13 Dezembro
2012 | Por Jorge Eduardo Dantas - Há
um abismo moral entre a ciência, a realidade
e as instruções dos governos
a seus diplomatas nas negociações
de clima, principalmente os de países
desenvolvidos. Muitos foram à COP 18
para defender os interesses imediatos de seus
governos, e não para solucionar o problema”.
Foi desta forma que o coordenador
do programa de Mudanças Climáticas
e Energia do WWF-Brasil, Carlos Rittl, resumiu
o resultado da COP 18, ocorrida em Doha, no
Catar, e encerrada nos últimos dias
após duas semanas de negociações
consideradas fracas e insuficientes para fazer
frente às mudanças climáticas.
O encontro reuniu representantes
de 193 países, que integram a Convenção-Quadro
das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas. O pacote de textos aprovado
no dia 8 teve como desfecho mais concreto
a adoção de um segundo período
para o Protocolo de Kyoto, o acordo climático
que obriga os países a reduzir as emissões
de gases de efeito estufa.
Outros temas importantes,
no entanto, não avançaram o
suficiente. Como a discussão sobre
de que modo as “nações ricas”
vão financiar países em desenvolvimento
no combate às mudanças climáticas
– de maneira geral, a crise econômica
mundial e falta de recursos foi um dos argumentos
utilizados para que os auxílios acordados
pelos países em COPs anteriores não
saíssem do papel.
No entanto, a sociedade
civil durante todo o evento expôs a
contradição entre a falta de
recursos para este financiamento e os trilhões
de dólares destinados a salvar bancos
nos últimos anos e destinados aos subsídios
aos combustíveis fósseis.
“Não há ambição
no pacote de decisões aprovado”
Representante do WWF-Brasil
no encontro, Rittl fez um balanço bastante
crítico sobre a COP 18. Segundo o especialista,
não há mínima ambição
no pacote de decisões adotadas no Catar,
seja em temas como mitigação
de impactos, financiamento climático,
ou sobre a definição de um mecanismo
global que ajude os países mais pobres
a lidar com emergências climáticas
como grandes tempestades, enchentes e secas
severas.
O coordenador do programa
de Mudanças Climáticas e Energia
do WWF-Brasil classificou o resultado da Conferência
das Partes 2012 de “fraquíssimo”. “O
cenário após a COP18 é
muito incerto para uma grande parte da população
mundial, para a economia global e para a biodiversidade
e os ecossistemas. O tempo é o recurso
mais precioso agora, e está cada vez
mais escasso. As respostas e decisões
daqui para frente terão que ser muito
mais fortes e incisivas, e as ações
mais rápidas”, afirmou.
Samanta Smith, líder
da Iniciativa Global de Clima e Energia da
Rede WWF, reforçou as críticas.
“O que a ciência nos diz e que milhões
de pessoas experimentaram este ano é
de que a luta contra as Mudanças Climáticas
é extremamente urgente. Mas em 2012
tivemos um acordo vergonhosamente fraco, que
está tão longe da ciência
que deve gerar reflexões sobre a postura
ética de seus responsáveis”,
declarou.
Os próximos desafios
dos países-membros da Convenção
Quadro das Nações Unidas sobre
Mudanças Climáticas é
o aumento do nível de ambição
das metas atuais de redução
de emissões para 2020 e a criação
de um novo tratado internacional, com compromissos
para todos os países a partir de 2020.
Os representantes e diplomatas têm até
2015 para chegar a este novo acordo, que será
discutido nos próximos encontros internacionais.
Confira os resultados da
COP 18
Protocolo de Kyoto:
Trinta e seis países
aderiram ao segundo período de compromisso
do Protocolo de Kyoto, que vai de janeiro
de 2013 a dezembro de 2020. As metas de redução
de emissão de gases de efeito estufa
do conjunto de países significa uma
redução de 18% de emissões
de países desenvolvidos em relação
as taxas de 11000, o que é muito abaixo
do mínimo definido pelo Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC,
na sigla em inglês) como necessário
para termos chances de evitar que o aquecimento
global ultrapasse os 2°C em relação
a níveis pré-Revolução
Industrial. Além disso, países
como Estados Unidos, Canadá, Japão,
Rússia e Nova Zelândia não
estão participando deste segundo período,
enfraquecendo a ferramenta.
