Carta foi entregue
à presidente durante reunião
no Palácio do Planalto com integrantes
do Fórum do Clima
Brasília, 05 de abril
de 2012 — Integrantes da sociedade civil aproveitaram
reunião ontem com a presidente Dilma
Rousseff e integrantes do Fórum Brasileiro
de Mudanças Climáticas (FBMC),
no Palácio do Planalto, em Brasília,
para reivindicarem mudanças na política
energética e climática brasileira.
Em carta entregue à presidente na ocasião
também foi pedido o veto ao Código
Florestal que está em tramitação
na Câmara dos Deputados.
No evento, a sociedade civil/ONGs
foi representada pelos coletivos do Observatório
do Clima (OC) e do Fórum Brasileiro
de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente
e o Desenvolvimento (FBOMS), que reúnem
mais de 700 organizações. A
CI-Brasil compõe as duas redes. André
Ferretti, coordenador geral do OC, e a secretária
executiva do FBOMS, Silvia Alcântara
Picchioni, pronunciaram-se em nome do grupo
e entregaram à presidente Dilma uma
mensagem com o posicionamento coletivo.
A presidente Dilma Rousseff
não se mostrou muito receptiva aos
pedidos do grupo de mudança nos rumos
do desenvolvimento energético do país.
Ela chegou a afirmar que as pessoas contrárias
à construção de hidrelétricas
vivem em um estado de "fantasia".
Para Artur Paiva, coordenador
de serviços ambientais da CI-Brasil
e representante da instituição
no OC, essa foi uma boa ocasião para
que a sociedade civil expressasse seu posicionamento
sobre a agenda ambiental e social atual, principalmente
por estarmos à véspera da Rio+20.
Paiva também questionou as diferenças
entre o discurso do governo e a prática.
“A impressão que se tem é que
o que o governo diz não está
se refletindo com o que a sociedade civil
observa na prática”, conclui.
Leia abaixo a íntegra
MENSAGEM DA SOCIEDADE CIVIL/ONGs PARA A REUNIÃO
DO FBMC COM A PRESIDENTA DILMA
Agradecendo ao convite e
oportunidade da manifestação
da sociedade civil, aqui representada pelos
coletivos do Observatório do Clima
e do FBOMS, que reúnem mais de 700
organizações.
Registramos aqui nosso reconhecimento
em relação aos importantes avanços
no combate a pobreza e desigualdade ao longo
de seu governo.
Mas, apesar de avanços
alcançados, estamos aqui para manifestar
nossa preocupação em relação
a alguns pontos.
Os governos, apesar dos
discursos, na prática desconhecem,
solenemente, a questão de Mudanças
Climáticas e não incluem em
suas ações essa perspectiva.
Quase 30 meses após
o Presidente Lula ter sancionado a Lei Federal
nº 12.187, os Planos Setoriais de Mitigação
das Mudanças Climáticas pouco
progrediram. Há problemas críticos
na sua elaboração, com destaque
para a falta de padronização
na metodologia e regras de participação
da sociedade. Os planos em construção
são, na grande maioria, compilação
de ações já em andamento
e que não foram elaboradas sobre a
ótica da mitigação e
adaptação às mudanças
climáticas.
A implementação
da Lei da Política Nacional de Clima,
apesar de já regulamentada, está
em ritmo extremamente lento, colocando em
risco os compromissos assumidos na própria
Lei e nos acordos internacionais.
Mesmo com o atraso nos prazos
de divulgação dos planos setoriais,
os documentos que serão entregues a
Senhora na semana que vem (16 de abril) são
inconclusivos e não atendem ao determinado
em Lei ou em metas previstas.
