26 - out – 2012 - Em época
de retrocesso ambiental, indústria
e ONGs renovam pacto contra desmatamento
A Moratória da Soja, acordo firmado
entre a Abiove (Associação Brasileira
das Indústrias de Óleos Vegetais),
a ANEC (Associação Brasileira
de Exportadores de Cereais), o Greenpeace
e outras entidades da sociedade civil para
eliminar o desmatamento da cadeia de produção
foi estendida até 1º de janeiro
de 2014. A renovação da moratória,
que conteve a expansão do desmatamento
nas regiões de soja da Amazônia
nos últimos cinco anos, foi assinado
hoje, em Brasília, pelos coordenadores
do Grupo de Trabalho da Soja, Carlo Lovatelli
(indústria), Paulo Adario (sociedade
civil), além da ministra do Meio Ambiente,
Izabella Teixeira.
O pacto que impõe
desmatamento zero na produção
de soja na Amazônia foi assinado originalmente
em julho de 2006, com adesão do MMA
(Ministério do Meio Ambiente) em 2008.
Isso significa que, pelo sexto ano consecutivo,
nenhuma das 24 principais empresas comercializadoras
do grão – que representam 90% do mercado
de soja no país – poderá comprar
o produto de fornecedores na Amazônia
que tenham desmatado após 2006. Também
participaram do evento o presidente da ANEC,
Carlos Mendes, e diretores de várias
traders de soja.
“A renovação
da moratória é um alento para
todos os que lutam contra o desmatamento e
defendem a produção agrícola
responsável, numa época em que
a legislação de proteção
ambiental no Brasil sofreu grande retrocesso
por conta da mudança no Código
Florestal, por pressão de setores retrógrados
do agronegócio”, afirmou Paulo Adario,
do Greenpeace.
Ao longo desses anos, os
números mostram a importância
do acordo. Enquanto o desmatamento anual caiu
na Amazônia para números recordes,
a curva de produção de soja
manteve-se em alta. E continua subindo. Estimativa
do Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia
Aplicada) aponta que, nos próximos
dez anos, serão 61,9% a mais de toneladas
de soja saindo de Mato Grosso para o mercado.
Mas o desafio pela frente será grande:
ainda segundo o Imea, a área plantada
do grão deve aumentar em 51,8% no mesmo
período.
Isso não significa,
porém, que novas áreas precisam
ser desmatadas para o plantio de soja. Ganhos
de produtividade e melhorias no sistema de
estocagem e transporte podem garantir que
a conta feche sem necessidade de derrubadas
adicionais. Carlo Lovatelli, presidente da
Abiove, ratificou isso: “Não precisamos
de área nova de floresta para aumentar
a produção de soja no Brasil.
Não precisamos. Temos terra boa para
fazer isso sem ter que derrubar uma só
arvore”, disse. “Desmatar é crime.
Isso não se faz. E ponto.”
Izabella Teixeira, ministra
do Meio Ambiente, concorda. “A sociedade brasileira
não tolera mais o desmatamento. Devemos
assegurar condições técnicas
e jurídicas para a produção
de alimentos”, afirmou. “Para isso, precisamos
de aprimoramento tecnológico, de acesso
e transparência à informação
para o controle social”.
Monitoramento é fundamental
No entanto, o sinal amarelo
deve continuar aceso. Desde que o acordo foi
selado, os casos em desacordo com a moratória
– fazendas desmatadas para plantio de soja
– vem aumentando. De lá para cá,
a área derrubada e ocupada com o grão
aumentou de 11.698 para 18.410 hectares, representando
um incremento de 57%. O número de casos
também saltou de 147 para 164 entre
o ano passado e este ano. Ainda assim, no
universo total de soja na Amazônia,
os casos de desrespeito ao acordo, entre 2006
e 2011, representam pouco: 0,41% de todo esse
desmatamento.
Outro antigo gargalo é
a regularização ambiental das
fazendas que vendem soja. Análise do
Greenpeace sobre os alertas de desmatamento
(Deter) do Inpe no Mato Grosso e Pará
revela que cerca de 50% das derrubadas nos
últimos 14 meses foram feitas em áreas
sem o CAR (Cadastro Ambiental Rural).
Empresas que compram soja
de propriedades sem o CAR não podem
dar garantias ao consumidor de que o grão
está livre de desmatamento. O CAR é
fundamental para o rastreamento da produção”,
disse Adario. Segundo a ministra Izabella
Teixeira, os 58 municípios produtores
de soja na Amazônia serão prioritários
nessa regularização. “É
necessário o domínio do que
acontece na ponta, na propriedade, e o CAR
é essencial. Só com ele vamos
acabar com os mitos sobre as propriedades
rurais no país.”
Paulo Adario lembrou também
da importância de o governo abraçar
de vez o acompanhamento da produção.
“A soja tornou-se uma das principais commodities
do Brasil. A moratória, como o nome
indica, é provisória. É
do interesse do próprio governo que
o sistema de monitoramento da soja desenvolvido
pelo Grupo de Trabalho da Soja (GTS) e pelo
Inpe vire um programa permanente. É
preciso transformar em política pública
o monitoramento dessa produção”.
Izabella Teixeira não se opôs:
“Está topado. Vamos buscar os meios
para isso, ver como podemos fazer isso funcionar
daqui a dois, três anos”.
No último mês
de março, o Greenpeace e outras organizações
lançaram uma aliança nacional
pela lei de iniciativa popular do desmatamento
zero. A exemplo da Lei da Ficha Limpa, a ideia
é coletar o maior número de
assinaturas possível para enviar a
proposta ao Congresso. “Está muito
claro para nós e para a ciência
que a produção brasileira não
precisa desmatar novas áreas para se
expandir. Em poucos meses, quase 600 mil pessoas
aderiram à campanha. Portanto, não
é só o mercado, mas todo o Brasil
quer o fim do desmatamento”, conclui Adario.
A ministra Izabella aplaudiu a iniciativa:
“Isso vai invadir o Congresso num debate sobre
o que queremos da Amazônia. Será
uma decisão do coletivo, e não
de pequenos grupos”.