04 Fevereiro 2014 | por
Jean Timmers e Aldem Bourscheit, superintendente
e especialista em Políticas Públicas
do WWF-Brasil* - A população
mundial e a demanda associada por alimentos,
commodities e energia tendem a crescer de
forma vertiginosa nas próximas décadas.
Sem mudança nos padrões de produção
e de consumo, a pressão sobre os grandes
remanescentes globais de vegetação
nativa, no sudeste asiático, na África
central e na Amazônia sul americana,
ampliará os impactos socioambientais.
O Brasil, como abrigo de
enorme variedade de animais, plantas e ecossistemas
que nos proporcionam um dos climas mais agradáveis
do planeta, água pura e em grande quantidade,
terras férteis e paisagens paradisíacas,
precisa garantir meios concretos para a manutenção
de seu patrimônio natural, beneficiando
inclusive a produção no campo,
o abastecimento das cidades, a geração
de energia e as populações tradicionais.
Uma das ferramentas globalmente
adotadas e realmente efetivas para a conservação
da vida e dos chamados serviços ambientais
é o estabelecimento de uma rede ampla
e sólida de unidades de conservação,
terrestres e marinhas. No país, a base
para essa tarefa estratégica é
a Lei 9.985 / 2000, que regulamentou parte
do Artigo 225 da Constituição
Federal de 1988.
Engrossando o caldo, parques
nacionais e outras unidades de conservação
servem não só à manutenção
da biodiversidade, mas também protegem
cenários e culturas, fornecem serviços
como regulação do clima e água
em quantidade e qualidade para abastecimento
humano e produção de energia,
por exemplo, ajudam a combater o desmatamento
(que voltou a crescer na Amazônia) e
também geram renda em bases sustentáveis.
Se alguém ainda duvida
do papel econômico das unidades de conservação,
basta conferir em http://migre.me/hIpS7 os
números do estudo A Economia dos Ecossistemas
e da Biodiversidade (Pnuma, MMA, Ipea, Embaixada
Britânica e GIZ).
Além disso, municípios
de 18 estados recebem atualmente mais de R$
400 milhões ao ano por meio do ICMS
Ecológico. Só o Parque Nacional
do Iguaçu (PR) possibilita o repasse
de aproximadamente R$ 10 milhões aos
municípios em seu entorno. Sem contar
os R$ 17 milhões revertidos todo ano
aos cofres da União com bilheteria.
Todavia, um futuro mais
promissor para as unidades de conservação
brasileiras depende de um cenário político
menos desfavorável e de ações
estratégicas e conjuntas entre governos,
sociedade civil e setor privado. O já
citado Parque Nacional do Iguaçu, um
dos mais conhecidos e visitados do país,
pode ser cortado ao meio por uma estrada pavimentada
caso seja aprovado um irresponsável
projeto de lei.
Mas o fato não é
isolado. No Congresso Nacional e Assembleias
Legislativas estaduais se acumulam projetos
de lei e outras iniciativas de visão
curta e distorcida que irresponsavelmente
atacam o sistema nacional de áreas
protegidas e, como em um passe de mágica,
pretendem desconstituir, reduzir ou jogar
para baixo o nível de proteção
de inúmeras unidades de conservação.
Tais tentativas de drible são tortas,
inclusive porque unidades de conservação
são propostas e criadas com base em
exaustivos estudos socioambientais e consultas
públicas, até serem decretadas
pelo Executivo.
Outro fator que entrava
a consolidação do sistema nacional
deunidades de conservação é
seu baixo índice de regularização
fundiária. Não por falta de
recursos, mas pela carência de um debate
franco, aberto e democrático sobre
os melhores caminhos para a solução
do problema. Alguns estados brasileiros, como
Minas Gerais, vêm testando novos modelos
para a regularização fundiária,
por exemplo com recursos da compensação
ambiental.
É fundamental que
avancemos com medidas que contribuam efetivamente
para a consolidação e para a
ampliação da rede de unidades
de conservação, protegendo riquezas
únicas em todos os biomas do país,
seja em terra, seja no mar. Enquanto a Amazônia
abriga um índice razoável de
áreas protegidas, outras regiões
vêm perdendo a cada ano parcelas significativas
de sua cobertura vegetal nativa, inclusive
a quase dizimada Mata Atlântica.
Metade do Cerrado, do Pampa
e da Caatinga desapareceram, enquanto Amazônia
e Pantanal já perderam quase 20% de
sua vegetação nativa. Enquanto
isso, os índices de proteção
oficial para a maioria dos biomas ainda são
insuficientes para que o Brasil garanta a
conservação ampla de sua biodiversidade
e honre, por exemplo, compromissos internacionais
que determinam que, até 2020, todos
os países devam ter pelo menos 17%
de suas áreas terrestres e 10% de suas
áreas marinhas e costeiras em unidades
de conservação. Do bioma marinho,
temos apenas 1,4% realmente protegido.
Há muito trabalho a ser feito, em benefício
de todos os brasileiros.