06 Dezembro 2013 | Belo
Horizonte (MG) - O Brasil é um país
extremamente rico em
expressões artesanais e a diversidade
etnocultural e as inúmeras comunidades
tradicionais – de indígenas, caiçaras,
ribeirinhas e quilombolas, entre outras –
permite o desenvolvimento de um artesanato
primoroso em todo o país.
No entanto, a falta de regras
para o aproveitamento de recursos naturais
na produção do artesanato muitas
vezes tem contribuído para a exploração
predatória de remanescentes de vegetação
nativa em várias regiões pela
extração desregrada e insustentável
de madeiras, fibras, sementes e outros tipos
de matéria-prima. O resultado é
a degradação de áreas
naturais, de parques nacionais e de outras
unidades de conservação no Brasil.
Um dos casos mais graves
é registrado entre Porto Seguro, Prado
e Itamaraju, no extremo sul da Bahia, região
famosa não apenas por ser o local do
“descobrimento do Brasil”, mas também
por abrigar um dos maiores remanescentes de
Mata Atlântica do Nordeste*.
Essa região abastece
um tráfico de mais de 30 mil metros
cúbicos anuais de madeiras raras da
Mata Atlântica. O material é
amplamente usado em pratos, tigelas, tábuas
de carne, talheres, gamelas, pilões,
enfeites ou potes de mel, todos vendidos abertamente
em rodovias, feiras populares e lojas nos
centros urbanos.
O tráfico se concentra
nas porções preservadas das
florestas e abre novas frentes de devastação
pela busca de árvores de grande porte,
muitas ameaçadas de extinção.
Jacarandá, pau brasil, parajú,
arruda, mussutaiba, arapati e outras espécies
têm sido livremente abatidas e transformadas
em utensílios domésticos e adornos.
Visitantes e turistas geralmente adquirem
esses produtos sem consciência do caráter
ilegal e destrutivo.
Em vez de ajudar na geração
de renda das comunidades, está contribuindo
para a exploração predatória
e fabricação mecanizada de artefatos,
pois não se trata de artesanato, mas
de uma indústria que envolve extração
ilegal dentro e fora de áreas protegidas
e centenas de fábricas clandestinas
espalhadas, geralmente, pelos quintais de
periferias pobres.
No extremo sul da Bahia,
indígenas são responsáveis
por menos de 12% da produção,
apesar de seu nome ser amplamente usado para
driblar a fiscalização. Além
de impactos ambientais, o “industrianato”
gera subemprego, sem proteção
física ou legal. Um objeto vendido
a R$ 40 em São Paulo geralmente é
comprado por R$ 1 do produtor.
As árvores nativas,
por exemplo, deveriam ser mantidas e poderiam
produzir sementes para plantios comerciais,
com fantástico potencial econômico,
ou serem manejadas sob regras que garantam
sua manutenção. Enquanto isso,
é possível produzir itens de
excelente beleza e qualidade com espécies
exóticas, desde que seu cultivo não
leve à degradação da
vegetação nativa ou pressione
o dia a dia de populações tradicionais.
Por isso, WWF-Brasil, SOS
Mata Atlântica, Grupo Ambientalista
da Bahia e Associação Mineira
de Defesa do Ambiente estarão presentes
na 24ª Feira Nacional de Artesanato (Belo
Horizonte/MG) a partir deste sábado
(7) defendendo que Governo Federal e Congresso
Nacional unam esforços com a sociedade
civil para a definição célere,
clara e democrática de legislação
e regras para garantir a sustentabilidade
socioambiental e econômica do desenvolvimento
do artesanato nacional com matérias-primas
nativas.
* As chamadas Reservas de
Mata Atlântica da Costa do Descobrimento
são oito áreas protegidas nos
estados da Bahia e do Espírito Santo
que mantêm o recorde mundial de mais
de 450 espécies de árvores por
hectare e foram reconhecidas em 1999 como
Patrimônio Natural Mundial pelas Nações
Unidas.
+ Mais
Nelson Mandela, Chico Mendes
e a conservação da natureza
06 Dezembro 2013 | Em 2003,
a cidade de Durban, na África do Sul,
recebeu o IV Congresso Mundial de Parques
da União Internacional de Conservação
da Natureza (UICN). As palavras proferidas
por Nelson Mandela durante a abertura do congresso
foram uma inspiração muito especial,
tendo o líder global destacado a importância
e o papel das áreas protegidas.
“Nelson Mandela nos lembrou
como a natureza é maravilhosa e como
temos responsabilidade sobre ela. Destacou
que o mais interessante é podermos
conservá-la para construir um mundo
melhor para a humanidade, e como as áreas
protegidas podem e devem ser o centro de soluções
para esse mundo, mais sustentável,
mais justo”, relembrou Claudio Maretti, à
época vice-presidente regional da Comissão
Mundial de Áreas Protegidas da UICN,
coordenador do apoio do WWF-Brasil ao Programa
Áreas Protegidas da Amazônia
(ARPA), e um dos participantes do IV Congresso
Mundial de Parques da UICN.
“Neste mês de dezembro
em que o mundo perde Mandela, também
é marcado pelos 25 anos da morte de
Chico Mendes. O líder brasileiro ajudou
a propor e construir uma solução
para conflitos sociais por meio da conservação
da floresta, particularmente na Amazônia.
As reservas extrativistas, que são
áreas protegidas e, portanto, têm
também objetivos de conservação
da natureza, representam esse apoio direto
às necessidades sociais que Mandela
nos lembrava em 2003”, destacou.
“Não podemos nos
esquecer que as áreas protegidas prestam
serviços sociais, econômicos
e culturais muito mais amplos, inclusive ajudando
a manter o abastecimento de água de
qualidade em cidades, e minimizando os impactos
das chamadas ‘catástrofes climáticas”,
completou.
Atualmente à frente
da Iniciativa Amazônia Viva da Rede
WWF, Claudio Maretti comenta sobre a oportunidade
de conversar com Mandela pessoalmente. “Em
mais um retorno à África do
Sul, em 2007, como membro do Conselho Mundial
da UICN, pude encontrar Mandela pessoalmente
e agradecê-lo por seu exemplo. Que ele
e o seu legado, bem como o de Chico Mendes,
nos guie para sabermos sempre ter a natureza
como solução para construir
esse mundo melhor”, concluiu Maretti.