24 de agosto
de 2011
Projetos de extração de castanha do
Brasil se encaixam “como uma luva” nas mãos
dos povos indígenas como meio de promoção
social e gestão ambiental. A atividade propicia
geração de renda e melhoria de qualidade
de vida para as comunidades, ao mesmo tempo em que
promove integração entre aldeias,
manutenção da cultura, fiscalização
e monitoramento das terras indígenas.
Diante dos resultados positivos
obtidos por diferentes etnias, a Coordenação
Regional da Funai em Juína (MT) começou
a promover intercâmbios entre os povos para
troca de conhecimento e incentivo dessa prática
extrativista. A partir dos encontros, os Cinta Larga
resolveram seguir os exemplos de sucesso em busca
de uma atividade autossustentável para suas
aldeias.
No início, há cerca
de quatro anos, com envolvimento de apenas 10 indígenas,
a produção dos Cinta Larga foi de
seis toneladas de castanha. Hoje, com a valorização
da castanha e o incentivo das comunidades, 45 famílias
retiram aproximadamente 37 toneladas por ano, o
que proporciona uma renda média de R$ 63
mil.
“A castanheira é uma árvore
nativa da região e, por se tratar de uma
espécie perene, possibilita a coleta de frutos
durante vários anos, contribuindo assim,
além da geração de renda, para
preservação da biodiversidade, manutenção
da floresta em pé, manutenção
de nascentes, entre outros importantes benefícios
ambientais”, destaca o Coordenador Regional substituto
da Funai em Juína (MT), Adegildo José
do Nascimento, ao explicar porque a atividade tem
dado tão certo.
Para apoiar as comunidades indígenas, a Funai
se articula com os diversos órgãos
e parceiros visando à melhoria da produção
da castanha e também da seringa. Em julho,
os Cinta Larga estiveram nas aldeias Curva e Barranco
Vermelho, do povo Rikbaktsa, para conhecer o trabalho
de manejo e comercialização de castanha
do Brasil e látex da Associação
do Povo Indígena Rikbaktsa (Asirik).
A Coordenação Regional
da Funai também propicia cursos em parceria
com universidades e viabiliza o transporte dos produtos
dos castanhais e das estradas de seringa até
as aldeias e das aldeias até a cidade, onde
também participa da articulação
para a venda. Além disso, construiu e reformou
barracões para armazenamento da castanha
e do látex nas comunidades, produto que começou
a ser coletado no ano passado, junto com a castanha.
A fim de facilitar o transporte
da produção, dos locais de coleta
até as aldeias, a Regional comprou cinco
microtratores com capacidade de uma tonelada cada
um, que podem ser usados em estradas rústicas
– chamadas estradas carroçáveis -
em que outros veículos maiores não
trafegam. “Com os minitratores vai melhorar muito”,
avalia Paulo Roberto Cinta Larga, 27 anos, que vive
na Terra Indígena Parque do Aripuanã
e é também chefe da Coordenação
Técnica Local (CTL) Parque do Aripuanã
e Serra Morena, unidade ligada à Coordenação
Regional da Funai em Juína. “Em vez de carregar
um saco de castanha, a gente vai poder levar 10
sacos numa viagem. Antes era preciso 15 dias para
uma pessoa carregar 15 a 20 sacos de castanha”,
observa. Cada saco de do produto pesa em média
40 quilos.
Ele conta que quando sua aldeia
iniciou o projeto da castanha, em 2007, ela era
vendida para atravessadores por R$ 0,50 o quilo.
“Depois o preço foi melhorando e aí
todas as aldeias começaram a retirar castanha”,
lembra, ressaltando a importância da atividade
para o monitoramento das terras. “O indígena,
quando sai para coletar castanha, leva a família
inteira, caça, pesca e faz a fiscalização
de seu território, o que acaba promovendo
a gestão ambiental”, explica.
Paulo Roberto Cinta Larga diz
que a melhoria da qualidade de vida da comunidade
é visível. “Antes a gente precisava
de cesta básica, agora a gente trabalha,
vem pra cidade compra alimentação,
roupa, o que precisa”, compara. “O povo tem autonomia
para fazer suas coisas e não precisa vir
muito à coordenação da Funai.
Quando vem é para reivindicar coisas que
precisam na aldeia. Isso fortalece a comunidade”.
Ele ressalta que, com as atividades
da castanha e da seringa, os jovens participam mais
da vida da aldeia, conhecem os lugares e recuperam
algumas coisas da cultura, passando essa tradição
para as crianças, além de ajudar na
fiscalização. “Em algumas divisas
a gente vê pescadores, caçadores perto
da reserva e com a presença da comunidade
eles não se aproximam mais como vinham antes.
