| 19/12/2025
– RAFAEL CARDOSO - REPÓRTER DA AGÊNCIA
BRASIL - Rio de Janeiro - Um estudo publicado nesta
quinta-feira (18) na revista Nature Reviews Earth
& Environment amplia a compreensão científica
sobre os impactos do El Niño–Oscilação
Sul (ENOS) sobre o Oceano Atlântico. Segundo
os pesquisadores, o fenômeno climático
pode determinar se a pesca aumenta ou diminui em
regiões da África e da América
do Sul.
ENOS
é o nome dado para a alternância entre
o esfriamento (El Niño) e o aquecimento (La
Niña) do Oceano Pacífico. O fenômeno
acoplado nasce de variações da pressão
e das circulações oceânicas
e atmosféricas.
O estudo
reúne evidências científicas
de como o ENOS muda padrões de chuva, ventos,
temperatura, salinidade do oceano e a descarga de
grandes rios, afetando a disponibilidade de nutrientes
e oxigênio nas águas. Essas mudanças
influenciam o fitoplâncton, base da cadeia
alimentar marinha, e têm reflexos na abundância
de peixes e crustáceos de importância
comercial.
Segundo
o artigo, os impactos do fenômeno não
são homogêneos e variam conforme a
região, a espécie explorada e o período
analisado. No Norte do Brasil, o El Niño
atua pela via tropical e está associado à
redução das chuvas na Amazônia,
como observado em 2023 e 2024. A diminuição
das chuvas reduz a pluma do rio Amazonas, que transporta
nutrientes essenciais para a costa do Norte e Nordeste.
“Essa
pluma, que chega à costa do Norte e Nordeste
do Brasil, contém nutrientes que são
a base da cadeia alimentar”, explica a professora
Regina Rodrigues, da Universidade Federal de Santa
Catarina, uma das autoras do artigo.
A redução
desse aporte pode prejudicar a produtividade da
pesca em algumas áreas, mas, por outro lado,
pode favorecer a captura do camarão marrom,
beneficiado pela menor turbidez da água e
maior penetração da radiação
solar.
No Sul
do país, o El Niño atua pela via extratropical
e está associado ao aumento das chuvas, como
ocorreu no Rio Grande do Sul em 2024. O maior aporte
de água doce e nutrientes tende a favorecer
a pesca de determinadas espécies. Já
na região central do Atlântico Sul,
o fenômeno está relacionado ao aumento
da captura da albacora, um tipo de atum amplamente
explorado comercialmente.
A revisão
ressalta, no entanto, que essas respostas variam
de acordo com a espécie, a estação
do ano e até a década analisada.
Segundo Ronaldo Angelini, professor da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte e coautor do estudo,
a proposta da pesquisa é integrar processos
físicos, biogeoquímicos e ecológicos
para compreender essas variações.
“Essa
abordagem ajuda a explicar por que respostas observadas
na pesca nem sempre são lineares ou consistentes
ao longo do tempo”, afirma Angelini, especialmente
diante de um cenário de mudanças climáticas
que afetam a frequência e a intensidade do
ENOS.
O artigo também identifica lacunas importantes
no conhecimento, como a escassez de séries
históricas de dados pesqueiros e limitações
das observações por satélite,
e propõe caminhos para aprimorar a capacidade
de previsão.
“Esse
roteiro viabiliza a construção de
modelos quantitativos comparáveis com estimativas
de incerteza, essenciais para separar sinais de
ENOS de outras variabilidades”, explica o
pesquisador.
Resultado
de um projeto internacional financiado pela União
Europeia, com participação de instituições
da Europa, África e Brasil, o estudo destaca
que não existe uma resposta única
do Atlântico ao ENOS. Para os autores, isso
reforça a necessidade de estratégias
de manejo localizadas, adaptadas à realidade
de cada estoque pesqueiro e de cada comunidade.
Diante da escala global do fenômeno, que dificulta
o monitoramento por países isoladamente,
os pesquisadores defendem a adoção
de um monitoramento oceânico coordenado, com
a ampliação de redes já existentes
e a integração de observatórios
costeiros, utilizando protocolos comuns, dados interoperáveis
e séries temporais comparáveis.
Da Agência
Brasil
Fotos: Reprodução/ABR/Fernando Frazão
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