Notícia - 24 - mai
– 2012 - Pelo novo Código, grandes
desmatadores serão anistiados e dispensados
de recompor a área. Além disso,
ainda receberão o mesmo tratamento
dado aos pequenos agricultores.
Irajá tem uma fazenda
no Tocantins. Seu valor declarado ultrapassa
a casa dos R$ 640 mil. Em sua propriedade,
além das atividades normais de uma
fazenda, ele cria encrencas com o Ibama. Tanto
que em 2010 foi agraciado pelo órgão
com a abertura de dois processos. Um por desmatamento
ilegal. O outro, por derrubar mata em área
de preservação permanente. Se
Dilma não vetar o Código Florestal
que brotou do Congresso, Irajá vai
se dar muito bem. Logo de cara, ele se livra
do Ibama. Basta assinar um documento chamado
de termo de compromisso e todas as multas
que recebeu por desmatamento estarão
automaticamente suspensas.
Pelo projeto do novo Código,
Irajá poderá até não
pagar multa nem ser obrigado a recompor a
mata que levou ao chão. Seu caso será
examinado por um órgão com poderes
para inocentá-lo de seu estado natal,
o Tocantins, onde ele é um homem poderoso.
Na cerca que divide a agricultura brasileira,
Irajá está do lado do agronegócio,
setor que concentra a maior parte dos desmatamentos
recentes no país e grande beneficiado
no embate em torno do código.
Do outro lado da cerca,
está a turma do azar. São pequenos
agricultores ou agricultores familiares que,
como Irajá, tem contas a acertar com
o meio ambiente. Esses familiares estão
distribuídos em mais de 4,36 milhões
de propriedades do país. Ocupavam apenas
24,3% da área dos estabelecimentos
agropecuários e concentram 3,7 milhões
de analfabetos do campo brasileiro. Seu acesso
à tecnologia e ao crédito para
dinamizar a produção e renda
são praticamente inexistentes.
Apesar disso, segundo dados
do IBGE, são eles os responsáveis
pela maior parte da comida que chega à
mesa da população brasileira.
Muitas das terras ocupadas por esses agricultores
já estavam desmatadas antes mesmo de
seu acesso a elas e, como suas contas bancárias
têm o mesmo tamanho diminuto das propriedades,
eles não têm a menor condição
de regularizar o passivo ambiental sem a assistência
do Estado. Ao contrário dos Irajás.
Mas no texto do Código costurado pelo
Congresso, muitas dessas diferenças
desaparecem. Lá, pelo menos no quesito
dos perdões ambientais, pequenos agricultores,
cujos problemas foram usados para estender
privilégios também aos desmatadores
recentes, ficarão bem parecidos com
os Irajás, que poderão receber
os mesmos benefícios de um agricultor
familiar.
Nesse mesmo sentido, há
ainda aquele agricultor que provavelmente
perdeu a cobertura florestal há várias
décadas, talvez antes mesmo da existência
de lei florestal. Muitos deles, porém,
não têm o cabedal de um Irajá
para contratar bons advogados e se aproveitar
das brechas da nova legislação
a fim de fazer sumir o seu passivo ambiental,
ao contrário do agronegócio
que Irajá tão bem representa.
Olhar para o agricultor familiar ou para aquele
que desmatou há mais de século
como se ele fosse apenas mais um Irajá
é apenas um exemplo dos grandes problemas
do Código Florestal saído da
pena ruralista no Congresso.
É sobre um texto
recheado desse tipo de armadilhas que a presidente
Dilma tomará sua decisão. Devido
à inoperância do governo no tema,
que praticamente se omitiu do assunto enquanto
o Congresso retalhava a lei florestal brasileira,
sua única saída deve ser a de
livrar o país de uma legislação
que anistia crimes ambientais e abre novas
áreas de desmatamento, vetando integralmente
o texto proposto pelos congressistas. Para
completar a obra, seu governo deveria se concentrar
em investir nas áreas já desmatadas
e abandonadas, suficientes para duplicar nossa
produção agrícola sem
derrubar mais nenhum palmo de floresta.
