O Greenpeace sobrevoou a
Usina Hidrelétrica de Belo Monte no
dia 10 de abril e essa
atividade fez parte das programações
que envolvem o navio Rainbow Warrior, que
na perna amazônica tem dado ênfase
à campanha da Lei do Desmatamento Zero.
Até o momento, mais de 93 mil pessoas
assinaram a petição online que
objetiva coletar no mínimo 1,4 milhão
de assinaturas para esse projeto de lei de
iniciativa popular.
O fato de o governo federal
projetar a construção de 63
hidrelétricas nos rios Madeira, Teles
Pires, Tapajós, Negro, Xingu, Trombetas
e seus afluentes tem gerado perplexidade e
deixado a Amazônia em estado de alerta
máximo. E a se valer pelo que vem acontecendo
na construção desta usina paraense,
a preocupação tem razão
de ser.
As consequências desta
obra começam a ser sentidas em Altamira,
uma das cidades mais afetadas pelo caos que
se instalou devido à falta de infraestrutura.
Crianças estão estudando dentro
de contêineres, o sistema de saúde
é deficiente, o tratamento de água
é algo raro por lá e doenças
como diarreias e verminoses se alastram. O
preço da cesta básica disparou.
No entanto, o Consórcio Norte Energia
se comprometeu a fazer investimentos para
que esses impactos fossem minimizados, mas
até agora tudo não passou de
promessa.
Um dos argumentos favoráveis
à Belo Monte que mais se ouve em Altamira
é de que as barragens levarão
desenvolvimento para a região. Mas
Dom Erwin Kräutler, bispo do Xingu e
presidente do Cimi (Conselho Indigenista Missionário)
tem outra concepção a respeito:
“Ao meu ver, desenvolvimento é quando
o ser humano é colocado no centro da
questão. E não é o que
tem acontecido aqui. Não há
leitos novos no hospital, os barrageiros ganham
no máximo R$ 1 mil, vivemos na capital
da dengue e da malária. Desenvolvimento
ocorre quando se melhora a qualidade de vida
da população.”
Há a previsão
de que Belo Monte venha desalojar entre 30
mil e 40 mil pessoas. Os futuros afetados
são moradores dos municípios
do entorno, ribeirinhos, extrativistas, indígenas
e quilombolas. Isto acontecerá porque
a obra pode alagar uma área de 516
km2. Em contrapartida, devido à forte
migração, a população
atual, que está em torno de 109 mil
pessoas, pode chegar a 200 mil habitantes
já em 2013.
“No caso desta hidrelétrica,
os estudos de impactos sociais e ambientais
apresentados até o momento estão
claramente subdimensionados. As condicionantes
são desrespeitadas e não cumpridas.
Os povos afetados reclamam que estão
sendo ignorados. O desrespeito é generalizado,
mas mesmo assim o ritmo de construção
da usina está cada dia mais acelerado.
Para eles, o meio ambiente e as pessoas são
o que menos importam”, pontua Marcio Astrini,
da Campanha da Amazônia do Greenpeace.
Desmatamento
Outra abordagem que pode
ser observada é que as construções
dessas usinas também poderão
contribuir para o aumento do desmatamento
na região. O Greenpeace fez uma análise
dos dados de desmatamento divulgados pelo
Prodes do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais) relativos à Belo Monte.
Segundo o Laboratório
de Geoprocessamento da organização,
como a área de influência indireta
foi definida de forma conservadora no EIA-Rima
(Estudo de Impacto Ambiental- Relatório
de Impacto ao Meio Ambiente), ao se observar
os dados de satélite dos últimos
três anos, houve aumento significativo
do desmatamento fora dessa região pré-estabelecida.
Ou seja, ao se estender um raio de 50 km,
constatou-se que o desmate foi cinco vezes
maior.
No entanto, não é
nenhuma novidade afirmar que obras de infraestrutura
são grandes catalisadores de novas
clareiras. De acordo com Astrini, “o governo
federal e os responsáveis pela obra
sabem disso, mas não há nada
que esteja sendo feito para barrar esta tendência.
E desta forma, o que vai acontecer é
o de sempre: enquanto os responsáveis
pela hidrelétrica dão suas desculpas,
a floresta paga com a vida."
Energias renováveis
e eficiência energética
Diante deste cenário,
vale destacar que o Brasil dispõe de
um enorme potencial em outras fontes renováveis,
como eólica, solar, biomassa e mesmo
energia oceânica. A eólica poderia
atender ao triplo da demanda atual por eletricidade
e já apresenta o segundo custo mais
baixo de geração entre todas
as fontes, com preços relativamente
próximos às hidrelétricas.
A energia solar é a que mais cresce
no mundo e os preços vêm caindo
consistentemente.
O potencial de eólicas
atualizado é de 300 mil MW (megawatts),
suficiente para atender ao triplo da demanda
elétrica atual do país. Já
a solar poderia abastecer cerca de 10 vezes
a necessidade energética nacional.
