09 de dezembro de 2011 - Dez dias
após o ataque ao acampamento Tekohá
Guaiviry, onde foi morto, no último dia 18,
o cacique Nísio Gomes, uma comitiva de agentes
do Governo Federal esteve nas cidades de Dourados
e Ponta Porã para construir e articular um
conjunto de políticas
em defesa dos direitos da população
Guarani do Mato Grosso do Sul. Parte da estratégia
consiste na ação conjunta entre os
órgãos que compõem o Comitê
Gestor de Ações Indigenistas Integradas
para a Região do Cone Sul, do qual participam
diversos ministérios, e na integração
das forças de segurança federais e
estaduais.
“Estamos aqui para selar um compromisso
permanente, não só de defesa da vida,
mas do conjunto de direitos dos povos indígenas.
Não só direito à sobrevivência,
mas vida plena, saúde, educação,
produção de alimentos, e o exercício
dessa rica cultura”, afirmou Paulo Maldos, secretário
de Articulação Social da Secretaria
Geral da Presidência da República.
Durante reunião de instalação
do Comitê Gestor, realizada na prefeitura
de Dourados no dia 29 de novembro, o secretário
reafirmou o compromisso do Governo em buscar ações
concretas e de extrema urgência para o combate
à criminalidade e impunidade dos que ameaçam
e atacam indígenas.
Para Dirce Veron, filha do cacique
Marco Veron, assassinado em janeiro de 2003, é
preciso que os governantes tenham mais sensibilidade
para a questão Guarani no Mato Grosso do
Sul. “Estou vendo o que é construir políticas
públicas de verdade. Estou vendo o empenho
do Ministério Público Federal, que
estamos sendo ouvidos sim, em todos os sentidos.
Esse tipo de reunião temos que ter ao menos
duas vezes no ano aqui, e as pessoas dos governos
tem que entender que somos diferentes sim, vivemos
diferente”, falou Dirce, que é representante
indígena do Comitê Regional da Funai
de Dourados.
A representante da Presidência
da Funai, Rosângela Barros, propôs aos
representantes indígenas dos Comitês
Regionais da Funai de Dourados e de Ponta Porã
a composição de uma comissão
para, junto com os agentes das duas Coordenações
Regionais, acompanharem as ações do
Comitê Gestor. “O compromisso da Funai de
proteção e promoção
dos direitos se renova a cada dia, e se fortalece
não só com o Comitê Gestor,
mas também com o trabalho integrado e articulado,
por meio dos Comitês Regionais paritários
da Funai, nos quais os servidores pensam as políticas
públicas com a participação
direta da população indígena”,
explicou a assessora da Funai.
Polícia Comunitária
para enfrentamento da violência contra indígenas
O secretário Paulo Maldos
e os representantes da Funai também articularam
uma reunião específica para tratar
da segurança nas aldeias. O encontro antecedeu
a instalação do Comitê Gestor
e contou com a presença do procurador da
República em Dourados, Marco Antonio Delfino
de Almeida, do secretário de Estado de Justiça
e Segurança Pública/MS, Wantuir Francisco
Brasil Jacini. Como resultado deste encontro, foi
definida a instalação de unidades
de policiamento comunitário a partir de 2012,
inicialmente nas aldeias de Dourados e Kaarapó.
“A polícia comunitária
vai iniciar como um laboratório, nas comunidades
onde é maior o índice de criminalidade.
É um aprendizado que poderá aperfeiçoar
a política de policia comunitária
indígena, que é inédito no
país. Quando houver uma experiência
adequada serão dados passos seguintes”, avaliou
o secretário Wantuir Jacini. A coordenadora
da Funai em Dourados, Maria Aparecida Mendes, destacou
que a Operação Tekohá, da Polícia
Federal, gerou sensação de segurança
entre os indígenas, principalmente as mulheres,
que são as maiores vítimas. “A Operação
Tekohá é um ponto de referência
do que seria a polícia comunitária
dentro das aldeias”, considerou. “É importante
que haja o espaço de diálogo para
que se possa construir uma ação com
Governo Federal, Governo do Estado e povos indígenas,
porque o Mato Grosso do Sul não quer continuar
sendo referência internacional de criminalidade”,
concluiu Lia, como é conhecida a coordenadora.
Também estiveram presentes
nesta reunião: Tenente Coronel Ary Carlos
Barbosa , Comandante do 3° Batalhão da
PM de Dourados/MS; Antonio Carlos Videira, Delegado
Regional da Polícia Civil de Dourados/MS,
Andrea Bittencourt Prado, da Coordenação
Geral de Promoção dos Direitos Socias/Funai,
Capitão Edson Bailas Ribeiro e Tenente Max
Cláudio Fernandes de Almeida, da Força
Nacional de Segurança, Bruno Renato Teixeira,
Coordenador da Ouvidoria Secretaria Nacional de
Direitos Humanos; Delegado Chang Fan, da Polícia
Federal de Dourados; Carolina Schneider Comandulli,
da Coordenação Geral de Monitoramento
Territorial/Funai; Silvio Raimundo da Silva, coordenador
Regional da Funai em Ponta Porã; Nikolas
Raphael Gil Alcon Mendes, da Coordenação
Geral de Monitoramento Territorial/Funai; e Tonico
Benite, Guarani Kaiowa (Aty Guassu Guarani).