Já no campo, as discussões
sobre o futuro da agricultura e de nossos
padrões de competitividade que não
passem pelo combate ao analfabetismo, pela
falta de investimentos na agricultura familiar
e pela problemas como gargalos logísticos
que, apenas em Mato Grosso, fazem sumir pelo
ralo 15% do valor da saca de grãos
– e podem chegar a R$ 4 bilhões do
total da safra anual – é tão
conversa fiada quanto dizer que a proteção
florestal impedirá o desenvolvimento
da agricultura ou encarecerá a comida
dos brasileiros.
+ Mais
Prometeu. E não cumpriu
Notícia - 28 - mai
– 2012 - A publicação hoje no
Diário Oficial do que restou do Código
Florestal e da Medida Provisória que
preenche suas lacunas joga na cara dos brasileiros
a verdade sobre Dilma Rousseff: ela não
cumpriu a promessa que fez a seus eleitores
de guardar as florestas do país.
A nova legislação
ambiental tem tudo o que os ruralistas sempre
sonharam. Anistia? Certamente: as multas por
desmatamento feito até 2008 foram perdoadas.
Menor área a ser recuperada? Tem sim,
senhor: as áreas de proteção
permanente (APPs) foram reduzidas. Premiação
a quem desmatou? Claro: além de facilidades
para zerar o passivo, ele ainda pode plantar
eucalipto ou qualquer outra exótica
onde antes só valia floresta nativa.
Dilma ainda desdenhou da
aliança do seu partido com movimentos
sociais do campo, ao estender benefícios
da agricultura familiar a qualquer um que
tenha uma propriedade de até quatro
módulos. Aliás, é pior:
ela usou a mesma máscara de "proteção
aos pequenos", que os ruralistas vestiram
para justificar suas maldades no Congresso,
ao publicar seu código do desmatamento.
Ao comparar a lei que vigorava
no Brasil até a semana passada e o
novo Código Florestal, é muito
claro que Dilma quis reduzir a proteção
às florestas em vez de fortalecê-la.
"O governo falou uma coisa na semana
passada e publicou outra no Diário
Oficial. Ele preservou a coluna vertebral
da proposta ruralista ao Código Florestal,
com anistia e tudo mais", explica Marcio
Astrini, da campanha Amazônia do Greenpeace.
"Com a nova lei, as florestas perdem
e o desmatador ganha."
Dilma caminha para ser a
pior presidente das últimas décadas
para o meio ambiente. Após 18 meses
no cargo, ela não criou uma única
unidade de conservação. Mas
diminuiu o tamanho de várias, sobretudo
na Amazônia, para plantar nelas grandes
hidrelétricas e projetos de mineração.
Dilma tirou poderes do Ibama, órgão
que fiscaliza crimes ambientais, e ainda permite
o ataque da mesma bancada ruralista que retalhou
o código às terras indígenas.
É um legado de vergonha.
"Os instrumentos de combate e controle
do desmatamento diminuíram. O código
não sofreu uma única modificação
que aumente a proteção ambiental,
e desdenha daqueles que cumpriram a lei",
afirma Astrini.
Não é mais
possível confiar no governo como guardião
das florestas. Salvá-las está
unicamente nas mãos do povo brasileiro
– que foi ignorado por Dilma durante a reforma
do Código Florestal, apesar de dizer
claramente que prefere a preservação
e a recuperação de suas matas.
Congresso e governo, de
mãos dadas, fizeram uma lei de destruição
das florestas. Agora os brasileiros farão
uma lei pelo desmatamento zero, por meio de
um projeto de iniciativa popular para desligar
as motosserras. Nos moldes da campanha da
Ficha Limpa, ela precisa de 1,4 milhão
de assinaturas de eleitores para chegar ao
Congresso.