Uma pesquisa de três
semanas na região de Kwamalasamutu
registrou 1.300 espécies, inclusive
46 novas para a ciência, entre elas
uma grande perereca, oito peixes de água
doce e dezenas de novos insetos, em uma área
de vasta riqueza biológica e cultural
co
Arlington, Virginia, EUA/
Paramaribo, Suriname, 25 de janeiro de 2012
— Uma expedição científica
a uma das regiões amazônicas
mais intocadas revelou espécies incrivelmente
diversas, segundo anunciou hoje a Conservação
Internacional (CI) ao divulgar os resultados
de uma pesquisa científica no sudoeste
do Suriname que documentou quase 1.300 espécies,
46 delas possivelmente novas para a ciência.
O anúncio é feito no mês
em que a organização global
comemora 25 anos de esforço em conservação
científica. O local também abriga
vasta herança cultural, sendo portanto
um potencial polo para o desenvolvimento do
ecoturismo.
A pesquisa de três
semanas, parte do Programa de Avaliação
Rápida (RAP, da sigla em inglês),
conduzido pela CI desde 11000, explorou três
locais remotos ao longo dos rios Kutari e
Sipaliwini, próximos ao vilarejo de
Kwamalasumutu, de agosto a setembro de 2010,
na tentativa de documentar a pouco conhecida
biodiversidade da região e identificar
oportunidades para o desenvolvimento do ecoturismo
sustentável pela população
indígena local. O estudo foi conduzido
por uma equipe colaborativa formada por 53
cientistas, representantes do povo indígena
Tiriyó e por estudantes, que documentaram
a diversidade e o status de plantas, peixes,
répteis e anfíbios, pássaros,
pequenos e grandes mamíferos, formigas,
cigarras, libélulas, besouros aquáticos
e besouros de estrume.
Trond Larsen, cientista da CI e diretor do
Programa de Avaliação Rápida,
afirma que “nossa equipe teve o privilégio
de explorar uma das últimas áreas
inóspitas restantes do mundo. Como
cientista, é incrível estudar
essas florestas remotas, onde nos aguardam
inúmeras descobertas – especialmente
porque acreditamos que proteger essas áreas
enquanto estiverem intocadas talvez seja a
maior oportunidade de preservar uma biodiversidade
importante para o planeta e ecossistemas dos
quais as pessoas dependem para as próximas
gerações”.
As descobertas da expedição
foram recentemente publicadas na série
Bulletin of Biological Assessment da RAP,
com o título “A Rapid Biological Assessment
of the Kwamalasamutu region, Southwestern
Suriname” (Uma rápida avaliação
biológica da região de Kwamalasamutu,
sudoeste do Suriname). Entre os vários
destaques, os cientistas apresentam novas
espécies, como uma grande perereca,
oito peixes de água doce e dezenas
de novos insetos, como besouros aquáticos,
besouros de estrume, libélulas e cigarras.
• “Perereca-de-capacete”
– A Hypsiboas sp. tem franjas brancas ao longo
das pernas e uma espora no “calcanhar”. Ela
foi descoberta na parte de baixo de um pequeno
galho durante uma pesquisa noturna em uma
área pantanosa do rio Koetari. A principal
característica que diferencia da perereca
Hypsiboas calcaratusé a ausência
das faixas pretas e brancas laterais.
• “Cascudo titânico”
– O Pseudacanthicus sp. é um peixe
cujo casco (placas ósseas externas)
é recoberto de espinhos para se defender
das piranhas gigantes que habitam as mesmas
águas. O interessante é que
um dos guias locais da expedição
estava prestes a comê-lo como petisco
até que os cientistas observaram as
características únicas e o preservaram
como espécime. São poucos os
espécimes de Pseudacanthicus conhecidos
do Suriname, e esse é o primeiro encontrado
no rio Sipaliwini.
• “Cigarra arco-íris”
– A Vestria sp. é conhecida como cigarra
arco-íris por sua coloração
espetacular. São poucas as cigarras
conhecidas que empregam defesas químicas
eficazes para repelir pássaros e predadores
mamíferos.
Iniciativa de destaque da
Conservação Internacional desde
11000, as pesquisas “RAP” fazem uma rápida
avaliação da biodiversidade
de uma área para determinar a conservação
e o desenvolvimento sustentável, muitas
vezes identificando espécies em regiões
remotas e pouco exploradas.
Apesar de a descoberta de
novas espécies ser um desfecho incrível
dessas pesquisas, os cientistas da RAP também
observaram diversas outras espécies
fascinantes, muitas delas encontradas somente
no Suriname ou que representam registros inteiramente
novos para a região. Algumas das espécies
encontradas foram:
• “Sapo-untanha” – O Ceratophrys
cornuta é um voraz predador que, sentado,
aguarda suas presas. Com sua boca excepcionalmente
larga, ele pode engolir uma presa quase tão
grande quanto seu corpo, inclusive pássaros,
camundongos e outros sapos. Uma pesquisadora,
que usava colar com transmissor para rastrear
pássaros, encontrou seu animal de estudo
(e o colar) na barriga desse sapo!
• “Cigarra da cabeça
cônica” – A Loboscelis bacatus era conhecida
somente na Amazônia peruana. A cigarra
tem uma coloração verde e rosa
fluorescente. O avistamento no sul do Suriname
aumenta significativamente sua extensão
conhecida. Ela é predadora de insetos
e caracóis e se alimenta de sementes
e frutas.
• “Besouro copro-necrófago”
– O Coprophanaeus lancifer é um grande
besouro de estrume, do tamanho de uma tangerina,
que pesa mais de 6 gramas. Ele é azul
e roxo metálico. A espécie é
altamente incomum, pois tanto machos quanto
fêmeas possuem longos chifres na cabeça,
usados como armas durante disputas de uns
contra os outros..
