Leia artigo do diretor-executivo
da CI-Brasil, Andre Guimarães, que
foi publicado no Jornal O Globo, sobre a importância
de valorizar nosso capital natural
Brasília, 17 de abril
de 2013 — Se você soubesse que a cerveja
do fim de semana está diretamente relacionada
à existência de uma reserva florestal
em seu estado, estaria mais preocupado com
o desmatamento? Será que se as pessoas
soubessem que a água que bebem e se
banham tem as nascentes protegidas por um
parque, teriam interesse em visitá-lo?
Fala-se muito sobre capital natural, patrimônio
natural, economia verde, termos que atualizam
e tornam mais tangível o conceito do
desenvolvimento sustentável. De forma
bem direta, o capital natural é a água
que bebemos, que usamos na irrigação
das lavouras, que gera a energia que gela
a cerveja.
É também o
solo onde plantamos nossa comida e o clima
que nos propicia harmonia com o meio em que
vivemos. É a biodiversidade que nos
assombra com sua beleza e que gera boa parte
dos materiais e produtos que nos alimentam,
aquecem, vestem. A boa gestão deste
capital natural, que o conserva ao mesmo tempo
em que o transforma em bem-estar para as pessoas,
é o que se pode chamar de desenvolvimento
sustentável.
Infelizmente, o capital natural não
é valorado nem valorizado como o capital
financeiro. Não é tratado com
a pompa do capital tecnológico. Não
recebe a importância do capital social.
Sem capital natural não se constrói
capital humano, não se pode ser feliz.
O capital natural é o único
sem o qual não há vida em nosso
planeta. Sem dinheiro e tecnologia, e mesmo
sem justiça social e felicidade, podemos
viver. Mas sem água não.
Então por que não
protegemos com unhas e dentes o capital mais
vital à nossa vida? Ainda mais no Brasil,
onde está a maior parte da água,
da biodiversidade, do carbono florestal e
dos solos agricultáveis do mundo. Uns
vão dizer que nosso capital natural
é por demais abundante para nos preocuparmos
com seu custo ou seu fim. De certa forma isso
é verdade. Para ficar apenas na água
doce, o Brasil tem 14% do total mundial para
abastecer menos de 3% da população
do planeta. Então estamos tranquilos?
Ledo engano. Mais de 70% de nossos municípios
não têm estratégias consistentes
para saneamento básico. Sujamos nossas
águas de maneira sem precedentes na
história. Da mesma forma, utilizamos
nosso capital natural sem recebermos nada
em troca por isso.
Ao exportarmos um quilo de soja, despachamos
4mil litros de água necessários
para sua produção. Para cada
quilo de milho, são 3,5 mil litros
de água. Disse-me uma vez Pavan Sukdev,
um dos maiores especialistas nas relações
entre negócios e meio ambiente: “se
os líderes de uma dúzia de países
resolverem cobrar pela água que produz
a soja e o milho que alimentam o gado e os
suínos na Europa e no Japão,
aconteceria uma verdadeira revolução
nos mercados internacionais.” Estamos estragando
nosso patrimônio ao poluir rios e lagos,
e deixando de ganhar dinheiro ao não
valorizá-lo.
Prefiro acreditar que as
pessoas não são perdulárias
nem gostam de rasgar dinheiro, mas sim desinformadas
sobre o valor do capital natural. O caso do
Parque Estadual dos Três Picos, na região
serrana do Rio é ilustrativo. Nele
estão as nascentes que abastecem cerca
de 4 milhões de habitantes de Niterói,
Itaboraí e vizinhanças. Se fizermos
uma enquete nas ruas dessas cidades, certamente
pouquíssimas pessoas terão conhecimento
da relação parque-água-qualidade
de vida.
Felizmente, o Brasil é
um dos países que mais protege a natureza.
Cerca de 13% do país estão em
parques e reservas, guardando parte do capital
natural para as gerações futuras.
Mas há muito que fazer para proteger
o futuro. Mais parques e melhor gestão
são necessários, áreas
devem ser reflorestadas, solos têm que
ser recuperados, biodiversidade precisa ser
protegida. Mas o essencial é conhecer
a origem e entender a importância do
capital natural para o bem-estar.
Comprometa-se a levar uma
criança este ano para visitar um parque
onde existem nascentes de água, córregos
límpidos, plantas e animais nativos.
Quando estiver debaixo da sombra de um jequitibá
de 500 anos, converse com ela sobre capital
natural. Este simples gesto pode garantir
para as gerações futuras a água
boa para beber e a energia para gelar a cerveja.