28/11/2011
Melissa Silva
As doze cidades brasileiras escolhidas para sediar
a Copa de 2014 e suas regiões metropolitanas
são responsáveis pela produção
de 35% dos resíduos sólidos urbanos
do País, algo em torno de 91 mil toneladas
de lixo geradas por dia. É por essas cidades
que os empresários do setor de embalagens
propõem começar a logística
reversa de seus produtos, excluídas as embalagens
de agrotóxicos e óleos lubrificantes
que terão modelagem específica de
devolução ao ciclo produtivo.
Desde maio os grupos do Comitê
Orientador da Logística Reversa da Política
Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS)
trabalham na elaboração dos editais
de chamamento das cinco cadeias produtivas definidas
como prioritárias pelo próprio Comitê
Orientador da PNRS: embalagens em geral; embalagens
de óleos lubrificantes; lâmpadas fluorescentes;
eletroeletrônicos; descarte de medicamentos.
A previsão é que
os editais de algumas categorias sejam publicados
até dezembro deste ano. Com isso as empresas
e indústrias envolvidas serão convidadas
a apresentar suas propostas de logística
reversa, de forma a compor o acordo setorial de
cada uma das cadeias.
No caso das embalagens, a proposta
está adiantada e uma coalizão de 15
associações do setor liderada pelo
Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre)
sugere que a cadeia preste todo o apoio para implantação
eficaz de coleta seletiva nas cidades-sede da Copa,
inclusive com recursos, fortalecendo todo o sistema,
desde a educação do consumidor que
precisa mudar o comportamento e começar a
separar os resíduos domiciliares, incluindo
os investimentos necessários para estruturação
das cooperativas de catadores que deverão
participar em parceria com os serviços de
limpeza urbana para recolhimento separado dos resíduos.
"Sabemos que grande parte
das embalagens está nas casas das pessoas,
que as descartam no lixo comum, até por que
a coleta seletiva funciona em apenas 18% dos municípios,
mas a separação precisa começar
com o consumidor", alerta o representante do
Cempre, Victor Bicca.
O Cempre reúne 75% dos
representantes da cadeia de embalagens e conta com
a associação de empresas líderes
nos mercados de PET, plástico, latas, cerveja,
bebidas não alcoólicas, refrigerantes,
alimentos, massa, chocolate, óleo vegetal,
papel e celulose, higiene pessoal e cosmético
e limpeza doméstica. Além disso, estão
em negociação avançada com
associações do varejo supermercadista
e de vidro, ambas interessadas em compor o acordo.
Na visão deles a meta de
logística reversa para as embalagens deve
ser global para a cadeia e não por segmento
separadamente (plástico, lata, papel, etc.).
Ainda propõem que o índice esteja
atrelado à fração seca de lixo
reciclado e não ao percentual de embalagens
coletadas por fabricantes, importadores, distribuidores
e comerciantes, que são os atores envolvidos
na questão da responsabilidade compartilhada
estabelecida pela Política, no que se refere
à restituição dos resíduos
sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento,
em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou
outra destinação final ambientalmente
adequada.
"Esse grupo está empenhado
em fazer com que a mudança de hábito
do consumidor vire uma realidade", garantiu
Bicca.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella
Teixeira, considera a proposta interessante, mas
se preocupa com a inclusão dos pequenos e
médios empresários do setor e com
a regionalização do País que
demanda soluções diferenciadas para
cada localidade.
"Precisamos focar nessa nova
classe média que está consumindo cada
vez mais e ter uma visão regionalizada de
cada segmento do setor de embalagens para buscar
resultados compatíveis com a realidade de
cada estado e município", reforça
a ministra.
Alumínio - A reciclagem
das latas de alumínio para bebidas movimentou
R$ 1,3 bilhão na economia nacional em 2009,
conforme dados do Cempre. Só a etapa de coleta
(a compra das latas usadas) injetou R$ 382 milhões,
o equivalente à geração de
emprego e renda para 216 mil pessoas.
É um caso em que o fabricante
nem tem a chance de coletá-la e destiná-la
à reciclagem, já que é um material
valioso e as cooperativas se encarregam eficientemente
delas, recebendo, em média, de R$ 3,2 por
quilo, o equivalente a 75 latinhas (Cempre-dez/2010).
O que acontece com as latas de
alumínio justificaria a proposta do setor
de vincular a meta de logística reversa de
embalagens à reciclagem, pois, por mais que
a indústria não esteja recebendo o
produto de volta, a destinação adequada
efetiva está acontecendo, já que 98,2%
das latas de alumínio foram recicladas em
2009, assegura a Associação Brasileira
dos Fabricantes de Latas de Alta Reciclabilidade
(Abralatas), superando países industrializados,
como Estados Unidos (57,4%), Argentina (92%) e Japão
(93,4%).
A reciclagem do alumínio
tem números expressivos e tem potencial ainda
maior, considerando as 350 milhões de unidades
de desodorante aerosol que são fabricadas
anualmente e utilizam o mesmo material. De acordo
com a associação da indústria
de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos,
esse mercado cresce, em média, 20% ao ano
e a estimativa para 2011 é a produção
de 420 milhões de unidades que precisam somar
ao lucrativo negócio da reciclagem.
Para determinar a meta global
e monitorar o cumprimento, eles apoiam a instalação
de um fórum com modelo de governança
alinhado aos representantes do setor empresarial
envolvidos na responsabilidade compartilhada. Seria
a instância encarregada de estabelecer as
linhas de capacitação e mobilização
com os catadores, a partir dos conhecimentos de
reciclagem adquiridos pelo setor nos últimos
20 anos, montando as cooperativas e deixando-as
aptas para funcionar adequadamente.