Financiamento climático:
Permanece a previsão
de arrecadação de US$ 100 bilhões
anuais, que serão revertidos para os
países mais pobres para o combate às
Mudanças Climáticas. Mas não
foi definido como este dinheiro será
arrecadado, como serão financiadas
as ações de mitigação
e adaptação de países
em desenvolvimento e nem o que será
feito para aumentar este valor.
Novo acordo global:
Deve começar a ser
negociado no ano que vem, para ser aprovado
em 2015. Ele deve gerar um novo instrumento
com força de lei com compromissos entre
todos os países, de acordo com suas
responsabilidades históricas e com
uma distribuição equitativa
entre todos. Espera-se, portanto, que países
que hoje estão fora do Protocolo de
Kyoto e as grandes economias assumam compromissos
muito maiores do que os países mais
pobres.
+ Mais
França-Brasil: a
corrida do ouro e a necessidade de cooperação
10 Dezembro 2012 | Por Isabelle
Autissier, secretária geral do WWF-França;
Maria Cecília Wey de Brito, secretária
geral do WWF-Brasil; Claudio Maretti, líder
da Iniciativa Amazônia Viva da Rede
WWF; e Dominik Plouvier, diretor regional
do WWF-Guianas.
A presidente Dilma Rousseff
inicia hoje (10/12) uma visita oficial à
França, com duração de
48 horas. Uma excelente oportunidade para
lembrar que Brasil e França compartilham
fronteira física, localizada em todo
o perímetro sul e leste da Guiana Francesa.
Ao longo de mais de 600 quilômetros,
apenas um rio e uma cadeia de montanhas separam
os dois países, tendo ao fundo a impressionante
Floresta Amazônica. Foi ali que o ímpeto
brasileiro levou à criação,
em 2020, do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque,
no estado do Amapá, seguindo-se em
2007 a criação do Parque Amazônico
na Guiana Francesa. Juntas, essas duas unidades
de conservação adjacentes formam
a maior área protegida de floresta
tropical do mundo.
No entanto, apesar desse
contexto aparentemente idílico, as
relações entre os dois países
sofreram um tropeço. Uma grave enfermidade
instalou-se no coração dessas
gigantescas áreas protegidas, dedicadas
à biodiversidade e às comunidades
locais: a corrida do ouro. Provocada pela
forte demanda do mercado, relacionada à
economia global e associada a aspectos sociais
e econômicos dos dois países,
e ainda impulsionada pelo aumento do preço
desse metal precioso, a caça ao tesouro
levou à pilhagem descontrolada dos
recursos que, teoricamente, estariam sob a
proteção governamental. A realidade
cotidiana das comunidades locais e indígenas
passou a ser a contaminação
da água com mercúrio, a destruição
das florestas primárias, a degradação
das condições de vida e a insegurança.
Cientes da situação, os dois
governos decidiram assumir um compromisso,
por meio de um acordo bilateral específico,
de unir suas forças e lutar contra
esse flagelo que polui os rios e provoca uma
grave mancha na imagem do Brasil junto à
França.
Assinado em 2008, o texto
(do acordo) -- cujo objetivo específico
é restabelecer a credibilidade das
áreas protegidas do Brasil e da França
e torná-las aptas a receber os meios
necessários para garantir o respeito
às leis -- ainda não foi ratificado
pelo Brasil. Pior ainda: desde o covarde assassinato
de dois soldados franceses por garimpeiros,
em junho de 2012, a aparente passividade de
uma minoria de funcionários públicos
brasileiros em postos eletivos colocou em
dúvida a existência de uma real
vontade bilateral de acabar com esse desastre
social e ambiental. Os protestos públicos
organizados em Caiena (capital da Guiana Francesa)
e as consequentes tensões sociais devem
fazer com que os presidentes do Brasil e da
França acelerem o processo de ratificação
pelo lado brasileiro, para dar início
às ações bilaterais anunciadas
quase quatro anos atrás. Ao longo desses
quatro anos ocorreram crimes demais, ofensas
demais, e isso sobrecarregou em muito a cooperação
franco-brasileira.
Esta nova visita de Estado
significa uma oportunidade única para
Brasil e França demonstrarem que suas
ações bilaterais podem concretizar
as anunciadas aspirações e interromper
a mineração ilegal de ouro dentro
de unidades de conservação,
como foi solicitado, durante a Rio+20, pelo
WWF e a Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia (COICA)
no Chamado pela Amazônia.