27/04/2012 - Thais Leitão
- Repórter da Agência Brasil
- Rio de Janeiro - Um dos principais desafios
do governo na área sanitária
é reduzir a subnotificação
dos casos de intoxicação por
agrotóxicos no país. Segundo
o diretor do Departamento de Vigilância
em Saúde Ambiental e Saúde do
Trabalhador do Ministério da Saúde,
Guilherme Franco Netto, o conhecimento exato
do problema é fundamental para melhorar
políticas de “enfrentamento”.
Entre 2006 e 2011, o número
de casos registrados subiu de 3 mil para 8
mil, mas o diretor do Ministério da
Saúde acredita que muitos ainda deixam
de ser contabilizados. De acordo com ele,
diversas ações estão
sendo implementadas nessa área. “Verificamos
um crescimento importante nas notificações
nos últimos quatro anos, demonstrando
que há um impacto grande na saúde,
mas ainda há muita subnotificação.
Possivelmente nenhum de nós deixa de
ter algum tipo de traço de agrotóxico
no sangue, por exposição direta
ou pelos alimentos ou por contaminação
do lençol freático”, disse.
Para reverter o quadro,
o Ministério da Saúde vai formar,
nos próximos meses, com estados e municípios,
no âmbito do Sistema Único de
Saúde (SUS), um modelo integrado de
vigilância em saúde relacionado
a agrotóxicos. O objetivo é
garantir que, até 2015, todas as secretarias
de Saúde do país tenham um protocolo
mínimo para atuar em casos de intoxicação.
“Vamos desenvolver um processo em que todos
os serviços de assistência médica
vão ter que se adequar, garantindo
a melhora na rede básica e nas especializações,
no centro de terapia intensiva etc.”, acrescentou.
Pela iniciativa, os estados
vão receber recursos do Ministério
da Saúde para compra de equipamentos
e viaturas, estruturação de
laboratórios, entre outros. Os valores
ainda não foram definidos.
Além disso, o Ministério
da Saúde vai desenvolver este ano,
em parceria com diversos centros de pesquisa,
um levantamento no país para reunir
informações sobre as características
da exposição humana aos agrotóxicos.
O estudo trará informações
divididas por regiões. O diretor explicou
que o edital para o projeto já foi
publicado, e os pesquisadores interessados
devem enviar suas propostas de trabalho até
10 de maio.
O Sindicato Nacional da
Indústria de Produtos para Defesa Agrícola
(Sindag) e a Associação Nacional
de Defesa Vegetal (Andef) são as principais
entidades representativas da indústria
de defensivos agrícolas atuantes no
país. Para elas, o consumo de agrotóxicos
nas lavouras brasileiras é necessário
porque o clima tropical exige mais tecnologia
para controle de pragas.
A entidade também
aponta o emprego de defensivos agrícolas,
especialmente nas lavouras de soja, milho,
algodão, cana-de-açúcar
e café, entre os principais fatores
que resultaram, em 2011, na elevação
de 3,9% do Produto Interno Brasileiro (PIB)
do agronegócio. Nessas cinco culturas,
segundo dados do Sindag, estão concentrados
os indicadores de vendas de defensivos mais
elevados.
+ Mais
Pesquisador da USP diz que
uso abusivo de agrotóxicos no país
está relacionado ao modelo agrícola
27/04/2012 - Thais Leitão
- Repórter da Agência Brasil
- Rio de Janeiro - O uso “abusivo, exorbitante
e descontrolado” de agrotóxicos nas
lavouras brasileiras mostra a subordinação
do país na nova divisão internacional
do trabalho, ficando responsável pela
exportação de produtos primários
com pouco valor agregado. Segundo o pesquisador
e especialista em economia agrária
José Juliano de Carvalho, professor
da Faculdade de Economia e Administração
da Universidade de São Paulo (USP),
esse cenário está diretamente
relacionado ao modelo agrícola brasileiro,
que se sustenta no latifúndio, na monocultura,
na produção altamente mecanizada
e em larga escala.
“Não é uma
questão de tecnologia, mas do modelo
de agronegócio colocado como o prioritário
no Brasil. Para sustentar essa lógica,
empresas e produtores usam sem controle os
agrotóxicos e isso afeta de forma muito
negativa a economia brasileira”, acrescentou
Carvalho, que também é diretor
da Associação Brasileira de
Reforma Agrária (Abra).
O professor defende uma
regulação mais ampla do agronegócio
no país, a implementação
de projetos de reforma agrária e de
zoneamento agroecológico. Ele acredita
que o fortalecimento da agricultura familiar
pode ser uma alternativa ao modelo atual.
“O problema não é
só a química, mas a maneira
como ela é usada. O que vemos no Brasil
é o domínio do agronegócio
pelas grandes multinacionais. É preciso
haver regulação do agronegócio
e fortalecimento da agricultura familiar que
acaba inviabilizada não apenas pelo
agrotóxico, mas pelo conjunto do modelo
do agronegócio”, disse.
Estudo divulgado há
cerca de um mês pela Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa)
aponta que o comércio de agrotóxicos
no Brasil cresceu 190% entre 2000 e 2010,
mais que o dobro da média mundial,
de 93%. O mercado nacional de agrotóxicos,
que em 2010 movimentou US$ 7,3 bilhões,
é altamente concentrado, assim como
no restante do mundo. As dez maiores empresas
do setor são responsáveis por
65% da produção nacional e por
75% das vendas. O levantamento também
mostrou que um único produto, o glifosato,
é responsável por 29% do mercado
brasileiro de agrotóxicos.