Povo Guarani Kaiowá realiza
marcha contra o genocídio e pela paz
A agenda dos representantes do
Governo Federal terminou no dia 30 de novembro,
acompanhando a marcha contra o genocídio
e pela paz, ato que reuniu 500 indígenas
e simpatizantes da causa. O grupo caminhou cerca
de sete quilômetros pela rodovia MS-86, que
liga Ponta Porã a Amambai. O ato foi encerrado
com reunião no acampamento Tekoha Guaiviry.
No dia seguinte, a PF prendeu três suspeitos
pelo ataque ao acampamento. Além de participação
no ataque ao acampamento dos Guarani-Kaiowá,
os três homens detidos são suspeitos
de envolvimento na morte do cacique Nísio
Gomes. Os suspeitos prestaram depoimento na delegacia
da PF em Ponta Porã, mas seus nomes e nacionalidades
não foram divulgados.
+ Mais
Aprovado estudo de delimitação
da Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica/MS
13 de dezembro de 2011 - A Fundação
Nacional do Índio (Funai) publicou ontem
(12), no Diário Oficial da União,
o Resumo do Relatório Circunstanciado de
Identificação e Delimitação
da Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica. O Relatório
concluiu que a área ocupada tradicionalmente
pelo povo indígena Kaiwá, nos municípios
de Douradina e Itaporã, estado de Mato Grosso
do Sul, tem superfície de 12 mil hectares
e perímetro de 63 Km, aproximadamente, e
compõe a grande área denominada “Brilhante
pegua”, onde vivem 832 Kaiwá.
De acordo com o documento, “a
terra indígena delimitada apresenta as condições
ambientais necessárias às atividades
produtivas desenvolvidas pelos Kaiwá, e tem
importância crucial do ponto de vista do bem-estar
e das necessidades de reprodução física
e cultural deste povo, segundo seus usos, costumes
e tradições, amparando-se, portanto,
no artigo 231 da Constituição Federal
vigente”.
Os estudos foram feitos com base
em elementos objetivos de natureza etno-histórica,
antropológica, ambiental, documental, cartográfica
e fundiária. Para isso, a equipe técnica
realizou trabalhos de campo e de gabinete, de acordo
com o disposto no Decreto 1775/96.
A partir da publicação
do Relatório no Diário Oficial da
União e do Estado, os interessados têm
até 90 dias para apresentar contestações,
que serão analisadas pelo pessoal técnico
da Funai. A publicação também
é afixada nas sedes das prefeituras dos dois
municípios.
Kaiwá - O povo Kaiwá,
ao longo de mais de cinco séculos, conviveu
com diferentes frentes de ocupação,
responsáveis por redefinir sua territorialidade.
No Mato Grosso do Sul, pelo menos até as
primeiras décadas do século XX, as
bacias dos rios Vacaria e Brilhante eram predominantemente
habitadas pelos Kaiwá. Até a década
de 1940, as terras incluídas no município
de Douradina eram de posse exclusiva desse povo,
não havendo qualquer titulação
anterior ao loteamento da Colônia Nacional
de Dourados. Em meados do século XX, por
conta dos projetos de colonização,
as terras kaiwá foram reduzidas a diminutas
porções, cercadas por pequenas e grandes
propriedades rurais.
A aldeia Panambi-Lagoa Rica se
formou nesse período, quando os Kaiwá
se instalaram às margens de lagoas e nascentes
próximas ao córrego Panambi. Na segunda
metade dos anos 1970, a porção norte
da aldeia foi efetivamente ocupada, com um ambiente
menos exuberante, raras nascentes e um solo menos
fértil, deixando o povo confinado a uma área
de 366 hectares, sem matas, matérias-primas
ou animais de médio porte para caça.
Com as terras abrangidas pela proposta de demarcação,
eles terão acesso a pesca, caça, mel
e vegetais, com destaque para as plantas medicinais.
Atualmente os Kaiwá sobrevivem com poucas
roças cultivadas, que não ultrapassam
os 30m2. Uma família também pode criar
frangos, patos e eventualmente porcos, mas o volume
da criação depende da quantidade de
grãos disponíveis para alimentá-la.
Processo de demarcação
- O início do processo de demarcação
se dá por meio da identificação
e delimitação, quando é constituído
um grupo técnico de trabalho, composto por
técnicos da Funai, do Incra e/ou da secretaria
estadual de terras da localização
do imóvel. A comunidade indígena é
envolvida diretamente em todas as subfases da identificação
e delimitação da terra indígena
a ser administrativamente reconhecida. O grupo de
técnicos faz os estudos e levantamentos em
campo, centros de documentação, órgãos
fundiários municipais, estaduais e federais,
e em cartórios de registro de imóveis,
para a elaboração do relatório
circunstanciado de identificação e
delimitação da área estudada.
É com base nesse estudo que a terra é
declarada, por ato do Ministro da Justiça,
de ocupação tradicional do grupo indígena
especificado, indicando superfície, perímetro
e seus limites. Após a declaração,
é determinada a demarcação
física, para posterior homologação
pelo Presidente da República.
Ocupantes não índios
- Quando é constatada a presença de
ocupantes não-índios na terra indígena,
na fase de identificação e delimitação
são realizados levantamentos fundiários,
socioeconômicos, documentais e cartoriais,
bem como a avaliação das benfeitorias
edificadas em tais ocupações. Quando
a ocupação é julgada a boa
fé, o pagamento das benfeitorias se dá
com base em programação orçamentária
disponibilizada pela União. Segundo o disposto
no art. 4º do Decreto nº 1.775/96, os
ocupantes retirados das terras indígenas
têm prioridade no reassentamento fundiário
feito pelo Incra, observada a legislação
pertinente.