A nossa área é muito grande. A castanha
ajuda, e a seringa também”.
Seringa - A extração
do látex da seringueira é mais recente
para os Cinta Larga, mas nem por isso menos importante.
Em 2009, com o apoio do Pnud, a Funai promoveu capacitação
e comprou as ferramentas necessárias para
os indígenas. Este ano a Funai está
articulando a venda da borracha coletada pelos Cinta
Larga para a fábrica de pneus Michelin, que
já compra toda a produção do
povo Rikbaktsa.
“Temos foco, também, na
capacitação dos indígenas para
associar o conhecimento tradicional deles ao saber
técnico, no sentido de aprimorar o manejo
da atividade nas diversas etapas da produção.
Isso fortalece a cadeia produtiva da castanha do
Brasil e do Cernanbi Virgem Prenssado (CVP), que
é a forma como o látex da seringa
é comercializado para a indústria”,
ressalta Alan Dilessandro Oliveira de Souza, um
dos servidores da Funai que acompanha projeto em
Juína.
Caso de sucesso - Os indígenas
sempre coletaram castanha para sua subsistência,
mas, desde 2003, o povo Rikbaktsa que vive no noroeste
do Mato Grosso trabalha com a coleta de castanha
e com o látex de forma organizada, com fins
de comercialização e geração
de renda. O Programa Integrado da Castanha (PIC),
com vigência de 2003 a 2010, teve papel fundamental
no desenvolvimento dessas atividades. Em um ano
de trabalho com a metodologia do PIC, os Rikbaktsa
dobraram a produção de castanha, passando
de 20 para 40 toneladas/ano. Em 2010, eles chegaram
a 70 toneladas.
O PIC fazia parte do Projeto Promoção
da Conservação e Uso Sustentável
da Biodiversidade no Noroeste de Mato Grosso, firmado
entre o Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (Pnud) e a Secretaria de
Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema/MT),
financiado pelo Global Environment Facility (GEF).
O objetivo do Programa, que envolveu também
agricultores familiares e extrativistas da região,
foi apoiar esses atores em sua organização
social, processos de capacitação e
na estruturação do sistema de coleta,
seleção, armazenamento e comercialização
de produtos florestais não-madeireiros, tendo
como foco inicial a castanha do Brasil. Uma das
estratégias foi incentivar as alianças
entre associações indígenas,
sindicatos de trabalhadores rurais e extrativistas
para captação de recursos complementares,
visando à sustentabilidade.
Dessa forma, mesmo com o Programa
finalizado em 2010, a metodologia do PIC foi assumida
por outros projetos. É o caso do Pacto das
Águas, proposto pelo sindicato dos trabalhadores
rurais de Aripuanã (MT) e selecionado em
2007, para ser financiado pela Petrobrás
Ambiental. O projeto, que foi renovado até
2013 com recursos de R$ 3,5 milhões, tem
apoio da Funai, da Operação Amazônia
Nativa (Opan) e da Associação do Povo
Indígena Rikbaktsa (Asirik).
Como resultado desses oito anos
de trabalho - 2003 a 2011 - hoje os Rikbaktsa têm
uma castanha de qualidade reconhecida no mercado,
com certificação de produto orgânico,
pela Ecocert. A comunidade tem uma atividade sustentável
e a meta para os próximos dois anos é
dobrar a produção, atingindo 140 toneladas/ano.
Juarez Tárari Ribaktsa,
40 anos, que mora na aldeia Boa Esperança
da Terra Indígena Erikbaktsa, faz coleta
de castanha desde os15 anos, mas diz que a castanha
não tinha tanto valor. Depois que aprenderam
a limpar, selecionar, armazenar, o produto valorizou.
Hoje pode alcançar até R$ 2,00 o quilo.
“Nós temos parceria grande com Funai, que
apóia na parte logística e nas capacitações.
Melhorou a produção porque daí
temos a qualidade. Antigamente perdia muito também”.
Com apoio da Funai, novas trilhas foram abertas
até os castanhais e foram construídos
barracões para armazenar o produto na aldeia.
Ele comemora o fato de sua comunidade
ter uma renda honesta, referindo-se aos ilícitos
que ameaçam as terras indígenas. “Na
comunidade melhorou na questão econômica,
nunca mexemos com mineração ou madeireira
e nem vamos nos envolver. Mexendo com castanha você
está protegendo o meio ambiente. O dinheiro
da castanha dá pra comprar vestimentas, calçados,
material melhor pros filhos. Hoje não falta
nada para nós”.
