O projeto de lei que desfigura
o Código Florestal agora é apreciado
pelos senadores. O Greenpeace vai para oito cidades
chamar a população para engrossar
o coro contra o texto.
Maioria na Câmara dos Deputados, a bancada
ruralista aprovou em maio, mesmo sem apoio da sociedade,
o projeto que desfigura o Código Florestal.
Agora o texto passa pelo
Senado e o Greenpeace vai para oito capitais brasileiras
para chamar a população a conhecer
mais o assunto e mandar seu recado para os políticos
desligarem a motosserra.
Ao longo de um mês, os voluntários
do Greenpeace vão passar por Belo Horizonte,
Brasília, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio,
Salvador e São Paulo. Durante a estada nessas
capitais, os voluntários da ONG participarão
de palestras, entregarão folhetos explicativos
e convidarão a todos a serem ativistas por
um dia, tirando sua fotografia e enviando para a
página do Greenpeace no Facebook.
Se o projeto de lei que altera
o Código Florestal for aprovado do jeito
que está hoje, o Congresso enterrará
a possibilidade de o Brasil ser a primeira potência
econômica e ambiental do mundo. “As mudanças
propostas no Código Florestal vão
contra os alertas das maiores instituições
científicas do país: se for aprovado
assim, quem sai perdendo é o próprio
Brasil”, afirma Tatiana de Carvalho, da campanha
Amazônia do Greenpeace. “Ao abrir espaço
para mais devastação do território
nacional, o Congresso cava caminho para mais tragédias
que vão afetar a vida de todos nós,
como enchentes, deslizamentos e secas.”
Uma pesquisa da Datafolha desse
ano mostrou que pelo menos 79% dos brasileiros são
contra a anistia a quem desmatou ilegalmente. É
justamente esse um dos pilares da proposta em trâmite.
O resultado dessas promessas já tiveram resultado
prático no campo: depois de dois anos de
queda acentuada, a taxa de desmatamento na Amazônia
voltou a subir. O governo de Mato Grosso inclusive
admite que a causa é a expectativa de perdão
gerada pelo texto em discussão.
É um movimento ilegal e
especulatório. A Sociedade Brasileira para
o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia
Brasileira de Ciências (ABC) já mostraram,
em estudo, que o país tem 61 milhões
de hectares de terras que também poderiam
ser usados para a produção de alimentos.
Além disso, representantes da agricultura
familiar – segundo o IBGE, os pequenos produtores
são responsáveis por 75% dos alimentos
que vão para a mesa dos brasileiros – também
se colocaram publicamente contra o projeto de lei,
argumentando que ele só beneficia o agronegócio.
“Os parlamentares são irresponsáveis
ao aprovar um projeto que é criticado por
tantos e distintos atores. Está muito claro
que, caso o texto vire lei, inclusive a agricultura
brasileira perde, pois ela depende da floresta,
do solo saudável e da água para continuar
forte”, diz Tatiana. “Além disso, a Rio +20
está batendo à porta e, se a presidente
Dilma não frear esse trator, ela terá
de explicar ao mundo como deixou passar uma legislação
que joga para o alto os compromissos brasileiros
de reduzir suas emissões de gases-estufa.”
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O nosso 11 de setembro de 2001
Naquele fatídico dia para
o mundo, o Greenpeace estava embrenhado na Amazônia,
com o povo indígena Deni. Começou
ali a demarcação de sua terra, por
conta própria.
No mapa: equipe do Greenpeace
capacita o povo Deni a fazer a demarcação
de sua terra. Foto: © Greenpeace/Flavio Cannalonga
O rio Xeruã, no sudoeste do Amazonas, acordou
esta semana com boas novas. Em cerimônia,
o povo indígena Deni celebrou a conclusão
do plano de gestão de sua terra. Em se tratando
dos Deni, isso não é pouca coisa.
Depois de esperar mais de 15 anos pelo reconhecimento
do seu território, faz exatamente uma década
que a comunidade empunhou bússolas e GPS
para demarcar, por conta própria, a área
que lhes pertencia. O Greenpeace estava lá.
