Grandes
cérebros e grandes extensões não são
suficientes para salvar as aves
As
mudanças climáticas impõem grandes
desafios às comunidades de avifauna no mundo inteiro
24/09/2025 – Cientistas
conservacionistas costumam acreditar que espécies
com ampla distribuição geográfica e
grandes populações estão mais protegidas
da extinção. No entanto, um novo estudo global
com cerca de 1.500 espécies de aves, liderado pela
Universidade do Texas em Austin, mostra que essa suposição
pode ser enganosa diante das mudanças climáticas.
A pesquisa revela que algumas aves, apesar de viverem em
áreas extensas, podem depender de condições
climáticas muito específicas, o que as torna
mais vulneráveis em um mundo em aquecimento.
Carlos Botero, professor
e autor do estudo, explica que espécies com grandes
populações e ampla distribuição
— comuns em regiões extensas — normalmente
são vistas como menos ameaçadas de extinção.
No entanto, o estudo mostra que muitas dessas espécies
estão adaptadas a climas muito específicos,
o que as torna vulneráveis a colapsos populacionais
diante das mudanças nos padrões climáticos.
Um exemplo claro da vulnerabilidade
de espécies amplamente distribuídas é
o bico-de-cera-da-boêmia, que habita o Ártico
em uma vasta área que vai da Escandinávia
ao Alasca. Apesar dessa ampla distribuição,
a espécie é altamente dependente de temperaturas
frias e de uma cobertura constante de neve. Como o Ártico
apresenta um clima relativamente uniforme, até pequenas
mudanças de temperatura ou precipitação
podem afetar toda a área habitada pela ave, tornando-a
sensível ao aquecimento global, independentemente
de sua capacidade de voar grandes distâncias.
Em contraste, o tordo-de-coroa-castanha,
que vive em uma região muito menor nas florestas
montanhosas do Nepal, Butão e arredores, está
exposto a uma variedade maior de condições
climáticas ao longo do ano. Essa diversidade ambiental
faz com que a espécie tenha um nicho climático
mais amplo, o que pode torná-la mais resiliente a
mudanças climáticas futuras. A comparação
entre essas duas aves mostra que a extensão territorial
por si só não garante segurança diante
das alterações no clima.
O estudo revelou uma descoberta
inesperada: aves com cérebros maiores, tradicionalmente
consideradas mais adaptáveis devido à sua
flexibilidade comportamental, tendem a ser mais dependentes
de regimes climáticos específicos. Embora
cérebros maiores estejam associados a maior engenhosidade,
essa característica não garante maior tolerância
às mudanças climáticas, contrariando
a ideia de que inteligência aumenta a resiliência
ambiental.
Apesar de sua inteligência,
muitas aves com cérebros grandes são especialistas
em climas específicos, o que as torna potencialmente
mais vulneráveis às mudanças climáticas.
Segundo os pesquisadores Carlos Botero e João Fabrício
Mota Rodrigues, a capacidade cognitiva pode permitir que
essas aves explorem com grande eficiência ambientes
muito específicos, favorecendo uma especialização
ao longo do tempo evolutivo. Contudo, essa especialização
pode resultar em tolerâncias fisiológicas rígidas,
que se tornam um risco à medida que o clima global
se transforma.
Para medir o nicho climático
de cada espécie, os pesquisadores combinaram dois
grandes conjuntos de dados: mapas de distribuição
baseados em centenas de milhares de avistamentos de aves
registrados por voluntários na plataforma eBird,
e uma nova classificação climática
simplificada. Essa classificação considera
dois eixos principais de dificuldade ambiental: a “rigidez
da temperatura”, que reflete ambientes mais frios,
variáveis e imprevisíveis, associada à
escassez e irregularidade de chuvas. Ao mapear essas variáveis,
os cientistas criaram um espaço climático
bidimensional que permite analisar como as espécies
se distribuem em diferentes condições ambientais.
