresentado
em plenário, o que será decidido com
os parlamentares. A ministra não vê
necessidade de adiamento nas votações
e disse que ainda não viu o texto final.
"Pode ter erros de redação ou
situações que nós precisamos
corrigir. Teremos que analisar", concluiu.