“A área foi um paraíso
para os entomologistas entre nós, com
insetos espetaculares e únicos por
todos os lugares. Eu sequer precisei procurar
formigas, pois elas pularam em cima de mim”,
conta a Dra. Leeanne Alonso, ex-diretora do
RAP da CI, que agora trabalha na Global Wildlife
Conservation. “Outros cientistas ficaram igualmente
impressionados com a incrível diversidade
de pássaros e mamíferos da região.
Você pode chegar muito próximo
da vida selvagem aqui... Uma câmera
escondida gravou uma onça a cerca de
90 metros de nosso acampamento”.
Herança cultural
- Durante a pesquisa, os cientistas também
observaram vários petróglifos
(figuras gravadas na rocha) em cavernas próximas
ao vilarejo de Kwamalasamutu, em um local
conhecido como Werehpai, onde a CI-Suriname
está trabalhando com comunidades locais
para preservar e promover o ecoturismo. Descoberto
somente em 2000, o Werehpai é o assentamento
humano mais antigo conhecido do sul do Suriname.
Recentes investigações e datação
por radiocarbono feitas no local indicam que
o primeiro sinal de habitação
foi há cinco mil anos; aí está
o conjunto mais concentrado de petróglifos
já registrados na bacia amazônica.
Segundo a diretora executiva
da CI-Suriname, Annette Tjon Sie Fat, cuja
equipe liderou a pesquisa e incorporará
seus resultados no planejamento de conservação
para o país, a natureza intocada da
área de Kwamalasamutu e a herança
cultural fazem desse um destino único
para turistas mais aventureiros que gostam
de fazer trekking em uma densa floresta tropical
com o intuito de descobrir flora e fauna.
“A CI-Suriname e os Tiriyós esperam
desenvolver ainda mais o nicho de mercado
de ecoturismo aqui. As recomendações
da RAP ajudarão a comunidade a gerenciar
e manter o santuário de 18 mil hectares
criado ao redor das incríveis cavernas
com petróglifos em Werehpai”.
A pesquisa RAP 2010 foi
coordenada pela RAP da CI em parceria com
CI-Suriname, Amazon Conservation Team, Anton
De Kom Universidade do Suriname, Serviço
Florestal do Suriname, Panthera e Stinasu,
e tornou-se possível devido a uma generosa
doação da Alcoa Foundation.
A equipe da RAP e o presidente
da CI, Russ Mittermeier, voltarão ao
sul do Suriname em março, a fim de
dar continuidade à exploração
dessa região intocada que é
importante para todo o mundo.
+ Mais
Etnomapeamento abrangerá
10 milhões de ha em TIs do PA
CI-Brasil inicia projeto
que será o maior já feito em
área contínua indígena
e se transformará em uma ferramenta
política importante para os kayapós
Brasília, 23 de janeiro
de 2012 — No mês de fevereiro, uma equipe
de cerca de 40 pessoas iniciará os
trabalhos de etnomapeamento nas Terras Indígenas
(TI) Kayapó, Baú e Menkragnoti,
no sul do Pará. A área tem cerca
de 10 milhões de hectares e uma população
de sete mil índios . O projeto é
coordenado pela Conservação
Internacional (CI-Brasil), em convênio
com a secretaria de Meio Ambiente do Pará,
e conta com a parceria técnica do Museu
Paraense Emílio Goeldi (MPEG), do Institut
de Recherche pour Le Developpment (IRD), da
Associação Floresta Protegida
(AFP) e dos Institutos Kabu e Raoni.
Ao todo, serão 16
aldeias alcançadas no período
de um ano.Neste mapeamento das terras kayapós,
um grupo de pesquisadores de campo vai coletar
informações sobre número
de caçadores, anciãos, mulheres
e pajés em cada localidade, além
de pontos de caça, pesca e outros dados
culturais e sociais do território.
Com base nos dados coletados, será
feito um mapa que contará com informações
socioculturais detalhadas das aldeias e das
terras indígenas como um todo.
Andrea Leme, coordenadora
do programa indígena da CI-Brasil e
do projeto, afirma que esse será o
maior mapeamento cultural já feito
em uma terra indígena contínua.
“O estudo é uma ferramenta política
importante. Com ela, os kayapós mostram
por que esse território é deles”,
diz.
Como exemplo, Andrea cita
os questionamentos sobre o tamanho das terras
indígenas. “Muitos pensam que ela é
pouco povoada para seu tamanho e que, assim,
ela poderia ser usada para plantação
ou estradas. No entanto, os índios
Kayapós eram nômades, pertenciam
originalmente ao Centro Oeste, mas foram ‘empurrados’
para a floresta devido à urbanização.
Por volta dos anos 1940, começaram
a ficar sedentários, porém continuaram
com hábitos de subsistência.
Dessa forma, quando a comida fica escassa
em um território, necessitam ir para
outro até esperar a fauna e a flora
se restabelecer. Portanto precisam de territórios
grandes para essa rotatividade”, explica.
Treinamento – “O objetivo
do etnomapeamento é ser participativo
e construtivista, por isso ele será
feito pelos próprios indígenas”,
ressalta Andrea. Trinta jovens nativos receberão
treinamento para aprender a mexer em GPSs,
mapas e em todos os outros materiais. Cada
índio da equipe técnica, que
ainda contará com um antropólogo
e dois cartógrafos, terá que
abordar aproximadamente duzentas pessoas.
“Será uma ótima oportunidade
para os mais novos aprenderem o que os mais
velhos conhecem. Será uma forma de
transmitir conhecimento”, afirma a coordenadora.