No espaço climático
bidimensional criado pelos pesquisadores, áreas próximas
ao centro representam climas mais benignos — quentes,
úmidos e estáveis —, enquanto as extremidades
indicam ambientes extremos, como desertos, regiões
tropicais instáveis ou tundras geladas. Ao sobrepor
a distribuição de cada ave nesse diagrama,
foi possível medir a amplitude climática que
cada espécie utiliza. Uma pequena elipse nas bordas
do gráfico indica uma dependência de condições
ambientais muito específicas, sugerindo vulnerabilidade
a mudanças climáticas. Em contraste, uma elipse
ampla que cruza vários quadrantes aponta para uma
maior flexibilidade e possível resiliência
climática.
O estudo reforça
a necessidade de os planejadores de conservação
abandonarem abordagens baseadas em fatores de risco isolados
e considerarem como múltiplas ameaças interagem
de forma complexa. Botero destaca que são justamente
essas interações inesperadas que podem colocar
espécies em maior perigo. Mesmo aves que parecem
seguras — com ampla distribuição, grandes
populações e alta inteligência —
podem estar vulneráveis se forem climaticamente especializadas.
Espécies do Ártico, aves tropicais dependentes
de umidade e até aquelas adaptadas a desertos podem
enfrentar riscos sérios com mudanças climáticas
intensas e imprevisíveis.
Segundo Rodrigues, a análise
só foi possível graças à contribuição
de cientistas cidadãos, cujos dados enviados à
plataforma eBird forneceram uma visão global detalhada
e inédita. A participação de centenas
de milhares de observadores, mesmo registrando espécies
comuns, permitiu mapear com precisão os nichos climáticos
das aves. Essa abordagem, baseada em registros georreferenciados
em tempo real, está se tornando essencial para a
previsão ecológica, permitindo aos pesquisadores
atualizar rapidamente modelos de distribuição
de espécies, muitas vezes com mais agilidade do que
métodos tradicionais de campo.
O estudo de Botero sugere
que reconhecer a especialização climática
de espécies inesperadas pode mudar as prioridades
de conservação. Embora agências frequentemente
concentrem recursos em espécies carismáticas
e com distribuição limitada, aves cosmopolitas
com ampla distribuição geográfica também
merecem atenção, pois seu grande porte pode
ocultar uma vulnerabilidade climática. Investigações
futuras explorarão se padrões semelhantes
se aplicam a outras classes de animais, como mamíferos,
répteis e anfíbios.
A mensagem principal do
estudo é clara: o tamanho — seja de distribuição,
população ou cérebro — não
garante segurança para as espécies. Em um
clima em rápida mudança, as nuances ecológicas
são cruciais. Compreender essas nuances pode ser
a diferença entre uma ação preventiva
eficaz e a necessidade de resgates caros quando as populações
caem drasticamente. À medida que formuladores de
políticas desenvolvem estratégias para as
próximas décadas, esse estudo nos lembra de
que a vulnerabilidade pode estar onde menos esperamos, como
em grandes populações aparentemente estáveis,
que se tornam vulneráveis com mudanças climáticas,
mesmo que pequenas. O estudo foi publicado na revista Nature
Communications.
Criado em 2015, dentro do
setor de pesquisa da Agência Ambiental Pick-upau,
a Plataforma Darwin, o Projeto Aves realiza atividades voltadas
ao estudo e conservação desses animais. Pesquisas
científicas como levantamentos quantitativos e qualitativos,
pesquisas sobre frugivoria e dispersão de sementes,
polinização de flores, são publicadas
na Darwin Society Magazine; produção e plantio
de espécies vegetais, além de atividades socioambientais
com crianças, jovens e adultos, sobre a importância
em atuar na conservação das aves.
Da Redação,
com informações de Agências Internacionais
Matéria elaborada com auxílio de inteligência
artificial
Fotos: Reprodução/Pixabay