Para os Rikbaktsa, a retirada
do látex complementa a atividade do ano.
“A castanha é de novembro a março.
E, de maio a agosto, a seringa”. A fábrica
de pneus Michelin firmou contrato com o projeto
Pacto das Águas, se comprometendo a comprar
toda a produção de látex a
R$ 4,00 quilo. A produção anual é
de 10 toneladas atualmente.
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31 de agosto de 2011
Operação Txokrãn
do Ibama coíbe pesca ilegal no rio Xingu
Sinop (31/08/2011) – Buscando
coibir a caça e a pesca ilegal dentro da
terra indígena Kapoto-Jarinã, no extremo
norte do Mato Grosso, o Ibama deflagrou no último
fim de semana a operação Txokrãn,
alusão à fruta da região, berço
da etnia Juruna.
Com apoio da Fundação
Nacional do Índio (Funai) e da Polícia
Federal, o Ibama autuou oito pescadores pegos em
flagrante em área proibida, que pagarão
multa de R$ 1 mil cada um e serão denunciados
ao Ministério Público Federal por
crime ambiental. Os agentes ambientais federais
apreenderam 11 barcos, 11 motores e embargou uma
pousada. A autuação prevê multa
de R$ 450 mil.
Desde 2009, quando recebeu da
Funai e das comunidades indígenas as primeiras
denúncias de caça e pesca ilegal no
local, o Ibama fez missões de reconhecimento
na região. A partir de então, a operação
passou a fazer parte do Programa Nacional Anual
de Proteção Ambiental (PNAPA).
As pousadas situadas ao lado da
terra indígena vendem em seus pacotes a possibilidade
de o cliente usufruir de todos os benefícios
naturais do lugar, o que é ilegal, pois,
de um lado do rio, está a terra indígena
e, de outro, o Parque Nacional do Xingu, ambos com
entrada proibida.
Segundo o superintendente do Ibama
em Mato Grosso, Ramiro Martins Costa, é preciso
chamar a atenção das autoridades para
a necessidade de se melhor regulamentar a exploração
comercial do entorno da terra indígena Kapoto-Jarinã.
“Vamos gerar um relatório e entregá-lo
ao presidente do Ibama, mostrando a importância
que essas comunidades têm para a conservação
do meio ambiente e a pressão que esse meio
vem sofrendo”, informou. Ainda nas palavras de Martins
Costa, existe estudo para a criação
de uma terra indígena exatamente na região
onde estão as pousadas, local em que nasceu
o cacique Raoni, lugar histórico das etnias
indígenas Juruna e Caiapó.
Na avaliação do
Ibama, o resultado da operação foi
excelente. Foi possível estreitar os laços
entre as comunidades indígenas da área,
que são os verdadeiros guardiões da
floresta, e a superintendência do Ibama no
Mato Grosso. Lideranças como os caciques
Raoni, Megaron, e Dedjai estão extremamente
satisfeitas com a atuação do Ibama
e confiantes no Estado Brasileiro.
Segundo o representante da Funai
na operação, Henrique Klocker de Camargo,
os limites devem ser respeitados. A pesca não
é uma atividade proibida mas é necessário
que ela seja feita fora das áreas indígenas,
pois os índios não fazem pesca esportiva,
fazem pesca de subsistência. De acordo com
índios entrevistados, a presença do
homem branco em sua terra não é bem
vista.
O homem branco, segundo eles,
polui o rio e a floresta, pega o peixe, mata o jacaré,
a onça, a anta. “Nosso supermercado é
a floresta. Daqui, tiramos o nosso sustento. Se
o pescador acabar com o peixe, meus netos e bisnetos
vão tirar de onde sua alimentação?
Por isso, chamamos o Ibama para que não deixe
o branco entrar na terra do índio.”, disse
Waiwai, cacique de uma das tribos caiapós.
Na mesma linha, o cacique Apudeká
Yudjá, da aldeia Kapot Ninore, disse que,
para os indígenas, a presença do Ibama
é motivo de muita alegria. Essa operação
é muito importante, pois eles vivem um drama
ao ver a situação do rio Xingu. “O
que vem acontecendo com a presença de pescadores
que acabam com nossos peixes nos deixa muito tristes.
Queremos a expulsão desses pescadores e o
fechamento das pousadas que atraem o homem branco.
Sem o rio e sem a floresta, nosso povo não
tem condições de viver. Fomos criados
na mata e na mata seremos felizes”, justificou.
As operações no
rio Xingu, no entorno da terra indígena,
acontecerão com regularidade.