Apenas a cogeração a bagaço
de cana poderia gerar uma quantidade de energia
superior a duas usinas de Itaipu, que produz
14 mil MW.
Por outro lado, as projeções
de demanda do insumo do governo federal são
superestimadas, mesmo considerando os índices
de crescimento da economia, e é nisso
que o governo Dilma Rousseff se apoia ao defender
a exploração do potencial hidrelétrico
dos rios amazônicos.
“Há uma folga de
demanda contratada e se investíssemos
em medidas mais agressivas de eficiência
energética poderíamos abrir
mão de uma série de usinas impactantes
para o meio ambiente e para a sociedade”,
avalia Ricardo Baitelo, da Campanha de Clima
e Energia do Greenpeace.
Ainda há a parte
dos custos de Belo Monte, que chegam a impressionantes
30 bilhões, sem incluir externalidades
de impactos socioambientais. Especula-se que
80% desse montante virá de financiamentos
do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social).
“O mesmo investimento para
construir essa usina geraria praticamente
a mesma energia em parques eólicos
e até dez vezes mais de economia se
fossem adotadas medidas de eficiência
energética”, observa Baitelo.
Outro aspecto positivo das
energias renováveis é que as
indústrias eólica e solar geram
mais empregos que a hidrelétrica para
instalar a mesma potência. Essas cadeias
empregam mais pessoas de forma permanente,
em atividades de instalação,
manutenção e vendas.
+ Mais
Novo gás para motosserra
ruralista
Pela quarta vez em menos
de quatro anos o Governo Federal adiou a entrada
em vigor do decreto de crimes ambientais.
A nova prorrogação tem validade
de dois meses e, assim como em dezembro do
ano passado, o motivo é o Código
Florestal.
Feito em julho de 2008,
o decreto é um instrumento para por
em prática a legislação
ambiental do país e punir aqueles que
se negam a cumpri-la. “Porém, se depender
das negociações entre governo
e ruralistas para o desmonte do Código
Florestal, o decreto, quando em vigor, pode
não ter mais a quem punir”, diz Paulo
Adário, Diretor da Campanha da Amazônia
do Greenpeace.
No Congresso, Deputados
alardeiam que já há um acordo
para votar o novo Código nos dias 24
e 25 deste mês. Do outro lado, o Governo
declara que a proposta final do texto a ser
votado – cujo relator é o Deputado
ruralista Paulo Piau (PMDB-MG) – ainda não
está pronta.
Desmatamento flagrante
Enquanto tudo isso acontece
nos corredores de Brasília, na Floresta
Amazônica o que se ouve é o som
incessante das motosserras. Segundo dados
do INPE, o desmatamento quase triplicou de
janeiro a março de 2012. A cobertura
florestal perdeu 389 km², número
188% maior se comparado ao mesmo período
de 2011. Deste total, a maior parte foi detectada
no estado do Mato Grosso, um dos maiores desmatadores
do país.
No início do mês,
o Greenpeace denunciou uma madeireira operando
sem autorização dentro do assentamento
Corta-Corda, do Incra (Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária),
a 140 km da cidade de Santarém (PA).
Pátios de madeira, toras cortadas,
desmatamento recente e uma serraria foram
registrados em documento enviado ao governo.
“No meio da floresta, a
falta de fiscalização e a destruição
acontecem à luz do dia. E o novo Código
irá promover ainda mais desmatamento.
A Presidente Dilma precisa cumprir suas promessas
de campanha e realizar o veto total ao texto
que chegará às suas mãos”,
afirmou Adário.
A própria Ministra
do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, reconheceu,
em coletiva realizada nesta semana, que o
perdão a crimes ambientais e as mudanças
propostas no Código foram motivos que
levaram ao aumento da devastação.
Ela afirmou que existe quem diga que “você
pode desmatar que vai ser anistiado”.
Pelo fim do desmatamento
Em resposta ao desmonte
da legislação florestal e à
falta de governança, o Greenpeace lançou,
em março deste ano, um projeto de lei
de iniciativa popular que propõe acabar
com o desmatamento nas florestas brasileiras.
O projeto faz parte da Campanha pelo Desmatamento
Zero e, para ir à votação
no Congresso Nacional, precisa arrecadar 1,4
milhão de assinaturas de eleitores.
O lançamento do projeto foi feito a
bordo do navio Rainbow Warrior, do Greenpeace,
no início de sua excursão pelo
Brasil.
“Em Brasília
eles estão fazendo uma lei para beneficiar
o desmatamento. Resolvemos então fazer
uma para proteger as florestas. A campanha
pelo Desmatamento Zero é uma resposta
à falta de governança e à
desastrosa proposta do novo Código.
Nós brasileiros precisamos reagir,
antes que façam de nossas florestas
apenas uma vaga lembrança”, concluiu
Adário.