Depois de muitos
acordos às escuras e nem tantos debates às
claras, terminou hoje o enterro do Código
Florestal nas Comissões do Senado. A rejeição
à emenda que previa uma moratória
de dez anos para o desmatamento na Amazônia
desvendou as verdadeiras intenções
do texto.
A emenda do desmatamento zero
foi rejeitada primeiro pelo relator e representante
do governo, Jorge Viana (PT-AC), e depois pelos
senadores. Apenas Aloysio Nunes (PSDB-SP), Pedro
Taques (PDT-MT), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e
Valdir Raupp (PMDB-RO) votaram a favor. Este último,
autor da emenda, lembrou que, durante todo o debate,
até a senadora Kátia Abreu (PSD-TO)
se disse contra novos desmatamentos, e mesmo assim,
todos se opuseram à medida.
“O senador Randolfe afirmou que
a emenda era a chance de colocar o bonito discurso
de que não precisa mais desmatar no papel,
mas é exatamente isso o que não acontece.
No discurso, eles falam em salvar as florestas,
mas na prática, votam a sua destruição.
Com isso, cai a máscara: ruralista gosta
é de ver floresta no chão, não
em pé”, afirmou Marcio Astrini, da Campanha
Amazônia do Greenpeace.
O acordo feito entre ruralistas
e o governo para a aprovação do relatório
foi mantido na votação das emendas
e ficou explícito que estava tudo resolvido:
o governo já tinha acatado o que o agronegócio
exigiu, e as tentativas de diminuir os efeitos desastrosos
do texto seriam derrotadas.
“Nada mudou. O texto continua
ruim e a rejeição do desmatamento
zero simboliza tudo. As exigências feitas
pelo agronegócio de mudança do relatório
foram todas rapidamente acordadas e acatadas pelo
relator”, disse Astrini.
Outra emenda rejeitada foi uma
que previa que as Reservas Legais deveriam continuar
sendo registradas em cartório junto com os
imóveis, pois a falta de registro dificultará
o controle sobre as propriedades. A rejeição
agrada aos desmatadores, que querem ficar invisível
aos olhos do Estado.
A pressa em agradar os desejos
ruralistas e votar a toque de caixa o texto do Código
foi tamanha que acabou gerando uma grande confusão
na reunião. Até os ruralistas ficaram
surpresos com uma emenda que dificultava parte das
anistias já concedidas. Mas os senadores
Jorge Viana e Luiz Henrique (PMDB-SC) prontamente
os tranquilizaram, afirmando que resolveriam o mal-entendido
no plenário da Casa.
A votação no plenário
do Senado está prevista para a próxima
semana. Depois disso, ela retorna à Câmara
e em seguida vai à sanção presidencial.
Mas a presidente parece já ter esquecido
suas promessas verdes de campanha.
Ontem, enquanto o Senado acabava
com a lei ambiental, Dilma foi ao evento dos 60
anos da Confederação Nacional da Agricultura
(CNA). A aliança feita entre os ruralistas
e o governo foi selada num abraço entre a
presidente e a senadora Kátia Abreu (PSD-TO).
Dilma deveria lembrar da promessa que fez a seus
eleitores, que não permitiria mais desmatamento.
Ainda dá tempo.
+ Mais
Madeira, crime e violência
O Porto de Caen, na França,
amanheceu nesta segunda-feira com uma de suas partes
isoladas. Com uma fita amarela onde se lia “Cena
do crime contra floresta”, ativistas do Greenpeace
chamaram atenção para um carregamento
de madeira vindo da floresta tropical da República
Democrática do Congo, na África. As
enormes toras, retiradas pela empresa Siforco –
braço madeireiro do grupo alemão Danzer
no país africano –, guardam uma sequência
de crimes ambientais e de desrespeito aos direitos
humanos.
A história foi levada à
tona por meio do documento “Futuro roubado: conflitos
e extração de madeira no Congo – o
caso Danzer”, que o Greenpeace divulgou ao mesmo
tempo em que acontecia a ação. O relatório
conta casos da comunidade africana Yalisika, no
vilarejo de Bosanga, que há anos sofre com
a extração de madeira em sua área.
A atividade sempre foi permeada por conflitos e
violência contra os locais.
Foi o que aconteceu, por exemplo,
no dia 2 de maio passado. Com o dia raiando, cerca
de 60 policiais e militares chegaram ao vilarejo
de Yalisika para inibir qualquer tentativa de resistência
às madeireiras. Muitas pessoas foram espancadas,
uma casa acabou completamente queimada e vários
pertences foram retirados. Uma pessoa morreu.
Numa investigação,
o Greenpeace descobriu que a Danzer tinha participação
na violenta operação. “O que descobrimos
é que a empresa está diretamente envolvida
nessas violações de direitos humanos”,
afirma Olivia Langhoff, diretora de campanhas do
Greenpeace África. “A Siforco, pertencente
ao Grupo Danzer, foi quem providenciou a logística,
incluindo um caminhão e um motorista, e pagou
os policiais que participaram dessa represália.”
O envolvimento da Danzer nesse
tipo de incidente, porém, não é
novidade por ali. Extraindo madeira no local desde
1993, a empresa já esteve relacionada a outros
problemas. Em 2005, por força da legislação,
acabou assinando um “termo de responsabilidade social”
com os líderes locais, como forma de compensar
os prejuízos que sua atividade deixa pelo
caminho. Prometeram a construção de
uma escola e assistência médica. Nunca
cumpriram o compromisso, apesar de não terem
parado nem um instante a exploração
predatória da floresta. Do outro lado da
linha, países como França e Alemanha
também alimentam essa indústria, com
dinheiro e subsídios.
“Esses casos terríveis
de Yalisika mostram que a indústria madeireira
não pode ser vista como solução,
nem para a floresta, tampouco para a população
que vive nela. Os países doadores devem parar
de usar dinheiro público para financiar essa
indústria e, em vez disso, apoiar um cenário
alternativo de economia verde”, defende Irene Wabiwa,
do Greenpeace África. “Essa triste história
mostra como funciona a indústria madeireira
no Congo.”
O envolvimento da Danzer nesse
tipo de incidente, porém, não é
novidade por ali. Extraindo madeira no local desde
1993, a empresa já esteve relacionada a outros
problemas. Em 2005, por força da legislação,
acabou assinando um “termo de responsabilidade social”
com os líderes locais, como forma de compensar
os prejuízos que sua atividade deixa pelo
caminho. Prometeram a construção de
uma escola e assistência médica. Nunca
cumpriram o compromisso, apesar de não terem
parado nem um instante a exploração
predatória da floresta. Do outro lado da
linha, países como França e Alemanha
também alimentam essa indústria, com
dinheiro e subsídios.
“Esses casos terríveis
de Yalisika mostram que a indústria madeireira
não pode ser vista como solução,
nem para a floresta, tampouco para a população
que vive nela. Os países doadores devem parar
de usar dinheiro público para financiar essa
indústria e, em vez disso, apoiar um cenário
alternativo de economia verde”, defende Irene Wabiwa,
do Greenpeace África. “Essa triste história
mostra como funciona a indústria madeireira
no Congo.”