06 Julho 2011 - A reforma do Código
Florestal deve apontar para o grande mercado que
representa a exploração sustentável
da biodiversidade do país. Esta é
a avaliação do secretário de
políticas e programas de pesquisa e desenvolvimento
do Ministério de Ciência e Tecnologia,
o climatologista Carlos Nobre.
De acordo com o pesquisador, o grande desafio mundial
da agricultura é produzir de maneira sustentável.
“No Brasil não é
diferente. Nossa trajetória tem de ser em
direção à sustentabilidade.
O Código Florestal tem que olhar para o futuro,
para a exploração econômica
racional de nossa inigualável biodiversidade”,
disse o pesquisador, que participou nesta quarta-feira
(6) de audiência na Comissão de Ciência
e Tecnologia do Senado Federal que discutiu a reforma
do Código Florestal.
Nobre citou o exemplo do açaí,
indústria que, segundo ele, já movimenta
5 bilhões de reais ao ano e é exportada
para vários países. “Este é
apenas um produto, entre centenas ou milhares capazes
de serem explorados e proporcionarem ao Brasil uma
posição de liderança na economia
do século 21”, disse. O mercado do açaí,
de acordo com o pesquisador, deve ultrapassar em
breve o de exportação de madeira da
Amazônia. De acordo com dados da Embrapa,
o mercado externo de açaí cresce 30%
ao ano.
Claudio Maretti, líder
da Iniciativa Amazônia Viva, lembra que o
Brasil se comprometeu, no ano passado, durante a
conferência internacional em Nagoya, no Japão,
a cumprir as metas de conservação
de biodiversidade estabelecidas pela Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações
Unidas para 2020.
“O WWF-Brasil defende uma meta
mais ambiciosa, de acabar com a perda de biodiversidade
até o fim da década, pela importância
que a biodiversidade tem para a qualidade de vida
da humanidade, como tem sido provado em vários
estudos científicos”, destacou.
Preservar Vidas
Carlos Nobre também disse que o Código
Florestal precisa incorporar a necessidade de preservar
vidas humanas nas áreas urbanas. “Devem ser
estabelecidos parâmetros específicos
para áreas urbanas no que concerne as áreas
de preservação permanente ao longo
dos corpos d’água, em áreas de declives
acentuados e em topos de morro, para proteger a
vida humana. O código Florestal tem que incorporar
o princípio da salvaguarda da vida humana”,
disse o climatologista, lembrando desastres recentes
como o da Região Serrana do Rio de Janeiro,
no começo do ano.
Estudo divulgado recentemente
pelo MMA e produzido com o apoio do WWF-Brasil mostrou
que quase a totalidade (92%) dos deslizamentos na
Região Serrana do Rio de Janeiro foi ocasionada
por ocupações indevidas das áreas.
Também participaram da
sessão a presidente da Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena
Nader, o diretor de Florestas do Ministério
do Meio Ambiente (MMA), João de Deus Medeiros,
o coordenador de acompanhamento de promoção
de tecnologia agropecuária do Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(Mapa), Roberto Lorena, o presidente da Academia
Brasileira de Ciências, Elibio Rech, e o presidente
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea), Márcio Ponchmann.
O diretor de Florestas do MMA divulgou resultados
de estudo feito pelo ministério que derrubam
a afirmação de que o Código
vigente inviabiliza toda a produção
de café em Minas Gerais e toda a produção
de uva no Rio Grande do Sul porque ocorrem em encostas
com mais de 45 graus de inclinação
– situação em que o Código
determina que a vegetação natural
deve ser preservada.
“À luz do conhecimento,
esta afirmação não passa de
um mito. No Rio de Janeiro, um dos estados com relevos
mais acidentados do país, tem apenas 0,3%
de sua área com inclinações
superiores a 45 graus. No município de São
Joaquim, em Santa Catarina, tradicional produtor
de maçã, não há nenhuma
área com esta inclinação. O
mesmo ocorre no município de Três Pontas,
em Minas Gerais, onde se produz café, e em
Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, região
produtora de uva”, disse João de Deus Medeiros.
“Portanto, não há incompatibilidade
entre proteger estas áreas e manter a produção
destas culturas tradicionais”, completou.
O presidente da Comissão
de Ciência e Tecnologia, senador Eduardo Braga
(PMDB-AM) lembrou que as florestas têm “imensa
sinergia” com a produção agropecuária,
pelos serviços ambientais que prestam (produção
de água, abrigo a polinizadores, regulação
do clima). “Se hoje somos líderes no mercado
agrícola internacional, é também
em função de nossos recursos naturais”,
disse o senador.
De acordo com Braga, a discussão
que se impõe agora no Congresso é
qual futuro se deseja construir para o país:
“podemos escolher a construção de
um futuro inteligente, de desenvolvimento sustentável,
ou escolher o caminho feito por países que
destruíram seus recursos naturais e perderam
sua capacidade de produção”, disse.
No Senado Federal, segundo ele,
há a oportunidade de aprofundar o debate
sobre a reforma do código. “Temos que ouvir
os agricultores, mas também temos que ouvir
a ciência. Não podemos nos aliar àqueles
que acusam de vendidos os brasileiros que querem
contribuir para a construção de um
futuro inteligente para o país”, disse.