"Os investimentos começariam
pelas doze cidades-sede da Copa do Mundo, pois até
2014 o tempo seria suficiente para implantarmos
a coleta seletiva efetiva apenas nessas localidades,
atendendo tanto o prazo da Política de Resíduos
Sólidos quanto do evento esportivo, mas na
segunda fase expandiríamos para os demais
municípios", argumenta Bicca.
Em contrapartida, o setor pede
ao Governo Federal a ampliação do
parque reciclador na mesma medida em que aumentará
o volume coletado; a desoneração da
reciclagem, inclusive para impulsionar a exportação
dos produtos brasileiros reciclados, que ainda são
mais caros do que os novos e não consomem
a matéria-prima; e a criação
da política industrial do setor com previsão
de investimentos em pesquisa e inovação
para incremento das recicladoras com novas tecnologias.
Os empresários ainda alertam
que estados com legislação de resíduos
sólidos anterior à PNRS, como São
Paulo e Espírito Santo, estão cobrando
da indústria a implantação
da logística reversa, mas para coordenar
as políticas estaduais com a nacional, o
MMA começa agora um processo de pactuação
com as secretarias de ambiente dos estados e com
o Ministério Público a fim de organizar
o processo e dar conhecimento sobre o andamento
do trabalho dos grupos do Comitê Orientador
da Logística Reversa da PNRS.
"As cinco audiências
públicas regionais para debater o Plano Nacional
de Resíduos Sólidos também
foram espaços para dialogar com os prefeitos
e atores locais sobre o desenvolvimento de toda
a Política, que será consolidada gradativamente",
lembra o secretário de Recursos Hídricos
e Ambiente Urbano, Nabil Bonduki. Além disso,
estão sendo preparados manuais, guias e cursos
a distância para disseminar as informações
nos municípios.
Plano Nacional - Nesse processo
de debate com a sociedade, o Governo está
atento para conciliar todas as metas do Plano Nacional
com a necessidade de reduzir a quantidade de lixo
seco que chega aos aterros sanitários, e
eventualmente aos lixões, pois estudos de
gravimetria apontam que ele representa 32% dos resíduos
sólidos urbanos, onde há uma grande
quantidade de embalagens.
O Plano irá acompanhar
o que vai acontecer nos aterros sanitários
ao longo do tempo e terá metas de redução
dessa quantidade de resíduos secos que chegam
a eles. Nas audiências públicas, a
logística reversa está sendo discutida
em função desses objetivos, que, no
caso das embalagens, tem relação direta
com a coleta seletiva.
GTT de Embalagens - A proposta
do setor produtivo está evoluindo no Grupo
de Trabalho Temático (GTT) de Embalagens,
vinculado ao Comitê Orientador da Logística
Reversa, e a governança por meio do fórum
já foi aceita. A instância vai promover
o processo de decisão e estabelecer o diálogo
do setor privado (fabricantes, importadores, comerciantes,
indústria, todos que têm a obrigatoriedade
da responsabilidade compartilhada do ponto de vista
do setor empresarial) com o conjunto de outras entidades
que têm a ver com a logística reversa,
como os governos federal, estadual, municipal, o
Movimento Nacional de Catadores e a representação
dos consumidores. Cada entidade que compõe
a governança, além do Fórum,
fará a coordenação com o setor
representado.
O Governo Federal participará
do fórum porque irá coordenar e assinar
os acordos setoriais. Os governos estaduais também
terão representação porque,
além de poderem fazer termos de compromisso
locais, serão obrigados a acompanhar a fiscalização
desses acordos setoriais nos estados. Já
a participação dos governos municipais
será fundamental, pois, especificamente no
caso das embalagens, a expectativa é que
a logística reversa seja harmonizada com
a coleta seletiva e o fórum será a
oportunidade de diálogo dos municípios
com o setor produtivo para definir a modelagem,
que, depois de decidida, deverá ser implementada
pelos municípios e apoiada pelos empresários.
A governança já
está definida, mas a intenção
de priorizar a ação nas cidades-sede
da Copa ainda é um tema em discussão
no GTT, pois a PNRS prevê o planejamento de
ações de manejo de resíduos
para o Brasil inteiro. No entanto, o grupo reconhece
que todo trabalho que o governo vem desenvolvendo
e discutindo aponta para a necessidade de ter uma
estratégia focalizada nas regiões
metropolitanas e nas grandes cidades, já
que, de uma forma geral, concentram grande parte
dos resíduos.
Nessa direção, o
Governo Federal está discutindo a perspectiva
de priorizar as ações de coleta seletiva
nos grandes centros onde há mais geração
de resíduos, o que acontece não só
nas cidades-sede da Copa, mas também nas
regiões metropolitanas e nas demais capitais
do País.
O diretor de Ambiente Urbano, Silvano Costa, esclarece
que a proposta que eles trazem não é
contrária ao que o governo entende ser uma
boa estratégia, tem aderência a tudo
que estamos fazendo, mas ela ainda vai ser discutida
e poderá fazer parte de um acordo setorial.
Há a perspectiva de que
o estudo de viabilidade técnica e econômica
seja concluído até meados de dezembro,
o que subsidiará a tomada de decisão
do Comitê Orientador para aprovar o edital
e publicá-lo.
Para Costa, a ideia do setor empresarial
é uma sinalização interessante
para o avanço da Política, justamente
porque a Copa será em 2014 e o esforço
é para que o acordo seja assinado no primeiro
semestre de 2012.
"Estar nesse caminho desde já é
importante e esse movimento vem num bom momento",
acredita o diretor.