“Naquele 11 de setembro, às
10 da manhã, enquanto as torres gêmeas
do World Trade Center desabavam em Nova York, o
navio Sunrise, do Greenpeace, estava em Manaus para
anunciar à imprensa que nós iríamos
ajudar os Deni a demarcar 1,6 milhão de hectare
de floresta, reivindicado historicamente por eles
como sua terra”, recorda o diretor da campanha Amazônia
do Greenpeace, Paulo Adario, que estava a bordo
da embarcação. A 1.480 km de distância
de barco da capital amazonense, um time de voluntários
e de ativistas e vários patarahu (chefes)
Deni esperavam a entrevista começar em torno
de um sofisticado sistema de comunicação
montado pelo Greenpeace.
Até então smi-isolados
em suas aldeias, os Deni iriam falar pela primeira
vez na vida via satélite com jornalistas,
com ajuda nossos técnicos e de um tradutor..
A entrevista foi tecnicamente um sucesso. Mas a
repercussão, nos dias seguintes, foi mínima:
a atenção da mídia e da opinião
pública estaria, por longo tempo, voltada
para a tragédia de Nova York.
“O ataque às torres gêmeas,
que causou tantas mortes, provocou um outro tipo
de estrago a milhares de quilômetros de Nova
York : transformou em quase sussuro a voz do povo
Deni exatamente no mesmo momento em que eles decidiram
gritar ao Brasil e ao mundo que estavam cansados
de esperar que o governo demarcasse seu território
e que haviam decidido fazer o serviço por
eles mesmos. Os Deni foram vítimas indiretas
de Bin Laden”, diz Adario.
Meses antes, chegava pelo rio
Xeruã um time de voluntários do Greenpeace
e de organizações indigenistas, como
Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e
a Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).
A equipe contava com sociólogos, agrimensores,
engenheiros e antropólogos, que capacitaram
os indígenas a mexer com os instrumentos
que fariam o traçado dos limites do território.
Nas semanas seguintes, os Deni
mergulharam no trabalho de demarcação,
enquanto o Greenpeace redobrava os esforços
de comunicação entre o grupo que estava
nas florestas do Xeruã e o mundo externo.
“O governo finalmente reagiu, mas foi para ordenar
que a gente parasse a demarcação.
Nós não paramos, já que os
Deni disseram que éramos seus convidados
e que, tecnicamente, o Greenpeace não estava
demarcando nada: o trabalho estava sendo feito pelos
próprio indígenas”, conta Adario.
A resposta dos Deni à ordem vinda de Brasília
foi uma carta enviada à Fundação
Nacional do Índio para dizer que a empreitada
só teria fim quando o governo assumisse o
trabalho.
A iniciativa veio depois que o
Greenpeace descobriu, em investigação,
que uma madeireira da Malásia, a WTK, extraía
madeira ilegal da região. Quase 50% da área
explorada pela empresa se sobrepunha à terra
Deni. Após receberem o treinamento técnico
necessário, os indígenas abriram quilômetros
de trilhas nas fronteiras de seu território
e colocaram placas ao longo delas avisando: “Entrada
Proibida: Terra Deni”.
O protesto caiu na imprensa brasileira
e internacional. Depois de muita negociação
e resistência dos órgãos oficiais,
os esforços foram recompensados: em outubro
de 2001, o Ministério da Justiça reconheceu
os direitos daquele povo sobre sua terra. Dois anos
mais tarde, em maio de 2003, chegavam os técnicos
para a demarcação oficial do território.
Ela foi concluída em agosto de 2003, com
a instalação de marcos e placas identificando
a área com o selo do governo federal. Em
2004, o então presidente Lula deu a canetada
final, homologando a terra indígena.Deni.
Desde então, a mineração
e a exploração industrial de madeira
estão proibidas por ali. São 1,53
milhão de hectares protegidos por lei, formando
um corredor de 3,6 milhões de hectares se
somado a outras terras indígenas na região.
O anúncio dos Deni naquele 11 de setembro
foi abafado pelo ataque às torres gêmeas
nos Estados Unidos. Mas, como se vê, eles
continuaram em frente.