Com quase dois dias de atraso,
os representantes das 194 nações reunidas
em Durban, África do Sul, para a Conferência
do Clima da ONU, chegaram a uma resolução
para evitar o fracasso absoluto
da reunião.
O dia já estava amanhecendo quando o texto
final foi aprovado, prevendo a renovação
do Protocolo de Kyoto até 2017 – sem a participação
de Rússia, Japão e Canadá –
e promessas vagas de um novo acordo climático
global a ser implementado a partir de 2020.
Das duas semanas de negociações,
o que ficou evidente é que os governos de
todo o mundo deram ouvidos às grandes corporações
poluidoras em lugar do povo, que deseja o fim da
dependência dos combustíveis fósseis
e ações reais e imediatas para mitigar
os efeitos das mudanças climáticas.
Segundo Kumi Naidoo, diretor-executivo
do Greenpeace Internacional, conduzidos pelos Estados
Unidos, os negociadores que representam as nações
poluidoras tiveram êxito em inserir uma cláusula
de escape no texto, que pode evitar que o próximo
acordo climático global apresente metas com
força de lei para cortes de emissões.
“Adiaram um acordo global vinculante
por uma década, justo quando os cientistas
dizem que precisamos estabelecer um teto para as
emissões de carbono”, declarou Kumi Naidoo,
diretor-executivo do Greenpeace Internacional.
“Esta decisão pode nos
levar para além do limiar de dois graus de
aumento da temperatura média global. A chance
de evitar uma catastrófica mudança
climática escapa de nossas mãos cada
vez que as nações falham em estabelecer
um plano de resgate para o planeta.”
Em protesto pelo resultado, os
ativistas do Greenpeace se vestiram como executivos
e fizeram um brinde pela vitória das empresas
poluidoras. Antes do início da Conferência,
o Greenpeace divulgou um documento que mostrava
como o lobby pesado de algumas corporações
atinge governos de todo o mundo e mina as expectativas
por um acordo global para evitar uma catástrofe
climática.
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Dia de vergonha
Um dia depois de o Inpe divulgar
o menor índice de desmatamento da Amazônia
já registrado, o Congresso reanimou a sanha
da motosserra. Foi em ritmo de atropelo, sob pressão
ruralista e o tácito consentimento do governo,
que a proposta que acaba com a proteção
florestal foi aprovada hoje no Senado. Com 58 votos
a favor e 8 contra, o novo Código Florestal
foi adiante ainda carregando brechas para mais desmatamento
e anistia a desmatadores.
Uma das últimas esperanças
para a preservação da floresta, a
emenda que pedia uma moratória de dez anos
para o desmatamento na Amazônia teve apoio
na plenária, mas foi rejeitada com o presidente
da mesa, José Sarney (PMDB-AP), encerrando
rapidamente a votação.
Votaram contra a desfiguração
da lei e honraram o compromisso com seus eleitores
apenas os senadores Marcelo Crivella (PRB/RJ), Cristovam
Buarque (PDT-DF), Marinor Brito (PSOL-PA), Randolfe
Rodrigues (PSOL-AP), Lindbergh Farias (PT-RJ), Paulo
Davim (PV-RN), Fernando Collor de Mello (PTB-AL)
e João Capiberibe (PSB-AP).
Não houve surpresa, infelizmente.
O projeto de lei aprovado é o reflexo dos
anseios ruralistas – ainda que não tão
explícito quanto era quando saiu da Câmara
dos Deputados – e foi transformado, em vez de uma
lei ambiental, em mais uma lei de uso agropecuário
do solo. Em breve, o Código Florestal, como
legislação ambiental mais avançada
do mundo, passará a ser um instrumento para
ruralista ligar a motosserra.
"O texto aprovado é
muito ruim. Ele abre brechas para o avanço
do desmatamento sobre as florestas, e esse estrago
já causou prejuízos, como no caso
do estado do Mato Grosso", explica o diretor
da campanha da Amazônia do Greenpeace, Paulo
Adario. Alertado e pressionado pelas organizações
da sociedade civil, o governo foi a campo e conseguiu
evitar que aquela explosão continuasse.
"O índice de desmatamento,
em queda nos últimos anos, tem de ser mantido.
E o governo precisa mostrar que de fato tem um plano
sustentável para o país, como já
disse a presidente Dilma tantas vezes", diz
Adario.
Em plenário, os senadores
falaram em um consenso sobre o texto, mas essa é
mais uma manobra da bancada ruralista para convencer
a presidente de que não é necessário
tomar nenhuma atitude contra o projeto. Isso só
fica assim se ela se fizer de surda para os apelos
de todos os demais setores da sociedade.
O texto agora volta para votação
pelos deputados, onde espera-se que o trâmite
seja rápido (afinal, os ruralistas querem
é que ele seja aprovado logo mesmo), para
então passar para as mãos da presidente.
Ritmo de motosserra
O processo de reforma do Código
Florestal foi conduzido de forma totalmente desigual.
Depois de ser costurado pelos ruralistas na Câmara
por um ano e meio, o Senado teve apenas seis meses
para apresentar um relatório final. Com pressa
tal, o debate foi atropelado e os senadores não
deram o devido valor à contribuição
da ciência e das organizações
da sociedade civil, argumento que tanto usaram para
mostrar que naquela Casa o nível da discussão
seria diferente.
Enquanto as vontades ruralistas
eram plenamente acatadas pelos relatores, as recomendações
de cientistas, juristas, ambientalistas e demais
organizações, além de 1,5 milhão
de brasileiros foram solenemente ignoradas.
"Os cientistas e o Ministério
Público já disseram que esse Código
Florestal não é bom para o meio ambiente
e será questionado juridicamente. Para que
não haja um desastre ambiental no país,
a presidente Dilma deve cumprir suas promessas de
campanha, contra a anistia e o desmatamento, e vetar
o projeto", afirma Adario.