Produtos Naturais, Turismo
e Recreação e Provisão
de Alimentos receberam as menores pontuações
e sugerem atenção às
tomadas de decisões e definições
das políticas públicas
nacionais.
Rio de Janeiro, 02 de abril
de 2014 — Pela primeira vez, o Brasil dispõe
de um índice que reúne aspectos
ambientais, sociais e econômicos providos
pelo mar. Trata-se do Índice de Saúde
do Oceano do Brasil (em inglês, OHI-Brasil),
publicado hoje, 2 de abril, na revista científica
PLOS ONE, que avaliou todos os 17 estados
da costa brasileira, usando as melhores bases
de dados disponíveis referentes a 2012.
Cada estado recebeu sua própria pontuação.
Sob coordenação da pesquisadora
Cristiane Elfes, do Departamento de Ecologia,
Evolução e Biologia Marinha,
da Universidade da Califórnia Santa
Bárbara, EUA, o estudo contou com a
colaboração de especialistas
de universidades americanas e da ONG ambientalista
Conservação Internacional.
O Brasil foi escolhido para
esse levantamento regional porque possui uma
das mais longas linhas de costa do mundo,
uma alta diversidade biológica marinha
e costeira e uma das maiores economias mundiais.
A Zona Econômica Exclusiva do Brasil
totaliza 3.660.995 km2 no Oceano Atlântico
Sul.
Essa primeira tentativa
de levantamento da saúde do oceano
no Brasil fornece uma linha de base relevante
a partir da qual mudanças futuras podem
ser mensuradas. Também destaca onde
são necessárias melhores informações
que podem ajudar a guiar ações
de políticas e gerenciamento em escalas
nacionais e sub-nacionais.
Para Cristiane Elfes, a
relevância desse indicador se dá
por seu ineditismo. “Sabemos que ainda há
pontos a aprimorar, mas o primeiro passo foi
dado. Esperamos tornar o OHI-Brasil um programa
conduzido por instituições brasileiras,
para monitorar a situação dos
mares em longo prazo. Essa é uma ferramenta
fundamental para a tomada de decisões
no ambiente marinho", garante.
O OHI-Brasil é uma
variação regional do estudo
global lançado em 2012, em um trabalho
colaborativo de várias universidades
e ONGs, liderado por Ben Halpern, do Centro
Nacional para Análise e Síntese
Ecológica dos EUA, e reavaliado anualmente
para incluir dados mais recentes disponíveis.
Ele compara cientificamente e combina os elementos
chaves de todas as dimensões da saúde
do oceano – biológica, física,
econômica e social – para mensurar o
quão sustentável é o
uso que as pessoas fazem dos recursos e serviços
oferecidos pelo oceano e ambientes costeiros.
Uma das grandes dificuldades
dos pesquisadores na elaboração
do OHI-Brasil se concentrou na reunião
de dados para alguns setores importantes,
como a pesca, por exemplo, “porque eles simplesmente
não existem para todos os estados”,
contou Guilherme Dutra, diretor do Programa
Marinho da Conservação Internacional
(CI-Brasil) e coautor do estudo. “O governo
federal parou o monitoramento pesqueiro nacional
em 2011 e mesmo antes disso os dados eram
descontínuos no tempo e na distribuição
espacial. É imprescindível que
o governo gere informações básicas
como estas, pois sem monitoramento não
há gestão sustentável",
enfatizou Dutra.
Metas
O índice é
organizado em torno de 10 metas: provisão
de alimentos (pesca artesanal e aquicultura);
oportunidade de pesca artesanal, produtos
naturais; armazenamento de carbono; proteção
costeira; subsistência e economias costeiras;
turismo e recreação; identidade
local; águas limpas e biodiversidade.
A pontuação de cada meta varia
entre 0 e 100. Uma pontuação
de 100 signi?ca que o sistema avaliado atingiu
a meta proposta (o ponto de referência),
oferece todos os benefícios especi?cados
de forma sustentável e é provável
que siga dessa maneira em um futuro próximo.
Uma pontuação 0 signi?ca que,
embora os dados estivessem disponíveis,
o estado não desfruta de nenhum dos
benefícios especificados ou ainda que
esses benefícios são obtidos
de maneira não sustentável.
A pontuação
do Brasil no estudo nacional foi de 60. Armazenamento
de Carbono (89), Proteção Costeira
(92) e biodiversidade (85) – todas dependentes
da saúde dos habitats marinhos – foram
as pontuações mais altas das
metas nacionais. Produtos Naturais (29), Turismo
e Recreação (31) e Provisão
de Alimentos (36) foram as pontuações
mais baixas. Aquicultura (6) obteve uma pontuação
muito baixa, o que contribuiu para a queda
em Provisão de Alimentos.
Conforme o estudo, a pontuação
baixa para a meta Produtos Naturais indica
que o país não está utilizando
da maneira apropriada os recursos não
alimentares disponíveis. “Seria bastante
proveitoso rever essas oportunidades de produção
sustentável”, garantiu Elfes.
A disseminação
dos benefícios do turismo a mais estados
pode ajudar a melhorar a pontuação
da meta Turismo e Recreação,
assim como em Subsistência e Economia
Costeiras. Entretanto, para isso é
necessário o desenvolvimento de infraestrutura
adequada para atrair e atender aos visitantes,
evitando efeitos sociais e ambientais indesejados.
Já para elevar a
pontuação em Provisão
de Alimentos, é preciso, como aponta
o estudo, que o Brasil melhore a sustentabilidade
da pesca e desenvolva a aquicultura sustentável
em mais estados.
Outro ponto de destaque
conforme Guilherme Dutra é a pequena
área hoje protegida sobre o mar, que
não chega a 0,35% de áreas protegidas
mais restritivas como Parques e Reservas Extrativistas,
ou apenas 1,6% se consideradas também
as Áreas de Proteção
Ambiental. “Isso afetou negativamente vários
resultados da análise. O Brasil precisa
seguir o exemplo dos países que estão
olhando para o oceano com cuidado, planejando
os usos nesta área e protegendo os
ecossistemas marinhos mais importantes. Aqui,
áreas de extrema importância
como a Região dos Abrolhos estão
sendo destruídas pela sobrepesca e
constantemente ameaçadas por atividades
como a exploração de petróleo
ou a carcinicultura. E o governo não
consegue colocar para frente as áreas
de proteção propostas.",
concluiu Dutra.
Estados brasileiros
Os 17 estados costeiros
do Brasil foram avaliados, usando as melhores
bases de dados disponíveis para todos
os estados referentes a 2012, assim como dados
globais que eram possíveis de ser analisados
por estado.
As pontuações
estaduais variam de 71 (Rio de Janeiro) a
47 (Piauí). Os autores explicam que
embora o Rio de Janeiro tenha obtido acima
de 80 pontos em cinco metas, as outras possuem
pontuações consistentemente
baixas. Diferente do Piauí que, mesmo
obtendo pontuações acima de
80 em três metas, foi o estado que apresentou
os pontos mais baixos em seis delas.
Metas baseadas em ecossistemas,
incluindo Armazenamento de Carbono, Proteção
Costeira e Biodiversidade, foram as que atingiram
as maiores pontuações estaduais,
com exceção do Rio Grande do
Norte, onde a rápida expansão
de fazendas de camarão tem causado
altas taxas de perda de manguezais.