Por exemplo: o plano setorial
de energia compila o Plano Decenal de Energia,
o qual dedica 68% do volume de investimentos
do Governo Federal voltado para a indústria
do petróleo e gás, sujando nossa
matriz energética. Impulsionado pelas
reservas do pré-sal, em 2020, o Brasil
produzirá 6,09 milhões de barris
de petróleo por dia, o que representará
955,82 milhões de toneladas de CO²
na conta de emissões mundiais - um
crescimento de 197% comparado aos números
atuais. Essas emissões consolidarão
o Brasil na incômoda posição
de estar entre os três maiores emissores
globais de gases do efeito estufa.
Precisamos mudar esse cenário.
O mundo quer e precisa de diversificação
da matriz energética e incentivos econômicos
para energia limpa. O Brasil não pode
ir na contra-mão da história.
Outro aspecto de extrema
urgência trata da elaboração
de um Plano Nacional de Adaptação
às Mudanças Climáticas,
para identificação de vulnerabilidades
e áreas de risco. Nos últimos
anos a sociedade brasileira tem sofrido, de
Norte a Sul, enormes prejuízos socioeconômicos
e ambientais devido a eventos climáticos
extremos. As populações menos
favorecidas são as mais atingidas,
mas de modo geral toda a sociedade tem sofrido
as consequências.
O Brasil precisa investir
mais em prevenção do que em
respostas emergenciais a desastres, que devem
ser conduzidas de forma partilhada com as
populações nas diferentes regiões
considerando as particularidades.
Outro tema de preocupação
é o projeto de lei que altera o Código
Florestal, que tramita na Câmara nesse
momento. Se aprovado resultará, inevitavelmente,
na emissão de milhões de toneladas
de gases de efeito estufa, na perda de biodiversidade
e serviços ambientais essenciais à
nossa civilização. Nem o texto
do Senado nem o da Câmara podem ser
aprovados na medida em que os dois desfiguram
de tal forma o atual Código Florestal,
que a sociedade civil aqui representada não
vê alternativa senão pedir o
VETO PRESIDENCIAL integral daquele PL.
A sociedade civil espera
este veto e estará junto apoiando sua
atitude.
Também relevante
é a questão de REDD+ que carece
de um amplo processo de discussão para
tratar desse sistema e da estratégia
nacional a ser adotada no Brasil. Iniciativas
isoladas de estados, municípios, comunidades
indígenas e tradicionais, e proprietários
rurais estão sendo realizadas em todo
o território nacional e precisam ser
consideradas e harmonizadas.
Diante do exposto, destacamos
que, apesar da existência formal de
espaços de participação
para a sociedade civil, na prática,
as nossas contribuições não
têm sido devidamente consideradas ou
incorporadas nos processos em curso. A sociedade
civil organizada reivindica ter as condições
mínimas necessárias para estar,
de fato, envolvida na discussão, elaboração,
implementação e monitoramento
de toda Política Nacional de Mudanças
Climáticas.
Nesse sentido, registramos
ainda nossa preocupação e esperanças
em relação a formulação
de um novo marco regulatório para nossa
atuação. Entidades sérias
que vem realizando um trabalho relevante para
a sociedade não podem ser equiparadas
e tratadas como se fossem adversárias
do interesse público ou inidôneas.
Aguardamos com expectativa os resultados do
Grupo de Trabalho instituído por V.
Excia. coordenado pela SGPR.
Às vésperas
da Rio+20, grande parte das conquistas da
sociedade brasileira na área socioambiental
desde a Constituição de 1988,
podem ser perdidas, e isso seguramente será
amplamente denunciado na Cúpula dos
Povos.
A humanidade precisa traçar
o caminho a ser trilhado nas próximas
décadas para conciliar as necessidades
de uma população de 7 bilhões
de habitantes (que em 2050 chegará
a 9 bilhões), com o patrimônio
natural disponível. Existem pessoas,
conhecimentos, tecnologias e recursos financeiros
para fazer do século XXI um período
virtuoso.
O Brasil tem tudo para ser
protagonista no maior evento mundial sobre
a sustentabilidade do planeta e de sua civilização.
Confiamos na sua coragem para tomar as decisões
corretas que façam o diferencial na
busca desse caminho!