De acordo com o diretor-geral
de agrotóxicos do Ministério
da Agricultura, Luiz Rangel, o Brasil lidera
o mercado de comercialização
de agrotóxicos em função
da dimensão de sua produção
agrícola. Ele garante, no entanto,
que os alimentos comercializados no país,
mesmo com o uso de agrotóxicos em sua
produção, são seguros,
já que para serem autorizados os defensivos
passam por “severo controle”.
“Todos os alimentos consumidos
aqui ou exportados têm garantias de
segurança, porque todos os níveis
de resíduos foram avaliados e considerados
seguros. Além disso, todos os produtos
liberados no Brasil passam por severo processo
de reavaliação, que pode ocorrer
até mais de uma vez por ano. Se há
indício de problema à luz do
conhecimento científico, temos a obrigação
de revisar os dados para ver se a molécula
deve ser substituída”, explicou.
Luiz Rangel também
explicou que o Ministério da Agricultura
coordena as ações de fiscalização
executadas pelos estados para verificar se
o comércio e o uso desses produtos
estão sendo realizados de forma adequada.
“Por meio de um trabalho
de inteligência, identificamos que os
maiores consumidores de agrotóxicos
no Brasil, cerca de 80%, são as grandes
áreas de elevada tecnologia, ligadas
à soja, à cana-de-açúcar,
ao trigo, ao algodão etc. Esse grande
mercado nos preocupa menos, porque em geral
conta com engenheiros agrônomos e empresas
devidamente instaladas. O que nos traz mais
preocupação são as agriculturas
menores, de cinturões verdes, que representam
15% do mercado, mas 90% do problema em função
principalmente dos desvios de uso”, disse.
Segundo definição
do ministério, os agrotóxicos
são produtos e agentes de processos
físicos, químicos ou biológicos,
destinados ao uso nos setores de produção,
armazenamento e beneficiamento, pastagens,
proteção de florestas nativas
ou implantadas e de outros ecossistemas, bem
como de ambientes urbanos, hídricos
e industriais.
Para ser comercializado
no país, o agrotóxico precisa
ser registrado pelo Ministério da Agricultura,
pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) e pela Agência Nacional de Anvisa.
+ Mais
Ainda faltam estudos sobre
males causados por agrotóxicos aos
consumidores, alerta professor
27/04/2012 - Thais Leitão
- Repórter da Agência Brasil
- Rio de Janeiro - Embora o Brasil seja o
maior consumidor de agrotóxicos do
mundo, à frente dos Estados Unidos,
com cerca de 1 bilhão de litros da
substância sendo usados anualmente,
conforme dados do Ministério da Agricultura,
ainda faltam estudos que mostrem os impactos
dessas substâncias na saúde do
consumidor.
“Temos grandes desafios
para revelar os impactos da exposição
crônica, de longa duração
e a baixas doses, que é o caso do consumidor
urbano, que come todo dia um pouquinho de
produtos contaminados”, alertou o professor
Fernando Ferreira Carneiro, chefe do Departamento
de Saúde Coletiva da Universidade de
Brasília (UnB).
Ele é um dos responsáveis
por um dossiê que reúne pesquisas
de vários especialistas brasileiros
sobre os riscos do uso de agrotóxicos
no país. O documento será lançado
hoje (27) durante o Congresso Mundial de Nutrição,
no Rio de Janeiro. Além disso, o levantamento
será apresentado durante a Conferência
das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável (Rio+20), marcado para
junho, no Rio.
A maior parte dos estudos
se refere à saúde dos trabalhadores
rurais, que têm exposição
direta a esses produtos e riscos elevados
de intoxicação aguda, mais fácil
de ser identificada em termos clínicos
e laboratoriais. “Para o consumidor, no entanto,
a situação ainda é pouco
avaliada no Brasil”, disse.
A pesquisadora Lia Giraldo
– professora do Programa de Pós-Graduação
em Saúde Pública da Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco e membro
do Fórum Pernambucano de Avaliação
dos Efeitos do Agrotóxico na Saúde
e no Ambiente – destacou que, apesar das lacunas
na pesquisa científica nacional sobre
o assunto, a literatura mundial comprova os
efeitos tóxicos relacionados à
exposição crônica a essas
substâncias, por meio da ingestão
de alimentos contaminados.
“A literatura científica
no mundo mostra os efeitos negativos dessa
exposição, que podem ser o surgimento
de câncer, de alterações
endócrinas, no desenvolvimento embrionário,
no sistema nervoso hepático, renal,
pulmonar, cardíaco entre outros. Além
disso, estudos experimentais desses produtos
comprovam diversas alterações
em animais”, explicou.
Segundo a pesquisadora,
o grande problema ligado à questão
é a dificuldade de associar os problemas
de saúde a esse contato. “Essas exposições
não são facilmente percebidas
e relacionadas aos problemas de saúde
decorrentes, o que significa não ter
o diagnóstico. No início dos
agravos, você pode confundir com outros
problemas de saúde”, ressaltou. “Além
disso, não estamos expostos a um só
tipo de agrotóxico, mas a vários,
que se potencializam e interagem”, acrescentou.
Um relatório da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), divulgado no fim do ano passado,
constatou que em 2010, 24,3% das 2.488 amostras
de alimentos analisadas estavam contaminadas
com agrotóxicos não autorizados
e em 1,7% delas o nível de agrotóxico
estava acima do permitido. O pimentão
lidera a lista dos alimentos com grande número
de amostras contaminadas por agrotóxico,
seguido por morango e pepino.